O FIM DOS BAILES POPULARES

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O ano de 1966 tinha tudo para ser o carnaval mais animado de São Luís. O povo comemorava os recentes atos políticos ocorridos nas eleições de outubro de 1965, em que duas extraordinárias conquistas democráticas marcaram o Maranhão: as inquestionáveis vitórias nas urnas dos candidatos José Sarney, a governador do Estado, e de Epitácio Cafeteira, a prefeito de São Luís.
Sarney chegava ao Palácio dos Leões, empunhando a bandeira das oposições, destronando o vitorinismo do poder estadual, após vinte anos de absoluto domínio político. Cafeteira, também oposicionista, graças ao efeito de uma emenda constitucional, aprovada pelo Congresso Nacional, elegia-se prefeito da capital maranhense, prerrogativa que o povo de São Luís havia perdido desde fevereiro de 1919, quando uma reforma à Constituição deu aos governadores o direito de nomeá-los.
Com todo esse ingrediente político, esperava-se que o carnaval de 1966 fosse marcado por muita vibração e alegria. Mas o que se viu foi o contrário disso. Naquele ano, a folia em São Luís sofreu um brutal golpe de morte, por conta de uma ação inesperada e impensada de um político que acabara de se eleger prefeito da cidade, o qual, em sua campanha eleitoral, só prometera à população fazer coisas boas e alegres.
Esse terrível golpe, perpetrado contra o carnaval de São Luís, então considerado o terceiro do país, chegou ao conhecimento da população no começo de janeiro de 1966, com a divulgação, nos jornais da cidade, de um decreto assinado pelo prefeito Epitácio Cafeteira.
O decreto, que deixou a população surpreendida e estonteada, dizia respeito a um assunto que nunca fora objeto de cogitação ou de apreciação administrativa de nenhum gestor de São Luis: a proibição dos bailes de máscaras. Eram festas populares, realizadas em casas localizadas no centro da cidade e promovidas no período carnavalesco. A singularidade dessas festas residia nas máscaras, usadas apenas por mulheres, que as utilizavam para cobrir o rosto e não serem identificadas. As mascaradas, em sua grande maioria, provinham dos bairros da cidade e não pagavam para entrar nos bailes. Este ônus recaia sobre os homens, que freqüentavam as festas em busca de diversão ou de possíveis encontros amorosos.
No decreto, recheado de demagogia e de falso moralismo, Cafeteira justificava a proibição dos bailes pelo fato de “ocorrerem em ambientes que não possuem associados legalmente, razão pela qual é preciso o poder público agir em defesa dos costumes e da moralidade da comunidade”.
Em torno do explosivo assunto, setores da sociedade, como a imprensa e o clero, resolvem se posicionar. O Imparcial manifestava-se contra a edição do decreto, o Jornal Pequeno declarava-se literalmente a favor do mesmo. Sacerdotes, como monsenhor Ladislau Papp, e entidades religiosas, como o Movimento Familiar Cristão, entraram firme no caso e em apoio a Cafeteira.
Diante do implacável decreto, os promotores dos bailes, apavorados com os iminentes prejuízos, contrataram advogados e pleitearam na Justiça a revogação da medida do prefeito.
Pressionado pelos políticos e pela mídia, o secretário de Segurança, coronel Antônio Medeiros, vem a público e assume posição contrária ao decreto municipal. Mais ainda: assina Portaria avocando a competência quanto ao disciplinamento e funcionamento das festas carnavalescas, assegurando, portanto, aos promotores dos bailes o direito de realizá-los.
Em apoio ao secretário de Segurança, o deputado Clodomir Millet e o vice-governador Antônio Dino usaram as emissoras de rádio e televisão, através das quais, sem dó e piedade, desfecharam combate ao esdrúxulo ato do prefeito.
A decisão do coronel Medeiros foi repelida pelo prefeito, que, imediatamente, interpôs recurso na Justiça, no pressuposto de que era da Prefeitura e não da Secretaria de Segurança a competência de zelar pelos costumes e fiscalizar as diversões públicas.
Enquanto a polêmica dominava a cidade, com a população dividida em torno do rumoroso assunto, a Justiça, como sempre morosa e hesitante, se omitia. Isso deu tempo a Cafeteira, do alto de sua esperteza, a botar nas ruas os blocos e as escolas de samba, que, financiados pela municipalidade, expressavam o descontentamento contra a Secretaria de Segurança e apoio ao seu decreto.
Foi o bastante para o governador José Sarney entrar de cabeça no episódio, no entendimento de que as manifestações de rua eram manipuladas e subsidiadas pelos cofres da Prefeitura e punham a opinião pública contra as autoridades constituídas. Ao comandante do 24º Batalhão de Caçadores, coronel Alberto Braga, Sarney pediu a instauração o inquérito policial-militar para apuração dos fatos.
Ainda que as autoridades municipais e estaduais esgrimissem as armas, na tentativa de ser encontrada uma solução política ou jurídica para o impasse carnavalesco, os bailes populares não abriram as portas. Por isso, as mascaradas sumiram e os foliões ficaram a ver navios. Resultado: naquele ano o carnaval de São Luís foi um verdadeiro fiasco e os bailes de máscaras entraram num processo de definhamento e nunca mais voltaram a se estabelecer.
Do irrefletido gesto de Cafeteira, além do fim dos bailes populares, restou a inimizade pessoal e política como o governador José Sarney. Os dois só vieram apertar as mãos em 1985, quando da formação da Aliança Democrática.

2 comentários para "O FIM DOS BAILES POPULARES"


  1. Jojoca

    Esse só fala besteira… Vai estudar para aprender a escrever algo útil…

  2. DYEGO MARTINS

    Curiosamente, Epitácio Cafeteira já havia sido considerado um grande folião, conforme registrou o Diário de São Luiz, edição de 25 de janeiro de 1948. Reproduzo a seguir.
    CARNAVAL DE 1948
    “SÓ PRA CHATEAR”…
    Destinado a revolucionar o carnaval maranhense da alta sociedade, acaba de ser organizado nesta capital, mais um bloco carnavalesco denominado “Só pra chatear”…
    Trata-se de uma iniciativa dos empregados da Agência do Banco do Brasil S.A, nesta cidade, tendo á frente a figura do inveterado folião Epitácio “Cafeteira” Pereira.
    Logo que circularam os primeiros informes sobre a boa nova, esta reportagem procurou com elementos da classe bancária e…”só pra chatear” deparou-se-nos exatamente êle… “Cafeteira”. E perguntamos:
    – É exato que os bancários vão organizar um bloco?
    – É sim, respondeu-nos.
    – E para que?
    “Cafeteira” soltou uma estrondosa gargalhada e disse-nos “só pra chatear”…
    – E o nome do bloco?
    – “Só pra chatear”!…
    Ora, não chateia, diz o nome certo do bloco.
    – “Só pra chatear”!…
    Como vêm os leitores, o Carnaval sanluizense estará bem servido com este bloco que, ao que parece vai mesmo… “chatear”.
    “Só pra chatear” terá como campo de ação, os confortáveis e bem ornamentados salões do Satélite Clube.

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