A POETISA DA MINHA TERRA

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No dia de hoje, há 54 anos, morria na minha cidade, a poetisa Marina Luz, morte que até hoje o Itapecuru lamenta e chora.

Sua importância intelectual e educacional sempre será lembrada, ainda que em vida não tenha sido compreendida, especialmente pelas autoridades municipais, que não lhe dispensaram um tratamento à altura da obra que construiu no campo da poesia e do ensino.

Esse tratamento, indiscutivelmente discriminatório, deve-se ao fato de ter sido uma mulher de origem humilde, pobre, descendente de escravos e feia.

Por incrível que pareça, Mariana Luz ou Siá Nica, como era chamada, só começou a ser olhada de outra maneira quando a cidade foi administrada por um prefeito não itapecuruense: Bernardo Tiago de Matos, nomeado pelo interventor Paulo Ramos, na época do Estado Novo, para comandar os destinos da terra de Gomes de Sousa, no período de 1943 a 1945.

Foi esse prefeito que ao ver a situação de penúria em que vivia a poetisa e das condições desumanas em que morava – um casebre sem as mínimas condições de habitação – decidiu mobilizar a população e com os parcos recursos da prefeitura, deu a ela uma casa para viver os anos que lhe restavam, de modo mais saudável e digno.

A nova casa de Mariana Luz, construída na Rua Caiena, que, em função da urbanização da cidade, transformou-se na moderna Avenida Brasil, após a morte da poetisa, teve um destino que ela jamais poderia imaginar. Sendo visceralmente religiosa e devota de Nossa Senhora das Dores, deixou registrada em cartório a transferência da casa para o patrimônio da igreja, após o seu falecimento.

Todos os padres que passaram pela paróquia de Itapecuru, respeitaram a vontade da poetisa, à exceção de um dos últimos, o trêfego Raimundo Baiano, que não tinha pelos afazeres sacerdotais o mesmo desvelo que dedicava ao dinheiro. Foi ele que, à revelia do bispo da diocese, a quem devia subordinação hierárquica, vendeu a casa para um empresário da cidade, que a derrubou e a trans formou num imóvel comercial. Pena que o prefeito da época, Miguel Lauande, não tenha tido a coragem de desapropriá-la antes que fosse destruída.

Boa parte da vida de Mariana Luz foi voltada para a publicação de um pequeno, mais valioso livro, sobre suas produções literárias. As autoridades municipais e estaduais sempre fizeram ouvido de mercador aos seus apelos. Até ao governador de São Paulo, Ademar Barros, ela, em outubro de 1953, mandou uma carta nesse sentido. Também em vão. O governador paulista respondeu-lhe que não poderia atendê-la por conta dos compromissos assumidos com os agentes culturais de sua terra.

Só nos meados dos anos 1950, depois de sua eleição para a Academia Maranhense de Letras, viu transformado em realidade seu tão sonhado desejo. A iniciativa da publicação do livro “Murmúrios” partiu do Centro Acadêmico Clodomir Cardoso, da Faculdade de Direito de São Luis, e do Orbis Clube de São Luis, atendendo a um apelo do escritor Bernardo Coelho de Almeida.

Em 1990, eu encontrava-me à frente da Secretaria da Cultura do Estado do Maranhão quando soube que o livro de Mariana Luz estava esgotado. Após muita procura, achei um exemplar em Itapecuru. Imediatamente providenciei a reedição da obra.

Ao reeditar “Murmúrios”, tratei de homenagear a minha terra, mas principalmente à inesquecível poetisa e professora, da qual tive a ventura de ser aluno numa das fases mais importantes da vida – a infância- quando fui por ela alfabetizado.

Dela guardo indeléveis recordações, sobretudo quanto à maneira de ensinar e tomar as lições dos alunos. Sentava-se à cabeceira de uma comprida mesa, onde, compenetrada e plena de autoridade, avaliava rigorosamente o desempenho de cada discípulo.

Naquela época, dado à minha pouca idade, não tinha a menor idéia de quem era aquela mulher, que se escondia por trás de uma incrível modéstia. Só anos mais tarde, no fulgor da juventude, pude realmente compreender e ter a dimensão verdadeira do seu valor intelectual e do que representava no cenário cultural do Maranhão.

Por conta de sua extraordinária bagagem literária, que levou o escritor Coelho Neto, em 1899, a visitar a Itapecuru só para conhecê-la pessoalmente, a Academia Maranhense de Letras, por iniciativa do intelectual Sousa Bispo, elegeu-a para integrar a instituição.

A solenidade de posse realizou-se a 10 de maio de 1949, com a presença do governador Sebastião Archer da Silva, sendo saudada pelo acadêmico Mário Meireles.

Em homenagem à insigne poetisa, quando da fundação da Academia Itapecuruense de Ciências, Letras e Artes, em 7 de dezembro de 1911, como presidente da instituição, fiz questão de o seu o nome  ser glorificado à condição de patrona.

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