OS MEUS ÍCONES

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Quando a gente ingressa na vida adulta, sabe que deixou para trás um repertório de atos que marcaram a infância e adolescência e de um elenco de pessoas que tiveram acentuada influência nesse período da existência.

Daqueles atos e daquelas pessoas, que ficaram indelevelmente gravados na memória, dificilmente a gente esquece. No que se refere às pessoas, tornam-se merecedoras das atenções e das admirações dos contemporâneos, que os elevam à categoria de ídolos ou ícones.

Eu, por exemplo, desde a mocidade, fase em que se vive de sonhos e fantasias, mas também se pensa no que nos espera, em matéria de sobrevivência pessoal e profissional, selecionei criteriosamente três figuras humanas da minha geração e transformei-as em ícones: José Mário Santos, Ricardo Bogéa e Joaquim Itapary.

Deles, até hoje, guardo boas e inolvidáveis lembranças, não apenas pelos atributos pessoais, intelectuais e morais, mas, também, pelo que representaram como exemplos e referências.

Sobre José Mário Santos, devo dizer que o conheci quando estudávamos no Liceu Maranhense, na década de 1950. Ele, mais adiantado, no curso clássico, eu, no ginasial. A partir daquela época, passei a nutrir por ele uma inexcedível admiração pelo brilho da inteligência e do indiscutível talento de líder.

Mas as nossas relações de amizade só fluíram e se estreitaram no Rio de Janeiro, em 1961, quando ele ganhou uma bolsa de estudo para fazer um curso no ISEB- Instituto Superior de Estudos Brasileiros.

Eu era, naquele tempo, um tremendo alienado político e um lacerdista de carteirinha. Graças às conversas com José Mário e as palestras assistidas no ISEB, proferidas pelos maiores pensadores e intelectuais progressistas do país, ressaltando-se Álvaro Vieira Pinto, Roland Corbisier, Guerreiro Ramos, Inácio Rangel, Celso Furtado, Hélio Jaguaribe e outros do mesmo quilate, comecei a mudar de pensamento político e aderir às novas idéias que levariam o Brasil ao caminho do progresso e do desenvolvimento.

Ao lado de José Mário, conheci e consumi o que o Rio de Janeiro tinha de bom, quando era a capital da República e o maior pólo cultural e político do país. De alienado, virei um ávido freqüentador de livrarias, bibliotecas, teatros, cinemas, sem perder, também, lançamentos de livros, consertos musicais, conferências e palestras de renomados escritores nacionais e internacionais. Assisti até conferência do escritor francês Jean Paul Sartre, sem saber uma palavra do idioma de sua pátria.

Pelo fato de José Mário me ensinar a ver o mundo diferente e de introduzir-me na área da cultura e das letras, o escolhi para um dos meus ícones. Estou feliz por vê-lo, em companhia da inseparável esposa, Cleide, a morar novamente nesta cidade, que ele adora e onde ainda tem um bom número de amigos e admiradores, que faço questão de ser o primeiro da fila.

Outro ícone da minha geração, Ricardo Bogéa. Vim a conhecê-lo em 1962, quando fomos candidatos à Assembleia Legislativa. Eu, pelo PSP, ele e Sálvio Dino, pelo PDT. Formamos um trio jovem, de vanguarda e em defesa das reformas de base que o país reclamava naqueles idos. Por isso, pagamos um preço alto. Eu e Sálvio tivemos os mandatos cassados e ele escapou da guilhotina por pouco.

De Ricardo, conservo as melhores recordações de amigo e parente. Um jovem inteligente, probo, correto e competente como político, professor universitário e advogado, seguindo os passos de seu ínclito genitor, o mestre Antenor Bogéa.

Pela integridade, coerência e simplicidade, jamais se afastou da sua maneira de viver e de participar dos acontecimentos de sua época. Amargurado com os tempos que o Maranhão atravessava nos idos da ditadura militar, mudou-se para Brasília, onde também brilhou como profissional.

Mas, na capital da República, sua vida foi curta. Desapareceu precocemente para tristeza dos familiares e dos amigos, dentre os quais este escriba que a ele devotava grande veneração e respeito.

O terceiro ícone da minha geração é Joaquim Itapary, com quem passei a ter maiores aproximações e contatos na segunda metade da década de 1960. Antes disso, só cumprimento e de longe.

Após a posse de José Sarney no governo do Maranhão, em 1966, eu e Itapary nos conhecemos mais de perto. Ele trabalhava na assessoria do governo, como técnico egresso da Sudene, e eu vivia à toa na vida, por ser expurgado da vida pública. Num belo ou feio dia, não sei rigorosamente o lugar, num encontro casual, Joaquim tomou a iniciativa de saber o que eu estava a fazer. Diante de minha triste resposta, ofereceu-me a oportunidade de fazer um curso em Fortaleza, após o qual fui contratado para trabalhar na Sudema, que reunia a fina flor da tecnocracia maranhense.

Na Sudema, a admiração por Joaquim Itapary tomou vulto, não apenas por ter me ajudado a sair da ociosidade, mas pela sua qualidade de técnico polivalente. Dava gosto vê-lo trabalhar simultaneamente como advogado, economista, arquiteto, redator e outras “cositas mas”, ações que executava com maestria e competência.

Depois da Sudema, Itapary, pelas virtudes a ele inerentes, ocupou cargos e postos importantes nas administrações diretas e indiretas dos governos estadual e federal, em que sempre mostrou o seu valor e sua capacidade técnica.

Nesses cargos, pela amizade construída entre nós, sempre se lembrava de mim para trabalhar ao seu lado. Algumas vezes fui. Por exemplo, quando esteve à frente da Secretaria da Cultura. Os anos se passaram e voltamos a nos encontrar na Academia Maranhense de Letras, em que conheci a outra marcante vertente de Itapary , a de romancista, cronista e poeta, que produziu, com o brilho da criatividade, talento ímpar e invejável inteligência, livros em prosa e poesia da melhor qualidade literária, que fizeram com que eu me orgulhasse de ser seu amigo e de não me arrepender de tê-lo como ícone.

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

 

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