Alegria (Joie de vivre)

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Do Livro das Cortesãs – Um Catálogo das Suas Virtudes, de Susan Griffin, Editora Rocco, li, gostei e dou de graça para vocês:

A capacidade de sentir prazer na vida é uma virtude como as outras. A alegria não é tão simples como parece. Há pessoas que, por medo ou prudência, se acostumam tanto a resistir ao sentimento que acabam perdendo totalmente a prática de se sentirem satisfeitas.

Outras, confundindo domínio com prazer, preferem a conquista ao deleite e jamais saboreiam realmente o produto de seus esforços. É uma arte saber gozar a vida, sentir desejo e aceitar o que vem, saborear cada detalhe, em todas as suas minúcias, de cada sabor, sensação ou momento que surge, por acaso ou intenção.

A experiência requer uma coragem sutil. Deleite, júbilo, exaltação podem tirar uma pessoa do prumo, perturbando a ordem estabelecida do dia (ou, como é mais freqüente, da noite).

E, como quase todas as formas de alegria são fugazes, o prazer deve acabar conduzindo à perda, por menor que seja – uma perda que traz junto a certeza de que tudo passa.

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Tempo de liturgias penitenciais

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Abril_4

A celebração da Paixão de Cristo, no Brasil, não é apenas uma efeméride religiosa, mas foi secularizada pela tradição. Certamente, a prática da penitência, ou a maior afluência aos templos, a partir do Domingo de Ramos, tem uma conotação mais visível no ritual dos católicos, onde se estimula a prática penitencial. Ainda assim, está dirigida, nos anos recentes, para a convivência com os temas da nossa vida social. Este ano, por exemplo, com uma atenção forte para unir a sociedade na promoção de uma economia a serviço da vida, sem exclusões, criando uma cultura de solidariedade e trazendo paz.

A Semana Santa é, para os religiosos, um tempo apropriado aos exercícios espirituais, às liturgias penitenciais, às privações voluntárias como o jejum e a partilha fraterna em obras de caridade, ou da simples esmola aos desprotegidos. Entre nós, 50 anos atrás, as rádios se limitavam, a partir da quinta-feira até a chegada do sábado de Aleluia, a divulgar músicas instrumentais, de preferência de ritmo lento, dos chamados autores clássicos. Hoje, não há modificação sensível na programação diária dos veículos de comunicação.

A abstinência de carne foi há muito substituída por mesas fartas, ainda que exclusivamente com peixes e produtos vegetais. No nosso caso, desde o bacalhau importado até os pescados frescos de nossos mares, rios e alagados (às vezes os açudes e barragens construídas para gerar energia elétrica). As comidas de coco, inclusive o feijão e o arroz, fazem parte do ritual mundano da Semana Santa. E o vinho tem seu lugar garantido à mesa, até em muitas famílias de baixa renda. Recente é a introdução de práticas importadas como a distribuição de “ovos de Páscoa” em forma de chocolate.

Tudo isso, em homenagem ao Cristo que, há dois mil anos, incorporou ao espírito conturbado do Planeta Terra sua lição de paz que deveria servir de roteiro ao mundo interior de todos nós.

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Nascem lilases da terra morta

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Abril_1

Para T.S. Eliot, abril é o mais cruel dos meses. Em abril nascem lilases da terra morta. Mistura de memória e desejo aviva raízes agônicas com a chuva da primavera. Tensão entre o renascer da vida e os desejos que hibernaram durante o inverno.

Para Robert Frost, não. Cada poeta é um poeta.

Eliot escrevia no seu Terra Desolada (Waste Land), traduzido por Ivan Junqueira. Aliás, a tradução para o poema é brilhante, mas peca por uma falta de adaptação de hemisfério, deveria trazer o texto “Setembro é o mais cruel dos meses…”, e colocar uma nota de rodapé explicando a tradução de April por Setembro.

Nosso inverno definitivamente não é o inverno de Eliot, não ficamos debaixo de neve, não temos animais que hibernam (os sabiás, meus vizinhos, cantaram durante todo os meses de junho a agosto, e continuam a cantar loucamente), nem flores como as tulipas que brotam no meio do gelo. Nossa primavera provavelmente não deveria ser, como no poema, uma estação cruel.

Gabriel Celaya, um poeta espanhol, no seu “La poesia es una arma cargada de futuro” , diz que quando nos defrontamos com os olhos claros da morte dizemos as verdades; as bárbaras, terríveis, amorosas crueldades. Dizemos poemas.

Como todo dia estamos a um dia a menos da morte, olhamos os seus olhos cotidianamente. E cruelmente poetamos. Nem tão maldosamente (algumas vezes sim) e certamente nunca sem algum sentimento.

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