A GRIPE ESPANHOLA NO MARANHÃO

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Envaideço-me de possuir em minha casa uma boa biblioteca, que se notabiliza pela expressiva quantidade e qualidade de livros de autores maranhenses, do passado e do presente, sobre literatura, história, economia, sociologia e outros gêneros.

Confiado nesse formidável acervo bibliográfico, imaginava não encontrar dificuldade para achar um livro, de qualquer autor, que me desse informações sobre a epidemia da febre espanhola, que no século XX, mais precisamente em 1918, que matou muita gente no Maranhão.

Depois de intensas buscas, para saber o que aconteceu em São Luís, quando a epidemia da febre amarela atacou avassaladoramente o povo maranhense, afinal, apareceu uma luz no fundo do túnel.

Essa luz veio no bojo de um extraordinário livro, publicado em 2015, sob os auspícios da Alumar, da autoria da competente professora e historiadora, Maria de Lourdes Lauande Lacroix, intitulado “História da Medicina em São Luís”, dedicado ao estudo dos médicos, das enfermidades e das instituições de saúde, do passado e do presente de nossa cidade.  

No sumário do livro, um capítulo sobre o assunto que exaustivamente  procurava, com o título de Epidemia e Endemias, trazendo comentários e informações sobre as chamadas doenças de massa, como a malária, febre amarela, febre tifoide, varíola, gripe espanhola, peste bubônica, tuberculose, hanseníase, venéreas, leishmaniose e esquistossomose, que infestaram São Luís ao longo do tempo.

A DOENÇA NO BRASIL

Com referência à gripe espanhola, que ceifou a vida de numerosos maranhenses, Lourdinha Lauande, escreveu: “No último ano da I Guerra Mundial, a Europa foi assolada por uma efêmera epidemia de gripe. No final de agosto as consequências foram muito mais severas, transferindo-se para todos os continentes. Um navio vindo de Liverpool, com escala em Recife, Salvador e Rio de Janeiro trouxe para o Brasil a gripe, diferenciada de outras pelo vírus recém-criado e desconhecido do organismo humano, indefeso e impotente para enfrentar a extraordinária mortandade. 

 SINTOMAS DA DOENÇA

“O rápido contágio e a maneira como se alastrava assustou a população de São Luís: processo de sufocação, diarreia, dores insuportáveis, letargo, coma, uremia, síncope e morte, aconteciam em horas e poucos dias. Seu nome se relacionou com o maior número de casos fatais na Espanha. Pandemia de origem desconhecida, estarreceu o mundo. O meio médico, decepcionado ao pensar que os grandes flagelos epidêmicos e as doenças contagiosas fossem coisas do passado, se viu defronte de um problema não evitado mesmo com o desenvolvimento da bacteriologia.

A DOENÇA ATACA

“As cidades pararam, especialmente pelas baixas entre os mais pobres. Os hospitais foram insuficientes durante a pandemia da gripe espanhola, ocorrida em 2018. Alguns hospitais improvisaram isolamentos e o Serviço Sanitário do Estado convocou médicos e funcionários não atingidos pela doença para cuidarem dos enfermos. A crise hospitalar exposta pela epidemia incentivou grupos a lançar campanhas em prol da construção e novos hospitais.

A DOENÇA EM SÃO LUÍS

“Esta gripe incomum abalou São Luís no final da segunda década do século XX, atacando famílias inteiras, sem ter alguém para ajudar, tratar, aviar receitas, alimentar, ações indispensáveis na vida cotidiana. Os casos fatais desolaram a população e alertaram a Saúde Pública. A cidade foi abandonada pelas famílias, fugindo do mal para sítios na Maioba, Anil, Jordoa e São José de Ribamar, e quando a gripe chegava aos arrabaldes, os sobreviventes buscavam novos refúgios em locais mais distantes.

SOFRIMENTO E ÓBITOS

“O maior número de óbitos incidiu nas pessoas mais pobres, pelas péssimas condições de vida, defesas naturais enfraquecidas e sem maiores cuidados médicos. Os sãos fugiam da morte se alojando em palhoças de beira de estrada. O silêncio da urbe prevalecia com a falta do ruído do bondinho de tração animal, das caleças, das carroças e do trotear dos cavalos. Ruas vazias, casas abandonadas, janelas fechadas ou portas encostadas por luto ou por pessoas em estado grave. Urubus voavam atraídos pelo mau cheiro da cidade. Dia e noite os marceneiros preparavam caixões, sem atender à totalidade dos falecidos. Faltou coveiro para abrir covas individuais. A emergência levou muitos corpos a serem jogados nas valas comuns, sem a costumeira assistência religiosa. Nem médicos, nem padres davam conta dos inúmeros chamados.

ATUAÇÃO DOS MÉDICOS

“Para diminuir o pânico, os jornais não mais noticiavam o número de mortos, porém, tornou-se impossível encobrir os horrores da peste pelo movimento do Isolamento do Lira: entrava grande quantidade de doentes e saía quase o mesmo número de corpos. Distinguido por quatro penachos, todas as noites o carro funerário fazia percurso pela cidade e Casas de Saúde, sempre superlotados de mortos, uns sobre os outros, alguns com a roupa do corpo, outros amortalhados com o seu próprio lençol, a caminho do cemitério.

PÂNICO NA CIDADE

Para evitar maior pânico, os sinos da igreja de São Pantaleão não mais cumpriam a tradição de tocar com a passagem dos defuntos. Dia e noite os médicos atendiam doentes, quase todos graves. Ante o horror de proliferar a mortal gripe, cresceu o espírito de solidariedade entre pessoas de recursos. Muitos autorizavam o fornecimento pela Farmácia Garrido de medicamentos receitados por médicos a pessoas inválidas.

Alguns enfermos, sem coragem para enfrentar o sofrimento, suicidaram-se. Outros, se fortaleciam pelas suas crenças. O esforço médico de esclarecimento da população não arrefeceu a fé do povo. Uns encobriam a doença de seus familiares, preferindo aplicar a medicina popular e, no caso de morte, serem assistidos com carinho dos seus e assistência espiritual da igreja ou dos orixás. Outros fingiam tomar xaropes ou pílulas receitadas pelos médicos e os substituíam por orações, promessas e conversas com os seus santos de devoção.”

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