As lições da passagem de Francisco

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Natalino Salgado

natalinoEm seu primeiro discurso no Brasil, na recepção realizada no Palácio Guanabara (RJ), o papa Francisco proferiu uma frase que marcou sua chegada à nossa pátria. À ocasião,ele disse que “Cristo bota fé nos jovens”, o que lhe garantiu sonoros e efusivos aplausos. A frase dita reforçou ainda mais as marcas de seu iniciante pontificado: a quebra do protocolo, o sorriso contra a sisudez, o bom humor frente à carranca. A julgar pelas enormes caravanas de todos os rincões deste imenso país e de mais de 170 países, os jovens também “botam fé” no papa.

Antes, esse líder religioso havia comovido os presentes com a simpática sugestão de que batia à nossa porta com delicadeza, talvez inspirado na pessoa do próprio Jesus, que, no livro do Apocalipse, diz à igreja em Laodicéia: “Eis que estou à porta e bato; se alguém ouvir a minha voz e abrir a porta, entrarei em sua casa e cearei com ele, e ele, comigo”.

A Jornada Mundial da Juventude vem como um sopro fresco sobre a igreja, como se águas novas oxigenassem um rio perene, dando vida a seus habitantes. A coragem e a intrepidez dos jovens renovam os mais velhos, estimulam e fazem-nos acreditar que o futuro que começa agora pode ser aguardado com esperança, pois uma geração que se irmana neste grande encontro busca em Deus valores eternos que nos ajudam a fazer de nosso mundo algo melhor. Por isso mesmo, o sábio autor do livro de Eclesiastes já adverte no capítulo 12, versículo 1: “Lembra-te também do teu Criador nos dias da tua mocidade, antes que venham os maus dias…”.

Ainda na Itália, pouco antes de partir em sua primeira viagem – atendendo também uma chama missionária -, o papa destacou sua expectativa sobre a Jornada. Impactado pelo movimento que tomou nossas ruas e que causou receios e temores quanto ao evento no Rio, ele disse: “Vou ao Brasil para encontrar os jovens, não isolados, mas no contexto social”. Lembro ainda do apóstolo João, que, em sua primeira carta, aponta os destinatários de sua missiva, na segunda parte do versículo 14 do capítulo 2: “Eu vos escrevi, jovens, porque sois fortes, e a palavra de Deus está em vós, e já vencestes o maligno”.

Com sua resposta, o papa ratificou não ter medo daqueles que estão em busca de um mundo menos injusto; que brigam, sim, mas, por causas corretas, cobram direitos, defendem os mais fracos e se revoltam diante de tanto descaso e opressão. Por que teria medo? Nesta mesma fala, o papa sugere o equilíbrio entre a valorização dos jovens e a chance que deve ser dada à sua emancipação e demandas, com a inclusão dos mais velhos como representantes de um futuro pelo qual eles também aspiram: “Um povo tem futuro se caminha para frente, com os jovens, com a força que têm, e também com os idosos, porque eles são a sabedoria da vida”.

A Jornada, que se encerra neste domingo, tem sido um enorme encontro entre muitas línguas, culturas e idades. Cenário perfeito de mudança, transformação e símbolo que, por muito tempo, vai mostrar um país melhor que todos queremos. O salmista Davi afirma que a mocidade dos jovens se renova como a da águia, e o apóstolo Paulo explica que, embora o homem exterior se corrompa, o homem interior se renova dia a dia (Salmo 103; e 2 Coríntios 4:16). Isto é mais que esperança, é um fato que até a ciência reconhece.

Talvez nesta díade repouse outra fala do papa Francisco em sua primeira homilia no Brasil: “Devemos seguir três simples posturas: conservar a esperança, deixar se surpreender por Deus e viver na alegria”. De fato, se seguirmos a esperança como algo presente para o dia a dia, não como mera expectativa, mas como um instrumento para suportar as dificuldades que a vida impõe, e se nos deixarmos surpreender por Deus (e imagino que tão-somente pensar nEle, nas maravilhas que fez, na força da vida que pulsa em todo lugar), seremos – eis o passo seguinte – cheios de alegria.

Permitam-me citar Paulo mais uma vez. Ele, em certa passagem, confessa que aprendeu a viver contente. As circunstâncias não determinam mais seu estado mental e emocional, porque em Deus a fartura e escassez, a dor e alegria são parte de um grande todo com significado que a fé operante vive.

Acredito na juventude. Acredito ainda mais na harmonia entre os jovens e velhos. Estes, com a experiência de muitos caminhos trilhados; aqueles, com a força que impulsiona o mundo adiante. Se lograrmos uni-los, temos o melhor dos dois mundos humanos. Muito obrigado, Santo Padre. A sua fala e o seu sorriso muitas lições nos legaram nesses poucos dias. Que Deus abençoe o nosso papa. E que Deus abençoe o nosso Brasil.

Doutor em Nefrologia, reitor da UFMA, membro do IHGM, da AMM, AMC e AML

1 comentário para "As lições da passagem de Francisco"


  1. Nilton Pereira

    Parabéns, professor Natalino Salgado, pelo seu belo artigo….

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