Com a palavra… Bruno Duailibe

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Nosso cronista especial voltou com mais um de seus saborosos textos na coluna Opinião, do Jornal O Estado MA, do último domingo, e agora Hot Spot reproduz para você. Sem mais delongas, vamos à crônica de Bruno, que, como sempre, recebe aqui uma ilustração com a assinatura de Salomão Jr

Choque de Ordem

No passado, já tive oportunidade de aqui escrever umas poucas linhas no artigo intitulado “(Des)ordem e progresso” sobre a minha percepção de que desordens podem ser necessárias para que novas ordens – melhores ou piores – ganhem forma. Vislumbrando um futuro próximo melhor, creio que chegou o tempo de dar ordem à desordem social ditada pela violência.

Para um complexo problema social e histórico, porém, as respostas e as soluções não são fáceis, nem tampouco óbvias. Como a violência se nutre das circunstâncias políticas, econômicas e culturais da sociedade em que ela ocorre, cada um desses elementos deve ser considerado quando da formulação e implementação de políticas públicas que tenham como foco a erradicação da violência. E leva tempo para que se consolidem e se sintam os efeitos benéficos de suas ações.

Por outro lado, a sociedade, refém da violência, exige uma resposta imediata. É que ninguém suporta mais a opressão que, mesmo sem escalar os muros de sua casa de maneira furtiva, é onipresente e deixa-nos muitas vezes a impressão de que o Poder Público não é capaz de dominar as rédeas da situação.

Domingo passado, ao ver as notícias que circulavam nos matutinos do país, li com a devida atenção uma reportagem do jornal “O Globo” que, a meu ver, demonstrava um caminho relativamente simples na contenção da violência urbana e na diminuição dessa estranha sensação de impotência a que acabo de me referir. Afirmo isto porque a reportagem dava conta das ações introduzidas na cidade do Rio de Janeiro, através da Unidade de Ordem Pública (UOP), que visa combater a desordem social e a aparente inoperância do Poder Público.

Trocando em miúdos, a reportagem noticiava as ações dos guardas municipais que, desde o dia 18.04.2011, começaram a atuar em alguns bairros da cidade para lidar, vinte quatro horas por dia, com os problemas cotidianos dos cidadãos. Os guardas, dentre outros exemplos, atuam na organização do espaço público e na repreensão de pequenas transgressões como urinar na rua; a atuação de flanelinhas; a publicidade irregular; o estacionamento em locais proibidos; a ocupação indevida do espaço público; as construções sem as respectivas licenças. É o que a Secretaria Especial de Ordem Pública denomina por “tolerância zero”, através da qual fazem valer as leis e o código de postura municipal.

Você pode agora questionar-se qual a relevância de se coibir essas pequenas ocorrências se, na verdade, o que deve ser impedido é a prática de crimes de maior potencial ofensivo, como assaltos e homicídios. Em verdade, essa é a intenção da medida adotada pelo Rio de Janeiro, mas o caminho que se busca trilhar é o da prevenção. Eis aqui o ponto nevrálgico da questão que, às vezes, pode nos escapar: a sensação de que não existe ordem em determinada localidade pode dar ensejo à prática de atos cada vez mais violentos.

Esta ideia foi defendida num estudo desenvolvido por James Q. Wilson e por George Kelling, que foi publicado em 1982 na revista Atlantic Monthly.  Para demonstrar a importância de se conter também as pequenas transgressões, os autores se valem de um exemplo elucidativo que usa a imagem de janelas quebradas.

Segundo eles, se a janela quebrada de um prédio não for imediatamente reparada, pode sugerir o abandono do imóvel e até mesmo da rua em que ele está situado. Isso pode ensejar a prática de atos de anônimos que quebrarão as demais janelas do prédio até vandalizá-lo por inteiro. E não tardaria para que o mesmo acontecesse a outros prédios da rua e do bairro. Logo, uma comunidade estável poderia se transformar numa selva.

Esta teoria pautou as ações que foram levadas a cabo, com assessoria de Kelling, nos anos 1990 em Nova Iorque, durante a emblemática gestão do prefeito Rudolph Giuliani e que, de acordo com o governo municipal, reduziram a criminalidade substancialmente. Entre as ações que controlaram a criminalidade, estava o foco na repreensão de comportamentos anti-sociais e de pequenas transgressões, tais como as que são coibidas pela guarda municipal carioca.

Embora receba inúmeras críticas, não se pode deixar de reconhecer que a política pautada no restabelecimento da ordem pública, tal qual a implementada pela cidade do Rio de Janeiro, focada nas necessidades específicas de cada local (territorializada), possui o condão de proporcionar resultados mais eficazes e eficientes. Isto se torna possível porque as medidas e soluções são adequadas aos problemas de cada comunidade.

Ademais, deve ser igualmente enfatizado que, embora não exista uma relação de causa e efeito entre comportamento anti-social e crime, a tendência de que a desordem social aumente a criminalidade torna necessária a adoção de medidas preventivas, que impeçam a desordem do espaço público.

E porque falta menos de um ano para as eleições municipais, deixo, desde já consignado, que terá grandes chances de receber apoio popular o candidato a prefeito que inserir no seu programa de governo a criação de uma política de segurança pública que promova um verdadeiro choque de ordem na cidade São Luís, semelhante àquele que já vem proporcionando as Unidades de Ordem Pública no Rio de Janeiro. Sem dúvida, este seria um excelente presente pelo quarto centenário da nossa capital.

Bruno Duailibe

Advogado. Graduado pela Universidade Federal do Maranhão. Pós-Graduado em Direito Processual Civil no ICAT-UNIDF / [email protected]

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