Medicamento no tempo certo

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O astrônomo francês Jean Jacques de Mairan demonstrou, em 1729, que todos os seres vivos obedecem a ritmos internos. Foram necessários quase três séculos para que a ciência provasse que as doenças também têm um relógio biológico próprio. Entre as 8 e as 10 horas da manhã, os riscos de infarto são 70% maiores do que em qualquer outro período do dia. A asma prefere atacar de madrugada – as piores crises acontecem por volta das 4 horas. Úlcera, artrite, osteoporose, epilepsia, alergia… a lista das moléstias que se manifestam com hora marcada é enorme. A constatação de que isso é uma realidade permitiu o surgimento de uma nova linha de medicamentos. Programados para agir no momento em que os sintomas são mais agudos, esses remédios têm tudo para ser uma das grandes promessas da medicina para os próximos anos. Quem não gostaria de trocar o tradicional comprimido tomado de seis em seis horas por um único ao dia? E, de quebra, livrar-se de alguns efeitos colaterais próprios das grandes doses de medicamento?

Por enquanto, os remédios mais estudados são as drogas contra a pressão alta. Um dos grandes motivos é o fato de a hipertensão ser o principal fator de risco para as doenças cardiovasculares, como infarto e derrame.. Há no mundo 500 milhões de hipertensos, 13 milhões no Brasil. A pressão alta está relacionada a 85% dos casos de derrame e a até 60% dos infartos. Com as descobertas mais recentes sobre o ritmo das doenças, o caminho que se abre para a criação de novas drogas é enorme. Abaixo, alguns dos campos mais promissores:

As piores crises de úlcera e gastrite ocorrem entre 11 da noite e 1 da manhã, quando há maior liberação de ácidos gástricos, que irritam ainda mais a parede do estômago.

.Os quadros mais dolorosos de artrite reumática, doença auto-imune, ocorrem das 6 às 8 da manhã, quando as células de defesa do organismo atacam as articulações.

.Das 21 às 23 horas é o período em que as vítimas de dores crônicas, como as de cabeça e musculares, mais sofrem. Isso ocorre porque, nesse horário, o organismo diminui a produção de endorfinas, a versão natural da morfina.

.Estudos mostram que a quimioterapia contra alguns tipos de câncer, como o de útero, funciona melhor durante a manhã. Nas primeiras horas do dia, as células cancerosas estão mais sensíveis à ação dos remédios. Com isso, preservam-se as células sadias do ataque quimioterápico e o paciente sofre menos com os efeitos colaterais, como perda de cabelo, náuseas e queda no sistema imunológico.

O ser humano não foi dotado de um relógio biológico à toa. Sempre se dormiu à noite porque no escuro somos mais vulneráveis ao ataque dos predadores. Se as doenças também seguem um compasso característico, cabe à ciência ajustar o ritmo dos tratamentos. 

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