O melhor da arte culinária é comer com espírito
Tanto o cinema como a literatura já nos ofereceram boas e exóticas inspirações para a gastronomia. Entre os que gostei estão “A Festa de Babete”, “Bagdá Café”, “Como Água para Chocolate”, “Tomate Verdes Fritos”. Entre os esquisitos assisti “O cozinheiro, o ladrão, sua mulher e o amante”, “Delicatessen” e “A comilança”. Dos últimos não sei dizer se gostei do filme. Da comida, certamente não.
Já na literatura, o livro “O leopardo”, de Tomasi di Lampedusa, traz uma das descrições de comida mais marcantes que já li, no trecho que narra o jantar oferecido por Don Fabrizio aos seus convidados sicilianos.
“[…] o aspecto daquele monumental pastiche era digno de evocar frêmitos de admiração. O castanho dourado da cobertura, o aroma de açúcar e de canela que emanava, não eram o início da sensação de prazer que saia de dentro quando a faca cortava a crosta: primeiro surgia uma fumaça carregada de aromas e se percebia os fígados de frango, os ovos cozidos, os pedaços de presunto, de frango e de trufas na massa untuosa, quentíssima de macarrões curtos, no qual o estrato de carne conferia uma preciosa cor camurça”. (Quem se interessar pelo desafio da receita pode consultar no Google “Timballo di Maccheroni”).
O texto, assim como a imagem, a depender da estética, influi no apetite para o bem e para o mal. Mas a verdade é que comer bem depende de muitas outras coisas, inclusive do temperamento. O importante, quem sabe, é saber desvendar lentamente cada sensação e se deliciar com pequenas ou grandes doses do doce ou salgado, do azedo ou apimentado.
No livro “Cem Anos de Solidão”, o personagem Aureliano Segundo, com fama de glutão, foi desafiado por uma mulher conhecida pela alcunha de A Elefanta para ver quem aguentava comer mais. Foi derrotado pelo temperamento.
“Enquanto Aureliano Segundo comia às dentadas, desbocado pela ansiedade do triunfo, a Elefanta seccionava a carne com a arte de um cirurgião e a comia sem pressa e até com um certo prazer…. “Tinha aprendido a comer por meio da absoluta tranqüilidade do espírito”.
Tereza Ribeiro