Mais médicos, menos governo

Mais médicos, menos governo

O Governo Federal através dos ministérios da saúde e da educação, já começou a se dá conta do grande equívoco que cometera ao propor o famigerado Programa Mais Médico como uma das medidas para se enfrentar o problema da saúde pública brasileira. As reações a este projeto estão sendo executadas através de diferentes ações: das entidades médicas (Federação Nacional dos Médicos – FENAM; Conselho Federal de Medicina – CFM e Associação Médica Brasileira – AMB), ajuizaram ação judicial junto ao Supremo Tribunal Federal – STF, alegando inconstitucionalidade desta medida; ações políticas junto ao Congresso Nacional na tentativa de influenciar os parlamentares a votarem contra este projeto; ações de mobilização da classe médica em todos os estados brasileiros procurando sensibilizar a população quanto as precária situação da saúde pública de nosso país e, por último, a avalanche de emendas parlamentares na Câmara dos Deputados, em um total até hoje 560, onde os deputados federais recomendam mudanças no texto deste anteprojeto ante as distorções éticas, política e jurídica do mesmo. Sendo que tudo isso aponta para uma única direção, qual seja, o desnorteamento do governo federal em lidar com problemas da saúde de nossa população.

No contexto, esta proposta apresenta vários equívocos, tecnicamente o melhor seria propor mais equipes de saúde e não só “mais médicos” pois há muito tempo se sabe que o médico é um profissional que para funcionar bem terá que participar de uma equipe de saúde. Médico sozinho não faz milagre, especialmente se não houver condições para trabalhar situações muito comuns nos dias atuais. Promover saúde é uma responsabilidade compartilhada, é trabalhar em equipe para se compartilhar experiências e conhecimentos com outros profissionais, entre os quais enfermeiros, dentistas, assistentes sociais, psicólogos, farmacêuticos, terapeutas ocupacionais, técnicos em saúde, e assim por diante. Aonde já se viu se praticar saúde seja em que nível, primário, secundário ou terciário só com o médico?  Será que o governo não sabe disto? Ou quer subestimar a inteligência dos profissionais da saúde deste país ou do povo brasileiro?

Outro aspecto: onde já se viu se desconsiderar a barreira linguística na execução das ações em saúde, que é uma condição muito importante para se garantir uma boa relação médico (equipe) paciente e, não deram a menor importância a esse fato? Nos leva a crer que pelo fato da população se encontrar literalmente desassistida, especialmente em lugares longínquos, e por não disporem de condições para buscarem alternativas, qualquer coisa que for oferecido a estas pessoa, está bem. Em sendo verdade, acho que ao invés de ajudar a população mais carente e pobre deste Brasil, estaríamos enganando-os mais uma vez. Há um velho e consagrado aforisma que diz: “faz de conta que te trato e você faz de conta que ficou bom”, máxima que vem predominando há anos entre nós.

Eu pergunto: qual destes grandões da política brasileira mandaria seu filho, sua esposa, seu pai ou a si mesmo, ir se consultar com um médico que não entende nossa língua, nossas leis, nossa cultura, nossa práxis e notadamente nossa ética médica? Condições indispensáveis para uma boa prática médica. Há algo de muito errado em tudo isto.

Como se pode enfrentar os problemas da saúde coletiva deste país impondo um AI-6, ou obrigando os estudantes a trabalharem por dois anos no SUS, sem definição de seus direitos trabalhistas, sem uma carreira profissional de cargos e salários? Sem supervisão clínica e muitas outas prerrogativas importantes para o bom exercício ético e profissional da medicina? Aonde já se viu falar-se de “CRM provisório”, onde a própria ação médica exige total responsabilidade ética e jurídica do médico sobre seu ato? Onde anda a tradição do ensino médico, rasgada por um projeto de lei demagógico? Onde está a democracia para garantir aos cidadãos trabalhar com dignidade onde lhe aprouver? Onde está a liberdade de escolher inclusive sua especialidade médica?  Com este programa esdrúxulo, sem pé e sem cabeça, onde em seu próprio conceito já se torna ambíguo: “mais médico e não mais saúde”, isto tudo foi corrompido.

O que nós queremos, portanto é mais saúde, é mais seriedade na aplicação dos recursos públicos, é menos corrupção neste setor, queremos mais equipes multiprofissionais capacitadas comprometidas com a saúde coletiva garantindo saúde de qualidade em nossos interiores, queremos ética na gestão da coisa pública, enfim queremos é oferecer o melhor para todos seja pobre, ou seja, rico. Espero que o bom senso prevaleça na cabeça dos parlamentares brasileiros não deixando que o tradicional rolo compressor ideológico, nos atropele e nos faça engolir mais uma enganação.

 

Depressão: é melhor prevenir do que remediar

Esse é um provérbio antigo e que tem um significado especial, apesar de muito pouco ser feito no sentido de sua ampla aplicação. Prevenir significa antecipar-se, chegar antes, impedir que algo aconteça evitar que um fato conhecido reapareça e cause danos ou problemas já conhecidos. A prevenção é uma das mais importantes ferramentas na área da saúde, embora não seja de fato aplicada em sua plenitude.

Do ponto de vista da saúde pública existem três modalidades de prevenção: primária, secundária e terciária. A prevenção primária evita que um fato por demais conhecido ocorra a um indivíduo ou a uma sociedade. Como exemplo, temos o processo de vacinação da população, através da qual evita-se que inúmeras doenças apareçam na população em  geral.

Na prevenção secundária, o problema já aconteceu, todavia, procura-se impedir que o mesmo evolua e gere mais danos ao indivíduo ou à sociedade. Na prevenção terciária, procura-se reparar os danos ocasionados pelos problemas, isto é, procura-se reabilitar os indivíduos em suas diferentes funções físicas ou psicossociais.

Nesse sentido, a depressão é uma das doenças mais prejudicadas por não se prevenir sua recorrência. Sabe-se que é um transtorno que reaparece ao longo da vida, que até 2030 será a doença mais prevalente entre os seres humanos, que é a segunda principal causa de incapacidade funcional até 2020, e, mesmo assim, ainda não se dispõe de políticas em saúde que impeçam seu reaparecimento.

A depressão atinge mais de 120 milhões de pessoas no mundo e responde por mais da metade dos suicídios, acarretando muitos sofrimentos à humanidade. Uma em cada 4 mulheres e um em cada 10 homens terão depressão ao longo da vida e um terço dos que já tiveram, recairão. Quem já teve uma crise de depressão na vida terá 50% de chance de ter outra; quem já teve duas crises, terá mais de 65% de chance de ter a terceira e, quem já teve mais de três crises de depressão na vida, terá 100% de chance de ter outras. Sendo assim, atualmente, recomenda-se que a partir da segunda crise depressiva, o médico institua inexoravelmente medidas preventivas para evitar que esta doença reapareça.

Devemos, portanto, adotar três grandes medidas diante da depressão: tratar a crise atual; prevenir a ocorrência de outras e reparar os danos que as crises anteriores determinaram na vida desta pessoa (reinserção). Se forem adotadas todas essas medidas já consagradas pela experiência e pelo conhecimento científico, estes enfermos não mais adoecerão. Essas medidas deverão ser tomadas em bloco para serem efetivas. Um relatório recente a OMS mostra que 45% das recaídas de depressão são atribuídas a pacientes que deixaram de tomar seus medicamentos ou interrompem o uso de forma inadequada, tornando-os vulneráveis a mais crises da doença. Neste contexto, conclui-se que o uso correto destes medicamentos evitará que haja recaídas.

Além da utilização criteriosa dos medicamentos, dispomos de dois outros meios físicos para se prevenir recaídas largamente utilizadas na Europa no Canadá e Estados Unidos: a Estimulação Magnética Transcraniana – EMT e a Eletroconvulsoterapia – ECT, ambos os tratamentos efetivos na prevenção de recaídas de depressão.

Sem prevenção, fatalmente ocorrerá sucessivas recaídas, os pacientes se tornarão refratários aos efeitos dos medicamentos, sua recuperação será mais difícil, as crises se tornam mais longas, profundas e mais severas e tenderão a se cronificar. Ao contrário, se forem prevenidas tais crises tudo pode se evitado, pois se manterão assintomáticos por muitos anos.

Devemos investir maciçamente na prevenção de recaídas entre os depressivos, pois é umas das poucas doenças em que a recuperação é plena, isto é, as pessoas se recuperam completamente, o que não ocorre quando o paciente recai várias vezes. Além do mais, já se dispõe de um vasto conhecimento de suas causas, de seu tratamento e do seu prognóstico.

Os avanços com novos fármacos para depressão e o surgimento de modernas técnicas de psicoterapia e reabilitação psicossocial através da terapia ocupacional deram um grande passo no tratamento, na recuperação e na prevenção de recaídas da doença. Portanto, vamos evitar que os pacientes voltem a adoecer, agora éandre a vez da prevenção.

 

 

Rolar para cima