Atenção quanto ao uso de tranquilizantes

Atenção quanto ao uso de tranquilizantes
A descoberta dos tranquilizantes representa um marco histórico da medicina. Um grupo de medicamentos altamente importantes, usado largamente na prática médica em diferentes especialidades para tratar uma infinidade de doenças ou situações médicas especiais e relevantes. Entre os tranquilizantes, os benzodiazepínicos, (BZ) são um dos mais importantes e um dos mais utilizados na prática médica. Uma das áreas que mais se trabalha com esses medicamentos é a psiquiatria, muito embora não seja os psiquiatras, quem mais as prescrevam.
Sabe-se que todos os medicamentos são potencialmente prejudiciais, quando prescrito ou utilizado de forma correta. Não é à toa, que os ilustres farmacêuticos, nos informam que a diferença entre um veneno e um medicamento, está na dose, pois um pode se converter no outro e vice versa. Esse axioma pode e deve ser aplicado quanto ao uso dos tranquilizantes, pois apesar de serem medicamentos excepcionais, o abuso dos mesmos pode representar uma grande ameaça à saúde, em todos os sentidos, particularmente quanto a saúde mental, pois o uso exagerado dessas drogas pode determinar entre outras coisas, dependência severa nos usuários.
O consumo exagerado desses medicamentos pela população brasileira, sempre foi algo que nos despertou muito interesse, pois somos um grande país consumidor de medicamentos, ao ponto de figurarmos como o quinto maior mercado no mundo na área da indústria farmacêutica. Portanto um mercado pungente, na venda de medicamentos comparativamente aos outros países no mundo. Entre os medicamentos mais vendidos, guardando a devidas proporções, estão os tranquilizantes. E, esse consumo exagerado desses medicamentos é um assunto muito sério e grave do ponto de vista da saúde pública e, que de certa forma, se mantém no anonimato, pois não se trata abertamente desse assunto nem mesmo em congressos e em outros eventos científicos, muito embora, já exista evidências deste fato em nossa população.
Os dados da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) confirmam isso. Em nosso país os ansiolíticos são os mais vendidos, comparando-se com a venda de antidepressivos e emagrecedores. Em seus relatórios, a ANVISA elencou os medicamentos de receita controlada, mais consumidos em nosso país, desde 2007. É um trabalho digno de nota da Agência, pois quantifica o consumo dessas drogas vendido através de receita controlada que os quais podem causar dependência química, entre seus usuários. Os ansiolíticos dominam a lista, que inclui todos os medicamentos de venda controlada, como emagrecedores, antidepressivos e anabolizantes. Os princípios ativos mais consumidos no país entre 2007 e 2010 foram clonazepam, bromazepan e alprazolam, cujas marcas de referência são, respectivamente, Rivotril, Lexotan e Frontal.
Mais de 10,5 milhões de caixas do Clonazepam foram dispensados em 2010, segundo informaram 41 mil farmácias cadastradas no Sistema Nacional de Gerenciamento de Produtos Controlados e este número são crescentes desde 2007. A Vigilância Sanitária estima que este sistema de controle deva ter alcançado quase o total das farmácias em 2010, o que deverá permitir comparações a partir de agora. Acredito que o consumo exagerado de ansiolíticos, muitas das vezes sem indicação médica, é certamente uma das causas principais que provocam dependência química destes medicamentos e o que mais atrai seu consumo exagerado, são seus efeitos de modificarem rapidamente estados emocionais psicopatológicos e desagradáveis como medos, fobias, insegurança, tristeza, irritações, desadaptações psíquicas e sociais.
Essas substâncias de fato podem “obrar milagres”, ao se verificar pacientes enfermos graves, com poucas possibilidades de recuperação, se constata que ao usando adequadamente esses fármacos, se recuperam plenamente de seus problemas, após certo tempo de uso. Nesses casos, o que está em jogo é a utilização médica correta, quanto à dose e o tempo de uso destes medicamentos, ocorre que, tem que haver um controle rigoroso, tanto quanto para os que prescrevem, no caso os médicos, quanto para os que consomem, os pacientes, para que não haja problemas em decorrência do uso inadequado da medicação.
Quanto se trata da utilização dos benzodiazepínicos, a atenção deverá se redobrada devido ao risco de provocar dependência. Essa condição ao se instalar, fará com que a pessoa use os medicamentos não mais por sua indicação clínica, mas pela necessidade mórbida de utilizá-lo, pela falta angustiante que ele fará, ao deixar de usá-lo. Nessas condições, se instalou a dependência química, que é uma condição grave e complexa, que todos deveremos lutar para combatê-la. Para a indústria, que produz e vende esses medicamentos, acredito eu, que muito pouco lhe interessa saber por que razão alguém toma seus medicamentos, se por necessidade mórbida (dependência), ou por necessidade clinica (médica), mas nós que fazemos saúde com ética e seriedade, temos que nos preocupar com milhões de pessoas que estão viciados nesses medicamentos e não sabem mais o que fazer para se livrar disso. Portanto, todo cuidado é pouco, quanto ao uso desses fármacos.

Que país é esse, que encarcera seus doentes mentais?

Sem atendimento médico adequado, pessoas com transtorno psiquiátrico, dependentes químicos, esquizofrênicos e portadores de outros transtornos mentais vivem presas em celas do sistema prisional do nosso estado e pelo Brasil afora, sem uma atenção adequada do sistema de saúde público. Essa é uma constatação lamentável, inaceitável e cruel.
Há quase um ano, em levantamento feito pelo Jornal O Globo junto às Secretarias de Administração Penitenciária, ao Sistema Judiciário e as Defensorias Públicas desse país constatou-se que havia pelo menos 800 pessoas absolvidas pela Justiça em razão de transtornos psiquiátricos, cumprindo penas em presídios comuns e, em muitos casos, dividindo celas com outros detentos.
O que se sabe é que as recomendações feitas pelo Conselho Nacional de Justiça, a partir desse trabalho, no sentido de dirimir tais contradições e idiossincrasias, não foram ainda plenamente efetivadas, o que gera sentimentos de indignação e revolta, considerando-se que se trata de um fato grave e desumano, para o qual deveriam ser apresentadas saídas dignas.
Cela nunca foi, não é e nunca será o ambiente onde esses enfermos deveriam estar. Nada, atualmente, poderia explicar o recolhimento de enfermos psiquiátricos em celas ou em presídios, considerando os avanços da psiquiatria e das técnicas psicossociais e reabilitadoras em saúde mental, que são praticadas no Brasil e em qualquer outro país o mundo. E, mais ainda, estarem inadequadamente em celas e completamente desassistidos em suas necessidades médicas e psicossociais. Boa parte desses enfermos cumprem Medidas de Segurança, um recurso ou prerrogativa jurídica, imposta por um magistrado ao verificar que um determinado crime fora cometido na vigência de um transtorno mental e, para esses casos, tais pessoas deveriam ser tratadas e não encarceradas e presas, conforme o sentido mais profundo desse termo.
A par dessas contradições, existem algumas particularidades sobre as doenças mentais, que se deve realçar quando se trata um assunto tão importante e delicado como esse. A própria doença mental, independente dos aspectos circunstanciais que se venha examinar, já é por si só, uma forma grosseira de encarceramento do sujeito em si mesmo. É uma doença que, por comprometer formalmente as faculdades mentais, aliena, impede que o paciente exerça plenamente seu direito sagrado de ser livre. Essas doenças, por serem prisões em si mesmas, tornam as pessoas incapazes de optar, de decidir, de gerir sua própria vida e seu destino e, quando o fazem, são inspiradas em condições psicopatológicas. São doenças que tornam os enfermos escravos de suas próprias enfermidades, impedindo que os mesmos tenha sobre sua condição qualquer crítica de seu estado mórbido. Haveria coisa pior que isso quando nós nos colocamos em uma situação como essa?
Essa é a condição natural dessas enfermidades. Mas, não é só isso, o pior, embora o fato apontado acima, por si só, já seja complicado e inaceitável, é vermos que, quem deveria assumir a total responsabilidade sobre esses enfermos, sobretudo aos que cumprem medidas de segurança, é o estado, que constitucionalmente deveria cuidar da saúde da população. Mas, se mantém incólume e indiferente a essa desumana situação. O estado, como responsável pelos cidadãos e mantenedor de uma política pública de saúde deveria garantir propor, cuidar e oferecer a todas essas pessoas, pleno direito aos tratamentos da melhor qualidade possível, por tempo indeterminado, ou o necessário para se recuperem e voltarem a conviver com os outros, em condições satisfatórias. É dever do estado, fazer isso. Propondo o que há de melhor em matéria de tratamentos tecnicamente adequados, seja de que tipo for: hospitalar, ambulatorial, nos Caps, nas fazendas terapêuticas etc., como preconiza a lei e com isso garantir a recuperação desses enfermos, libertando-os das amarras de suas doenças.
Mas, triste e vergonhosamente não é isso que se vê. O que vemos é um estado truculento, desumano, incapaz de olhar diferentemente para esses doentes. Permitindo que vivam nessas masmorras, muitos dos quais sem qualquer possibilidade de sair das celas e ganhar o mundo. Muitos sem ter acesso a um medicamento, muito menos a um médico que lhe dê atenção e cuidado. Muitos sem qualquer chance de se libertarem de suas amarras existenciais, reclusos em ambiente inóspito, sem quaisquer condições que possam ser tratados com decência e dignidade. Que pena, que dó é ver isso.
E, eu pergunto. Onde estão as autoridades que têm suas responsabilidades sobre esses enfermos, que sabem do problema, e pouco fazem para mudar essa realidade? Que estado é esse que prende, encarcera, e mantém em cárcere doentes mentais, sem cuidados e sem tratamento especializado? Que estado é esse que proíbe a criação de hospitais ou outros serviços especializados que pudessem acolher, orientar, tratar e recuperar de forma decente e humana a maioria desses enfermos, permitindo-lhes acesso a ambientes dignos, humanos e tecnicamente aparelhados para realizar os modernos tratamentos psiquiátricos que poderiam debelar tais doenças? Essas autoridades não sabem disso ou fazem de conta que o problema não existe? Onde estão os parlamentares de direita, de esquerda, de centro, ou seja de onde for, que se calam, não denunciam, e não fazem nada para mudar isso? Ou são coniventes com os tentáculos de um estado mau e negligente?
Há alguns dias, aqui em São Luís, houve manifestações públicas de diferentes setores da comunidade, em homenagem a chamada luta antimanicomial, movimento que reinventou o que está aí em matéria de assistência psiquiátrica, mas não vi um cartaz sequer, tratando dessas questões de doentes enjaulados nas celas de presídios e penitenciárias dessa cidade. O que houve, também não veem nada disso? O que é isso que colocaram dentro do Hospital Nina Rodrigues? Uma cela, um presídio, um manicômio, um Caps, enfim, o que é aquilo que criaram nesse hospital?
Eis as distorções de um sistema cruel, desumano e corrompido, que à luz da saúde, do direito e da vida social, permite que essas coisas aconteçam em nossas barbas, nos dando a clara impressão de indiferentismo, descuido e negligência no trato dessas questões. Tornando esses pacientes presos em suas próprias condições psicopatológicas e, pior, presos nas malhas de um estado insensível, indiferente aos direitos e aos princípios de humanidade e ética, quanto aos cuidados que deveriam oferecer aos doentes mentais.

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