O “oxi” vem aí

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Ruy Palhano
Ex-Presidente da Academia Maranhense de Medicina – AMM
Professor de Psiquiatria do Curso de Medicina da UFMA

A grande imprensa brasileira tem se encarregado nas últimas semanas de nos informar sobre a presença sorrateira de mais um composto que vem sendo utilizado como substância de abuso. Trata-se de um composto excitante do cérebro obtido de uma das etapas de fabrico da cocaína, denominado de OXI, termo simplificado da palavra oxidado.
Apesar de só agora ser objeto de destaque da grande mídia, o uso da droga já é realizado há alguns anos, especialmente nos países andinos como Peru e Bolívia. No Brasil, há indícios de que o Acre foi o estado onde começou a circular a substância e hoje, a Polícia Federal já registra sua presença no Pará, Brasília, Rio de Janeiro e em alguns pontos de São Paulo.
É importante recordar que o processo de fabricação e refino da cocaína é longo e exige técnica apurada, embora rudimentar. Ocorre a adição de várias substâncias (solventes orgânicos) até obter-se a liberação do alcalóide contido nas folhas da coca. Sabe-se que, inicialmente, as folhas de coca são arrancadas dos pés e levadas a tendas escondidas na floresta, onde são trituradas com o auxílio de cortador de grama ou manualmente e armazenadas em pequenas quantidades para, em seguida, serem manipuladas.
Sobre as folhas são colocadas porções de cimento, usados na construção civil, e, em seguida, molha-se as folhas com uma mistura composta de soda cáustica, amônia e gasolina, por meio de um regador.
A outra etapa do processo é o pisoteio, por meio do qual se macera as folhas andando sobre elas por horas, ocasião em que se adiciona uma quantidade definida de cal virgem, matéria prima do gesso utilizada em pintura. Em seguida, permanecem pisoteando a mistura para adicionar gasolina, e, posteriormente, solução de ácido sulfúrico e, depois, de amônia. Deixam o composto descansar por algum tempo em tonéis, sendo o resultado dessa mistura a pasta básica, “basuco”, “basuca” ou ainda “free base”, expressão inglesa que significa base livre. Nesse momento do processo do fabrico, já se encontra uma quantidade grande de alcalóide (substância do pó de coca).
São adicionados posteriormente outros processos químicos, como acetona e outras substâncias para formar o famoso pó branco. Quando chega finalmente nas mãos dos traficantes, esse pó é misturado com vidro moído, fermento em pó, lidocaína, procaína, benzocaína, pó de giz, pó de mármore, dentre outros produtos, para, só então, ser colocado a venda, no tão disputado e perigoso mercado do tráfico.
É de se pensar sobre os milhões de viciados que se espalham pelas favelas e condomínios de luxo por todo o Brasil, que normalmente desenvolvem graves doenças mentais a ponto de se internarem em hospitais psiquiátricos. Imaginem as inúmeras doenças orgânicas que adquirem por conta de todos esses produtos químicos e impurezas utilizadas no complicado processo de fabricação da cocaína?
Os laboratórios clandestinos ainda empregam técnicas rudimentares para adquirirem a cocaína. Estima-se que 500 kg de folhas da coca são transformados em 2,5 kg de pasta de coca; 2,5 kg de pasta de coca viram 1 kg de sulfato base de cocaína; 1 kg de sulfato base destilado resulta em 1 kg de hidrocloridorato de cocaína (pó branco); 1kg de hidrocloridrato recebe a adição de talco e outros produtos e resulta em 12 kg de droga, que finalmente é vendido ao consumidor desavisado.
O Oxi, que é um subproduto dessa cadeia de fabricação. Ocorre, todavia, que a concentração de alcalóides é maior, considerando que o Oxi é obtido logo na fase pasta base (free-base), ocasião em que se adiciona gasolina e outros solventes orgânicos.
Considerando que a concentração de cocaína é maior, os efeitos certamente são maiores, portanto, piores que seu irmão mais próximo, o crack. Assim, os usuários de Oxi estão mais sujeitos a desenvolver dependência, além de intoxicação, pois esses processos estão na razão direta da concentração (quantidade) da droga consumida, bem como na razão direta do tempo em que a substância atinge o cérebro do usuário que, no caso, ocorre de 05 a 07 segundo depois de inalada.
Há informações de que a droga é mais barata do que o crack, o que facilitaria sua aquisição. Todavia, o preço de um produto obedece a “leis” do mercado, sendo certo que as notícias não são nada amimadoras nos tempos atuais. Mais drogas, mais problemas, mais danos aos indivíduos e à sociedade, mais gastos públicos para se enfrentar o problema e mais tristeza para os pais e para todos nós.
Queiramos nós ou não, o grande desafio deste século é a questão do uso de drogas. Isso exige soluções imediatas, consistentes e duradouras no enfrentamento da problemática. No Brasil, cerca de 2% da população já é dependente de crack e ainda não foram vistos resultados práticos desde a implantação da política nacional de enfrentamento do crack, especialmente na área da saúde pública.

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