Em carta, auxiliares penitenciários relatam medo após três atentados e morte de dois colegas

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Segundo os contratados, a ida ao trabalho é um tormento, pois o risco de sofrerem ataques é elevado

O Estado

Carlos Augusto Corrêa foi executado em via pública, na Cohab

Três auxiliares penitenciários foram atacados por bandidos em pouco mais de um mêsNelson MeloApós a morte de dois auxiliares penitenciários e tentativa de homicídio contra outro, em pouco mais de um mês, em São Luís, os servidores contratados do sistema prisional do Maranhão divulgaram uma carta, na qual relatam as ameaças que, constantemente, sofrem dos internos.

De acordo com eles, a vida social é atingida em todos os aspectos, uma vez que, em qualquer lugar onde estão, o perigo de ser atacado por criminosos é grande. O grupo também denunciou as condições insalubres durante seus trabalhos nos presídios. Na carta, os contratados destacam que as ameaças dos presos são frequentes. Os auxiliares penitenciários e agentes temporários ficam na “linha de frente”.

Dentre as atividades que realizam, uma é entrar nas celas para algemar os detentos e fazer a condução dos internos. De acordo com eles, a ida ao trabalho é marcada por angústia, pois, caso sejam reconhecidos nesse deslocamento, podem sofrer atentados, como os dois ocorridos recentemente na capital maranhense. A volta para casa também está sendo um tormento para esses contratados.

Segundo eles, o grupo não pode portar armamento fora do ambiente de trabalho, o que os tornam reféns da criminalidade.

Condições de trabalho

Ainda de acordo com os contratados, além das ameaças dos internos, outros problemas são as condições de trabalho. Eles relatam na carta que os riscos de exoneração são constantes. Caso faltem três vezes ao serviço, já é motivo para que sejam excluídos, sem direito algum, uma vez que são regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho (CTL), como frisaram. “Pagamos nosso fardamento, que custa R$ 570 para auxiliares penitenciários e R$ 1.140,96 para agentes penitenciários. E somos cobrados a prestar contas do valor integral todos os dias”, declararam na nota. 

Eles contaram que o auxílio-fardamento para agentes e auxiliares temporários é pago em parcelas. O local de trabalho, como relataram, é precário, mas os contratados não recebem adicional de insalubridade, risco de vida e adicional noturno. “Tuberculose é rotina. Servidores afastados são dezenas, com doenças psicológicas do tipo, como depressão, síndrome do pânico e outras”, diz um trecho da nota.

Nota de pesar

O jornal O Estado solicitou um posicionamento da Secretaria de Estado de Administração Penitenciária (Seap) sobre as denúncias feitas pelos contratados, mas não houve resposta até o fechamento da edição da matéria. Nas redes sociais, o órgão lamentou a morte do auxiliar penitenciário Carlos Augusto Corrêa, crime ocorrido na capital maranhense. “É com muito pesar e imensa tristeza que os servidores do sistema prisional do Maranhão se solidarizam com a dor irreparável de amigos e familiares deixada pela perda precoce de Carlos e, além disso, agradece pelo relevante trabalho prestado por ele ao Estado, durante quatro anos e seis meses”, encerra a nota da Seap. 

Tentativa de homicídio

No dia 3 de dezembro de 2018, o auxiliar penitenciário Anderson Bernardes Rocha, de 49 anos, foi atingido por dois disparos de arma de fogo quando estava saindo da própria residência, na Vila Verde, na Área Itaqui-Bacanga, na capital maranhense. Avítima foi feriada no braço esquerdo e no tórax. Ele passou por cirurgia e passou dias hospitalizado. 

Segundo a polícia, Anderson Rocha foi abordado por dois homens em uma motocicleta quando estava na porta de sua residência. O auxiliar penitenciário trabalha na Unidade Prisional de Ressocialização do Monte Castelo, em São Luís.

Mortes de auxiliares

Nas primeiras da manhã de sexta-feira, 3, mataram mais um auxiliar penitenciário na região metropolitana de São Luís. Carlos Augusto Corrêa, de 44 anos, estava em frente ao Banco do Brasil da Cohab-Anil, quando foi surpreendido por disparos de arma de fogo. De acordo com declarações do Centro Integrado de Operações de Segurança (Ciops), a vítima foi assassinada por dois homens, que chegaram ao local a pé, conforme a Superintendência de Homicídios e Proteção à Pessoa (SHPP).

Segundo apurado pelo delegado Lúcio Rogério Reis, titular da SHPP, depois que atiraram no auxiliar penitenciário, os autores correram em direção à Vila Isabel Cafeteira, nas imediações. Carlos Augusto ainda recebeu atendimento de bombeiros militares que passavam pelo local. Em seguida, foi levado em uma viatura da Polícia Militar ao Hospital Municipal Doutor Clementino Moura (Socorrão 2), onde não resistiu no Centro Cirúrgico. 

Carlos Augusto era lotado na Unidade Prisional de Ressocialização São Luís 5 (UPSL5), unidade do Complexo Penitenciário de Pedrinhas, como informou o delegado Lúcio Rogério. Prisão do suspeitoNo mesmo dia, por volta das 17h30, as polícias Civil e Militar prenderam um suspeito de ter matado Carlos Augusto Correia. O autor foi identificado como João Víctor Matos Cutrim. De acordo com o delegado Lúcio Rogério Reis, ele foi encontrado no bairro Vila Vicente Fialho, na capital, após uma operação conjunta envolvendo diversas unidades, incluindo a Superintendência Estadual de Investigações Criminais (Seic). Os demais envolvidos no crime continuam sendo procurados pela SHPP. A investigação da morte do auxiliar penitenciário está em andamento. 

Morte anterior

Por volta das 19h do dia 29 de dezembro do ano passado, ocorreu a morte do auxiliar penitenciário Antônio Magno Reis Duarte, 45, na Vila Mauro Fecury 2, área Itaqui-Bacanga, perto da casa onde morava. Ele estava sem camisa, ingerindo bebida alcoólica, sentado em uma cadeira, quando dois homens em uma motocicleta apareceram. O garupa desceu e, com bastante tranquilidade, como disse o delegado Felipe Freitas, da SHPP, sacou uma arma de fogo e efetuou os tiros contra a vítima. 

“Os disparos que foram efetuados tinham uma concentração no corpo. Isso mostra que o autor tem manejo em armas. Ele teve uma precisão no que estava fazendo”, pontuou o delegado da Superintendência de Homicídios. A investigação está sendo realizada no sentido de tentar estabelecer uma relação entre o trabalho da vítima no sistema penitenciário com o crime. De acordo com o delegado Felipe Freitas, os autores foram vistos em uma motocicleta. O veículo seria modelo POP, de cor preta.

Leia a íntegra da carta dos auxiliares penitenciários:

CARTA DOS SERVIDORES CONTRATADOS DO SISTEMA PRISIONAL DO MARANHÃO

Nós somos contratados, temos matrícula estadual, mas somos constantemente ameaçados de exoneração, 3 faltas por exemplo nos exoneram e saímos sem direito algum, já que o contrato é sem CLT. Auxiliares Penitenciários são os “ponta de lança” entram em celas, algemam e fazem a condução da pior raça que existe na face desta Terra, isto é, os “vítimas da sociedade” segundo os direitos humanos.
Pagamos nosso fardamento que custa: Auxiliares Penitenciários R$ 570,00, Agentes Penitenciários 1.140,96 reais e somos cobrados a prestar conta do valor INTEGRAL todos os dias, porém, o auxílio fardamento para os Agente e Auxiliares temporários é pago em parcelas, ou seja, a SEAP restituirá o dinheiro do fardamento, em 12 vezes de 57,00 reais para Auxiliares e 95,08 reais para Agentes.

Ameaças dos internos contra nós servidores é constante, e com isso, a nossa paz vai acabando, vida social não existe mais, vivemos em constante tensão, e não temos nenhum apoio da secretaria. Tuberculose é rotina, servidores afastados são dezenas, com doenças psicológicas do tipo, depressão, síndrome do pânico e outras.

O local é insalubre, porém, nós temporários não temos direito a insalubridade, não temos direito a risco de vida e adicional noturno, nós servidores desta categoria somos impedidos de utilizarmos armamento fora do nosso ambiente de trabalho e com isso, ficamos refém da criminalidade.

No caminho de ida ao trabalho e retorno para casa, o que nos resta é contar com a sorte, ou seja, orar para que não sejamos reconhecidos por uma dessas “vítimas da sociedade” beneficiados pela saída temporária, pois eles sempre andam fortemente armados, mas nós, representantes do Estado, não recebemos sequer uma agulha da SEAP, para nos defendermos dos vários ataques que estamos sofrendo, primeiro foi a tentativa de homicídio do Auxiliar Anderson Bernardes no final do ano passado e agora em um intervalo de sete dias, ceifaram covardemente a vida dos Auxiliares Penitenciários Carlos Augusto e Antônio Magno.

Se esquecemos algo, pedimos perdão, pois hoje o nosso coração está sangrando em decorrência das mortes prematuras dos nossos irmãos de farda. Queremos justiça, melhores condições de trabalho, um melhor salário, pois já se fazem mais de 4 anos que não se tem um reajuste, pedimos uma posição dos governantes urgentemente.

Atenciosamente,

Agentes e Auxiliares Temporários do Maranhão


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