CAEMA e Prefeitura de São Luís são condenados a deslocar rede coletora de esgoto no conjunto Bequimão

Um dos pontos mais movimentados do conjunto residencial Bequimão, em São Luís

Em sentença proferida na Vara de Interesses Difusos e Coletivos de São Luís, o Poder Judiciário condenou a Companhia de Saneamento Ambiental do Maranhão (CAEMA) e o Município de São Luís a realizarem a mudança da rede de esgoto e da rede de drenagem da Alameda Três, no bairro Ipem Bequimão. O desvio deverá ser feito pelo método não destrutivo, ou por outro que revele maior viabilidade, visando à resolução definitiva do problema de saneamento básico no local, devendo apresentar o plano de obras no prazo de 90 dias e executá-lo no prazo de um ano, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00.

Deverão os réus, ainda, procederem ao pagamento de  indenização por danos morais coletivos no valor de R$ 100.000,00, sendo R$ 50.000,00 para o Município de São Luís e R$ 50.000,00 para a CAEMA, a ser revertida ao Fundo Estadual de Direitos Difusos e Coletivos. A sentença tem a assinatura do juiz Douglas Martins, titular da unidade judicial. O caso trata-se de ação movida pela Defensoria Pública do Estado do Maranhão, em face da CAEMA e do Município de São Luís, requerendo o exercício do direito fundamental ao saneamento básico da comunidade da Alameda Três, bairro Ipem Bequimão, que convive há mais de dez anos com extravasamento de esgoto a céu aberto.

Para o juiz, está em discussão definir se a omissão do Município de São Luís e da CAEMA configura falha na prestação do serviço público essencial de saneamento, ensejando a obrigação de realizar obras estruturais, e estabelecer se estão configurados danos morais coletivos e/ou individuais indenizáveis. “O direito ao saneamento básico integra o mínimo existencial ligado aos direitos fundamentais à saúde (CF/1988, art. 196) e ao meio ambiente equilibrado (CF/1988, art. 225), impondo ao Poder Público e à concessionária o dever de garantir serviço adequado, contínuo e eficiente (…) O Município de São Luís, como titular do serviço, omitiu-se na fiscalização e na provisão de infraestrutura urbana adequada, concorrendo para a situação de degradação”, destacou Douglas na sentença.

Para ele, a CAEMA falhou na prestação de serviço adequado, conforme artigo do Código de Defesa do Consumidor, mesmo ciente da precariedade do sistema e elaborando projeto de remanejamento sem executá-lo. Frisou que a alegação de culpa exclusiva de terceiros não afasta a responsabilidade solidária, pois a ocupação irregular não exime o dever do Poder Público e da concessionária de prestar o serviço essencial. Segundo o magistrado, o dano moral individual não restou comprovado, diferentemente do dano moral coletivo, pois a exposição prolongada de toda a comunidade a esgoto a céu aberto, com riscos à saúde, mau cheiro e degradação da qualidade de vida, ofende valores extrapatrimoniais da coletividade, conforme precedentes do Superior Tribunal de Justiça.

Na ação, a parte autora sustentou que, há cerca de 10 anos, o sistema de esgoto local começou a apresentar problemas, que se agravaram a partir de 2019, resultando em escoamento de dejetos a céu aberto nas vias públicas, quintais e até nos pilares de sustentação das residências, mesmo sem a ocorrência de chuvas. Argumentou que a situação representa um perigo sanitário e estrutural para os moradores, afirmando que a comunidade buscou solução junto à CAEMA, à Secretaria Municipal de Obras e Serviços Públicos (SEMOSP) e à Secretaria das Cidades do Estado do Maranhão (SECID), sem sucesso.

No mérito, a CAEMA atribuiu a responsabilidade pelos problemas na rede de esgoto à culpa exclusiva de terceiros, apontou como causas o mau uso da rede pelos próprios usuários, que realizam ligações indevidas de águas pluviais, e a construção irregular de imóveis sobre a infraestrutura, o que impede fisicamente o acesso para manutenção, sustentou a violação ao princípio da separação dos poderes e a teoria da ‘reserva do possível’, e ressaltou que não cabe ao Judiciário interferir nas prioridades orçamentárias e que os recursos são limitados para atender a todas as demandas do Estado.

O Município de São Luís, em contestação, argumentou ser parte ilegítima para responder à ação, atribuindo a responsabilidade direta pelos serviços de saneamento à concessionária CAEMA. Sustentou que, se alguma responsabilidade lhe seja imputada, esta deveria ser apenas subsidiária, e não solidária. Também alegou a violação ao princípio da separação dos poderes, defendendo que não cabe ao Poder Judiciário determinar a execução de obras específicas, pois a definição de prioridades e a alocação de recursos são de competência do Poder Executivo. Em audiência, o Estado do Maranhão foi excluído do processo.

SITUAÇÃO DE CALAMIDADE

Para o Judiciário, restou amplamente comprovada a situação de calamidade sanitária que permanece há mais de uma década na Alameda Três, bairro Ipem Bequimão. O Laudo Técnico de Vistoria mais recente confirma e atualiza este cenário, concluindo que os problemas hidrossanitários identificados afetam diretamente a infraestrutura local, salubridade dos imóveis, qualidade de vida dos moradores, destacando a obstrução do sistema de drenagem, as interligações inadequadas entre redes pluviais e de esgoto, bem como a falta de manutenção da malha coletora. “A responsabilidade pela solução do problema é solidária entre os demandados”, ressaltou Douglas Martins.

E prosseguiu: “Ao Município de São Luís, como titular do serviço público de saneamento básico e responsável pelo planejamento e controle do uso e ocupação do solo urbano, incumbe o dever de fiscalizar a concessão e prover a infraestrutura de drenagem de águas pluviais (…) Sua omissão em ambos os campos é manifesta (…) À CAEMA, como concessionária, cabe a responsabilidade operacional pela prestação adequada, eficiente e contínua do serviço de esgotamento sanitário, nos termos do contrato de concessão e do art. 22 do Código de Defesa do Consumidor (…) Ressalte-se que a tese defensiva de culpa exclusiva dos moradores não se sustenta”.

O juiz observou que a intervenção do Poder Judiciário é legítima e necessária quando se verifica a omissão do Poder Público em cumprir seus deveres constitucionais. “Nessa toada, é importante relembrar que a responsabilidade por dano ambiental é objetiva, conforme art. 14, § 1º, da Lei nº 6.938/81, informada pela teoria do risco integral, sendo o nexo de causalidade o fator aglutinante que permite que o risco se integre na unidade do ato, sendo descabida a invocação de excludentes de responsabilidade civil para afastar a obrigação de indenizar”, finalizou, acolhendo parcialmente os pedidos do autor.

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