Decisão judicial proíbe demolição, modificação ou alteração em túmulos de relevância histórica, artística ou cultural no Cemitério do Gavião

A Justiça condenou o Município de São Luís e administradora do Cemitério do Gavião, “Empreendimentos São Marcos, a recuperar e restaurar as sepulturas nº 16Q e da família Collares Moreira, no prazo de 180 dias.
A decisão judicial proíbe qualquer demolição, modificação ou alteração em túmulos de relevância histórica, artística ou cultural no Cemitério do Gavião, sem autorização do Departamento de Patrimônio Histórico, Artístico e Paisagístico do Maranhão (DPHAP).
De acordo com a decisão, o Município e a administradora São Marcos deverão, ainda, pagar indenização por danos morais coletivos, de R$ 100 mil, cada, ao Fundo Estadual de Proteção dos Direitos Difusos.
AÇÃO POPULAR
A sentença, do juiz Douglas de Melo Martins, titular da Vara de Interesses Difusos e Coletivos de São Luís, confirmou a concessão de tutela de urgência já concedida, acolhendo pedidos feitos por Ramsés de Souza Silva em Ação Popular, contra a demolição de túmulos de valor histórico, artístico e cultural no Cemitério do Gavião.
O autor da ação informou que o Município autorizou e a administradora do cemitério realizou a demolição de túmulos em pedra lavada portuguesa, com inscrições dos sepultados, datas de sepultamento e elementos artísticos típicos do romantismo oitocentista do século XIX.
O ato teria sido praticado sem estudo prévio, em área de tombamento estadual e municipal, incluída na Zona de Preservação Histórica (PH), representando lesão ao patrimônio histórico e cultural de São Luís.
TUTELA DE URGÊNCIA
Em 29/11/2018, a Justiça concedeu tutela de urgência, determinando a imediata suspensão da demolição da sepultura nº 16Q e de “toda e qualquer autorização para modificação ou demolição, completa ou parcial, de túmulos de relevância histórica ou cultural”. Essa decisão foi estendida, depois, para todos os túmulos de pessoas de notória importância histórica, a exemplo de Sousândrade, Aluísio de Azevedo, Collares Moreira e Benedito Leite.
No entanto, no decorrer do processo, o autor popular da ação noticiou nova demolição, desta vez, durante a pandemia de coronavírus, do túmulo da família “Collares Moreira”, onde jaz Alexandre Collares Moreira Júnior (1849-1917), intendente de São Luís e e senador do Brasil durante a Primeira Velha (ou Primeira República) e que dá nome a uma das avenidas mais importantes da capital.
Em audiência de conciliação realizada em 20/02/2019, foi celebrado acordo no qual a administradora se comprometeu a remontar o túmulo objeto da lide, em outra alameda, mantendo suas características originais, e a preservar todos os demais túmulos de valor histórico, artístico e cultural, no prazo de 90 dias – contra parecer do Ministério Público.
PATRIMÔNIO CULTURAL, ARTÍSTICO E PAISAGÍSTICO
De acordo com a sentença do juiz Douglas Martins, o patrimônio cultural, artístico e paisagístico é amparado pela Constituição da República e a competência para essa proteção é de todos os entes federativos: União, Estados, Distrito Federal e Municípios.
O juiz informou, na decisão, que a necessidade de preservação do patrimônio cultural também decorrer da leitura conjunta dos artigos 225 da Constituição, 3º, inciso I, da Lei nº 6.938/81, bem como da Resolução do CONAMA nº 306/2002, os quais agregam a noção de meio ambiente cultural a um conceito macro de meio ambiente.
Para o juiz, a destruição deliberada e a negligência contínua com um patrimônio cultural da magnitude do Cemitério do Gavião representam uma agressão direta à memória, à identidade e à cultura não apenas da população de São Luís, mas de todo o povo maranhense. “A perda de referências históricas e artísticas, como os túmulos seculares, causa um dano irreparável ao direito difuso de acesso a um patrimônio cultural hígido, garantido pelo art. 216 da Constituição Federal”, sentenciou.
Saiba mais sobre o Cemitério do Gavião
O Cemitério de São Pantaleão, popularmente conhecido como “Cemitério do Gavião”, foi fundado em 1855 onde antes ficava situada a Quinta do Gavião, hoje bairro da Madre Deus. É o mais antigo em funcionamento em São Luís. Integra a área do Centro Histórico de São Luís, tombado pelo Decreto Estadual nº 10.089, de 1986 e reconhecido conforme a Lei nº 3.253/1992).
O cemitério foi fundado após uma epidemia de varíola que abateu parte da população de São Luís. Sua criação marca um momento de transição higienista no século XIX, quando os sepultamentos foram transferidos do interior das igrejas para locais próprios.
Guarda em seus jazigos e mausoléus a memória de personagens ilustres e representativos da história política, social e cultural do Maranhão, destacando-se a presença de obras de arte tumular (esculturas em mármore de Carrara) e exemplares de diversos estilos arquitetônicos (Neoclássico, Art Nouveau, Art Déco, etc.), o que lhe confere significativo valor histórico, artístico e cultural.