Trema na lingüiça

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olinda2.jpgAs primeiras notícias acerca do carnaval remontam às festas de Osíris no Egito. Com o recuo das águas do Nilo, os egípcios comemoravam com grande euforia o início das plantações nas margens do rio.

Os carnavais alcançaram o auge da orgia, do excesso, da desordem e do desperdício durante o Império Romano por ocasião da Bacchanalia. O Bacanal era o Festival romano que celebrava os três dias de cada ano em honra a Baco, deus do vinho.

De lá para cá, com suas máscaras requintadas, o tradicional carnaval de Veneza influenciou o mundo inteiro, conquistando aqui, no Brasil, a simpatia de multidões de animados carnavalescos.

O samba no Rio de Janeiro, com seus desfiles opulentos, o frevo de Olinda, o axé na Bahia e, aqui em São Luís, os tradicionais Blocos e mais recentemente o Bicho Terra, arrastam foliões por todas as praças e becos das cidades.

O assunto me faz refletir sobre o clima formado em torno do carnaval que atiça a criatividade de muita gente.

Meu tio Jurandy Leite, por exemplo, sempre foi um animado folião e tem sido destaque do Bloco do Agenor há mais de 25 anos. Neste carnaval, teve até música de sua autoria inscrita no festival Nacional de Marchinhas do Rio Janeiro. Intitulada Lula prometeu, Lula vai me dar, a marchinha chegou a ser selecionada entre as dez mais animadas deste ano de 2009.

“Eu quero meu café, meu almoço e meu jantar
Lula prometeu, ele vai me dar
Mas até agora, almoço e não janto
Nem emprego eu tenho para trabalhar
Mas eu não perco a esperança de ganhar
Lula prometeu, ele vai me dar
Ele vai dar, ele vai dar …
Vai dar o meu café, meu almoço e o meu jantar…”

E não é de hoje que Jurandy é chegado à música. Tempos atrás, comprou um piano de cauda e o instalou numa pequena sala, transformada em estúdio, no piso inferior do casarão da Godofredo Viana, onde funciona, ainda hoje, o Cartório de imóveis. Contratou professor e, em pouco tempo, tornou-se um aluno exemplar. Chegou até a gravar dois cd´s em parceria com Jesus Cristo (trechos bíblicos e música de Jurandy Leite…)!

Outro amigo que se transforma por ocasião dos carnavais é Nelson Almada Lima. Quem o vê, com aqueles cabelos prateados, aquela elegância, voz empostada e serenidade que lhe são peculiares, desconhece que por traz disso tudo existe um grande folião. Diretor de Escolas de samba, um dos fundadores do Bloco do Agenor, somente nas festas carnavalescas é que Nelson consegue curtir a música nos mais altos decibéis. Fora desse período, só música clássica.

Certa feita, José Carlos Martins, na época diretor da Companhia Progresso do Maranhão, acabara de instalar um potente som em sua residência, e reunia os amigos para um agradável happy hour às sextas feiras. Luis Raimundo Azevedo era diretor da CODERMA e convidou Nelson Almada Lima para subirem a Montanha Russa e tomarem um uísque na casa de Zé Carlos.

Ao chegarem, foram logo apresentados ao novo som. Zé Carlos, entusiasmado, aumentou o volume ao máximo e, aproximando-se do ouvido do Nelson, ingadou:

− Que tipo de música você mais aprecia?

Nelson, com sua voz compassada e grave, respondeu: − Baixa… de preferência baixa!!

Mas, voltando ao título do artigo…

Em Olinda, o Bacalhau do Batata e as Virgens de Olinda recebem, no período do reinado de Momo deste ano, a companhia de um novo bloco. O Trema na Lingüiça será mais um a animar os foliões de Pernambuco. Nem sei se, agora com a nova reforma ortográfica da Língua portuguesa, a lingüiça leva trema ou não; mas que muita gente vai tremer na lingüiça neste carnaval, isto vai!

E o frevo vai embalar as multidões nas ladeiras de Olinda. E é pra lá que eu vou neste carnaval. 

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Os Camaleões e os Chicos-Pretos

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Guardo algumas recordações do período em que fui deputado. A política me permitiu conhecer com mais profundidade a realidade de meu Estado, contribuir para melhorar as condições de vida de muitas comunidades e presenciar fatos que somente o exercício do mandato nos permite.

Lembro-me de um episódio ocorrido no município de Guimarães. As forças políticas locais encaravam as eleições como uma verdadeira guerra. Os grupos não se toleravam. Os Camaleões, como eram conhecidos, usavam roupas verdes e os Chicos-Pretos só vestiam encarnado.

De um dos lados, Celso Coutinho, grande liderança local. Já havia sido prefeito em outra ocasião, ex-presidente da Assembléia Legislativa do Maranhão e acabava de vencer as eleições municipais. Seus correligionários, vestidos de vermelho, tremulavam as bandeiras na porta da Prefeitura, esperando a hora de marcharem, todos juntos, para a Câmara dos vereadores. O novo prefeito iria levar a mensagem do Poder Executivo.

O prédio da Câmara estava ocupado pelos camaleões seguidores de Agenor Gomes e do Dr. Artur Farias, que comandavam a outra banda política de Guimarães. Completamente lotado, o salão nobre da Casa fervilhava sob o comando do vereador Mariano, recém-eleito presidente da Câmara. Ferrenho adversário de Celso, o vereador, com sua inseparável camisa “verde cheguei”, estava ansioso pela chegada do novo prefeito ao seu “terreiro”.

O clima não podia ser mais tenso!

O prefeito e seus seguidores chegaram ao local debaixo de vaias e foguetes. Foi um empurra-empurra cruel. Acalmados os ânimos, a Mesa foi montada, e o vereador Mariano iniciou o discurso de boas vindas (na verdade de más vindas) ao Prefeito, que, desacatado, resolveu abandonar o recinto.

De volta à Prefeitura, em passeata, seguido pelos seus eleitores, o novo prefeito dirigiu-se ao gabinete e, de uma canetada só, demitiu uma enorme quantidade de funcionários da Prefeitura nomeados pelo ex-prefeito, seu adversário.

Dois anos antes, nas eleições proporcionais, o grupo derrotado havia apoiado Zé Jorge e Gastão Vieira, este filho da terra, como seus representantes na Assembléia Legislativa e na Câmara dos deputados.

Era dia primeiro de janeiro de 1997. Como havíamos perdido as eleições municipais, tomei um avião monomotor em São Luís e decidi prestigiar o nosso grupo político.

Tão logo o avião aterrissou (o prédio da Câmara ficava na cabeceira da pista), fui recebido pelas nossas lideranças, que me relataram o que acabara de acontecer.

Resolvi ajudá-los e tentar, com o novo prefeito, contornar a situação criada pelas demissões. Alguns me advertiam que não deveria ir até a Prefeitura, pois correria o risco de “levar uma sova” dos Chicos-Pretos.

Mas eu tinha certeza de que o Celso Coutinho, por mais radical que pudesse parecer, não permitiria que tal agressão se consumasse. Fui. Conhecia o prefeito por intermédio de meu tio Jurandy Leite, seu amigo e ex-parlamentar de mesma Legislatura e, assim como ele, dono de Cartório em São Luís.

Formamos uma comissão (vereador Wilson, Nilce e mais duas professoras) e fomos recebidos pelo prefeito em seu gabinete.

Sentado na cadeira, cercado de assessores, vereadores e outras lideranças, o prefeito passou a me relatar os insultos que havia recebido, durante a campanha, de alguns funcionários do Município. Dizia ele que, de agora em diante, essas pessoas J A M A I S trabalhariam com ele.

Reforçou Celso: ̶- Deputado Zé Jorge, essa moça que faz parte de sua comitiva e que está aí, ao seu lado, é MINHA funcionária…

-̶  Eu não sou sua funcionária! Retrucou a moça imediatamente. ̶ Eu sou funcionária da PREFEITURA!

-̶  Mas eu sou o PREFEITO!…

O clima da reunião começou a esquentar.

-̶ O senhor acredita, deputado ? Continuou Celso. ̶ Que essa moça tem um cachorro?!?!

Fiquei em dúvida, sem entender qual seria o problema, ao que o prefeito continuou:  – E o senhor sabe como se chama o cachorro dela?

– CELSO COUTINHO! Bradou o prefeito, esmurrando a mesa.

-̶ E já estou arrependida de tê-lo feito… Retrucou a professora, a essa altura cercada e protegida por seus correligionários.

O tempo fechou e a reunião acabou ali mesmo.

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O audacioso

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rede_o-audacioso2.jpgVez por outra, lanço mão em meus artigos de deliciosas estórias ocorridas em Pinheiro. Muitos de meus leitores se impressionam com o vasto repertório delas e, outros até duvidam que possam ser verídicas.

Mas, que posso fazer, se elas insistem em acontecer? Compartilhar com meus leitores é claro!

Mundiquinha Silva era professora de Geografia. Daquelas que passava a aula toda discorrendo sobre os acidentes geográficos. Descrevia-os com tamanha riqueza de detalhes que nós imaginávamos estar, com ela, percorrendo os mais longínquos rincões deste planeta. Falava rápido. Quase engolia as palavras. Baixinha, magrinha, não levava desaforo para casa.

Certo dia chegou aos ouvidos dela que seu marido estava de caso com “uma nigrinha”. Disseram que o maridão marcava ponto, duas vezes por semana, no Motel Bem-te-vi, com uma jovem estudante do Colégio Pinheirense.

Casada com Bitencourt, há mais de quarenta anos, formavam um casal exemplar na cidade. Freqüentavam as melhores festas, dançavam como poucos (o marido era um verdadeiro pé de valsa) e estavam presentes em todos os eventos sociais de Pinheiro.

Dizem os mais velhos, que Carlos Roberto Bitencourt, era um verdadeiro galã quando jovem. Com mais de 1,80 m, olhos azuis (descendência talvez daqueles franceses que instalaram a Usina Providência na Chapada), Bitencourt estudou em São Luís e cultivava as academias de ginástica da capital. Tinha, quando jovem um físico de atleta.

Mundiquinha pensava que, agora com seus 72 anos, careca e barrigudo, (dizem que a idade esbandalha qualquer coisa…) ele iria se acomodar balançando a pança numa daquelas redes de linha de São Bento. Ledo engano! De repente, Bitencourt ficou alegre. Acordava muito cedo e, assobiando, ia tomar seu banho de cuia na beira do poço. Depois, sentava-se numa cadeira de embalo e ficava na porta da casa, observando todos que iam para feira. Dava conta até do padre que passava, ao raiar do dia, para rezar a missa na igreja de São Benedito.

Um belo dia, o bispo da cidade passou, bem cedinho e cumprimentou-o:

– Bom dia seu Bitencourt! Já acordado a esta hora? Tão cedo! Exclamou o Religioso italiano.

– Hum! Resmungou Bitencourt. Já acordei, fiz barba, tomei café, já caguei e me banhei. E, se tivesse viajado, já tinha voltado…

Mas o fato é que a traição de Bitencourt havia deixado Mundiquinha fora de órbita: Brigou, estrebuchou, expulsou o marido do quarto, ameaçou se separar e foi preciso muita conversa das filhas, das netas, e até de uma prima quase irmã, para que se acalmasse um pouco.

Final de tarde, as cadeiras na porta para aquele tradicional bate papo quando, vez por outra, passava um assobiando:

– Fi, fifiu… Fi, fifiu…

Era o suficiente para Mundiquinha associar os assobios ao nome do Motel Bem-te-vi e a briga recomeçar.

Já havia se passado mais de três meses. Bitencourt, expulso do quarto conjugal, continuava dormindo na rede na varanda da casa, quando ela decidiu ter uma conversa particular com ele, incentivada pelos conselhos da sua prima Cocota:

– Diquinha, tu vais te separar dele?… então pra que essa zanga? Homem é assim mesmo… Isso é coisa passageira… já acabou! Fala com ele… Nada que uma boa conversa não resolva. Insistia Cocota.

O conselho foi aceito e num certo dia, quando ele acabava de tomar o banho matinal, ouviu, do quarto, o chamado de Mundiquinha. Imaginou que a mulher havia “amolecido” e que fariam as pazes.

Veio rápido. Enrolado num roupão branco, com aquela proeminente barriga, mais parecia um beiju de tapioca de goma.

Mundiquinha passou a chave na porta do quarto e disse:

– Escuta bem Bitencourt. Tu deves agradecer a Cocota esta chance que tu vais ter, meu filho. Ela insistiu muito comigo para nós termos esta conversa. – Mas, antes de tudo, Carlos Roberto, (ela só o chamava assim quando queria dar uma dura nele) quero que tu saibas, meu filho, que eu te admiro muito! Tu és um homem muito corajoso Carlos Roberto! Audacioso, mesmo!

Bitencourt já estava se sentindo todo prosa, quando ela continuou:

– Como é que tu, com essa idade, com essa barriga enorme, tens a coragem de tirar a roupa na frente daquela rapariga de 20 anos, com um pintinho deeesse tamanhinho?

Concluiu Mundiquinha gesticulando com o polegar direito apoiado na metade do dedo indicador.

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