Dornelles: voto distrital e ‘distritão’ têm de ser discutidos na Comissão de Reforma Política

Ao ser questionado por jornalistas se vai defender o “distritão” na Comissão de Reforma Política da qual é o presidente, o senador Francisco Dornelles (PP-RJ) disse que “a proposta de voto majoritário, como possível substituto do voto proporcional, tem de ser examinada e discutida pelo grupo”. Ele deu a declaração logo após reunião de instalação da comissão, realizada nesta terça-feira (22).

 Dornelles voltou a afirmar que, apesar de preferir o sistema distrital puro (no qual cada estado é dividido em vários distritos e cada distrito elege somente um representante), ele insiste em um “passo intermediário, já que a divisão por distritos é muito complexa e seria muito difícil neste momento”.

 De acordo com Proposta de Emenda à Constituição de sua autoria (PEC 54/07), cada estado, em vez de ser dividido em distritos, seria transformado em um grande distrito – daí o apelido “distritão”. Por esse modelo, um estado como São Paulo, que possui 70 representantes na Câmara dos Deputados, continuaria a ter esse mesmo número de parlamentares, mas com a diferença de que seriam eleitos somente os mais votados.

 – Seria o princípio do voto majoritário: quem tem voto se elege; quem não tem, não se elege – argumentou o senador.

 Atualmente, no sistema proporcional, nem sempre os candidatos mais votados são os eleitos, porque são os votos (válidos) totais de cada partido que definem a quantidade de vagas a que as legendas têm direito.

 Apesar das críticas ao sistema atual (proporcional de lista aberta), não há consenso entre os parlamentares sobre o modelo que poderia substituí-lo.

A proposta do “distritão”, por exemplo, é criticada por integrantes do PT, partido que defende o sistema proporcional de lista fechada, e até do PSDB, que apoia o voto distrital misto.

‘Distritão’, lista fechada e voto distrital misto estão na pauta da Comissão de Reforma Política

Alterar a forma como são eleitos os deputados federais, assim como vereadores, deputados estaduais e distritais, está entre as iniciativas a serem discutidas pela Comissão de Reforma Política recém-criada pelo Senado. Há muitas críticas ao sistema proporcional de lista aberta, atualmente utilizado nas eleições para esses cargos, mas não há consenso sobre o modelo que poderia substituí-lo.

 O PSDB defende o voto distrital misto, enquanto o PT da presidente Dilma Rousseff se mantém a favor da lista fechada. Já o presidente da Comissão de Reforma Política, Francisco Dornelles (PP-RJ), propõe o chamado “distritão”, ou seja, o voto majoritário para estados e municípios.

 Uma das críticas ao sistema atual é que o eleitor vota em um candidato, mas, ao fazê-lo, pode contribuir para eleger outros que pertençam ao mesmo partido (ou a uma eventual coligação). Isso ocorre porque, no sistema proporcional de lista aberta, o voto não é contabilizado apenas para o candidato, mas também para seu partido. E é o número total dos votos válidos de cada partido que define a quantidade de vagas a que a legenda terá direito.

 Por causa dessa lógica, um candidato “puxador de votos” (capaz de conquistar, sozinho, uma grande fatia do eleitorado) ajuda a eleger colegas de partido ou coligação, até quando a votação deles é menor que a de candidatos de outras legendas.

 O caso do falecido deputado federal Enéas Carneiro, do antigo Prona, é lembrado com frequência. Em 2002, ele se elegeu para a Câmara após obter cerca de 1,5 milhão de votos no estado de São Paulo. Enéas tornou-se um “puxador de votos” para o seu partido, que, graças à sua votação, levou outros cinco candidatos ao Congresso Nacional – um deles com menos de 300 votos.

 – Por causa dessas distorções, há legendas que escolhem candidatos sem preparo para a vida parlamentar, mas que têm grande apelo eleitoral e podem atuar como puxadores de votos para o partido ou a coligação – diz Francisco Dornelles.

 Ele argumenta que dessa forma, os brasileiros acabam elegendo candidatos em quem nem pretendiam votar ou que nem conhecem. O senador acrescenta ainda que “tais candidatos muitas vezes nem têm afinidade ideológica ou programática com o puxador de votos”.

 Voto distrital

 Para substituir o sistema vigente, há alternativas como a defendida pelo PSDB, que é favorável ao voto distrital misto, modelo que mescla características dos sistemas proporcional e majoritário. Apesar desse posicionamento, o senador Aloysio Nunes Ferreira (PSDB-SP) diz que “o ideal seria adotar o voto distrital puro”, no qual os estados são divididos em distritos e cada distrito escolhe, de forma majoritária, apenas um representante.

 – No voto distrital puro o eleito está mais próximo do eleitor. Fica mais fácil para o cidadão fazer cobranças de seu representante – argumenta Aloysio Nunes.

 Francisco Dornelles também considera o voto distrital puro “a solução ideal”, mas avalia que a divisão de estados em diversos distritos eleitorais seria uma coisa “muito complexa e difícil de operacionalizar neste momento”. Por isso, ele sugere “como primeiro passo” a conversão de estados, no caso dos deputados, e municípios, no caso dos vereadores, em grandes distritos (daí o apelido “distritão”), onde seriam eleitos apenas os mais votados.

 O presidente da Comissão de Reforma Política diz ainda que, com o fim do voto proporcional em lista aberta, “perdem sentido as coligações para eleger deputados e vereadores”. As coligações muitas vezes beneficiam as legendas que, sozinhas, não conseguem votos suficientes para atingir o quociente eleitoral.

 Tanto o presidente do Senado, José Sarney, como o vice-presidente da República, Michel Temer, ambos do PMDB, já demonstraram simpatia pela eleição majoritária para deputados e vereadores. A mudança defendida por Dornelles está prevista em uma proposta de emenda à Constituição de sua autoria: a PEC 54/07.

 Lista fechada

 A proposta do “distritão”, porém, é criticada pelo PT, que defende a manutenção do sistema proporcional – desde que a lista aberta seja substituída pela lista fechada. Segundo o líder do PT no Senado, Humberto Costa (PE):

 – O distritão significa a abolição definitiva dos partidos políticos, pois leva a uma personalização ainda maior das campanhas [já que o voto se destina unicamente ao candidato] e torna as eleições ainda mais caras, privilegiando os candidatos mais ricos – argumenta.

 Nessa linha de raciocínio, a senadora Gleisi Hoffman (PT-PR) argumenta que “os partidos são fundamentais porque trazem às campanhas eleitorais o debate de ideias e de programas, debate que seria eliminado se o distritão fosse implantado”.

No sistema de lista fechada mais difundido, o eleitor vota no partido, que já tem um grupo de candidatos escolhidos internamente. Ao defender a lista fechada, o PT afirma que esse sistema induz ao fortalecimento de partidos e, consequentemente, à consolidação da democracia.

 O PT defende a implementação da lista fechada junto com o financiamento público de campanha, argumentando que isso evitaria, por exemplo, o encarecimento das campanhas. O senador Wellington Dias (PT-PI) assinala que, assim, “qualquer brasileiro, tendo dinheiro ou não, poderá participar do processo eleitoral e chegar ao Congresso sem estar comprometido com o financiador A ou B”.

 – Defendemos um sistema no qual haja a preponderância de partidos ideológicos e programáticos – reiterou Humberto Costa.

 Por outro lado, até dentro PT, não há consenso em relação ao modelo exato de lista fechada a ser implantado. Wellington Dias, por exemplo, defende uma lista na qual o eleitor possa escolher, entre os candidatos definidos pelo partido, aquele que ele prefere (ou seja, seria possível “reordenar” a lista).

 Gleisi Hoffman admite simpatizar, “ao menos inicialmente, como ideia a ser discutida”, com o voto distrital misto. Além disso, ela propõe que o Brasil se baseie na experiência de países como a Argentina, onde se implantou um sistema de lista fechada que promoveu o aumento do número de mulheres entre os parlamentares.

 Os críticos da lista fechada afirmam que esse modelo enfraquece o vínculo entre os candidatos e os eleitores e reforça o poder das cúpulas das legendas. Francisco Dornelles, por exemplo, diz que “tal sistema levaria, hoje, à ditadura das cúpulas partidárias”. Já o líder do PSDB no Senado, Alvaro Dias (PSDB), observa que “não existem ainda partidos consolidados no Brasil, sendo que muitos são artificiais e vários não passam de siglas para mero registro de candidaturas”.

 – Ainda há muito a superar para, quem sabe, um dia discutirmos a possibilidade de implantar a lista fechada – diz.

Sarney e a reforma política

O presidente do Senado, José Sarney, defende que o projeto de reforma política deve-se limitar aos temas sobre os quais haja o mínimo de consenso, para que seja concluído ainda este ano. “É necessário se concentrar nas decisões e não nos debates puramente teóricos”, disse Sarney. Ele destacou a importância do prazo de 45 dias que a comissão conta para a elaboração do novo texto.

Para Sarney, o Brasil prosperou na área econômica, na diminuição da desigualdade social, na distribuição de renda, mas não avançou na sua organização política. Algumas das regras atuais remontam ainda ao século XIX, como, por exemplo, o voto proporcional, que já tinha sido debatido por Assis Brasil, lembrou Sarney.

“Hoje temos uma sociedade vasta, pluralista, aberta, com instrumentos de comunicação, de maneira que as idéias circulam não somente dentro do Parlamento, mas dentro da sociedade. A sociedade civil organizada, as ONG’s, os sindicatos de trabalhadores e de patrões, cada uma dessas organizações exerce uma representatividade muito grande, opina e decide de tal modo que os parlamentos não têm mais aquela exclusividade que existia no século XIX,” argumentou o senador.

Depois de considerar o voto proporcional uninominal o grande gerador da atual decadência do sistema eleitoral partidário, Sarney reforçou que o ideal seria conciliar os benefícios do sistema majoritário, que “obtém maiorias estáveis”, com o sistema de listas partidárias fechadas, “valorizando os programas partidários”.

O presidente da Casa insistiu que o principal desafio da comissão não era a busca de uma solução ideal, “mas de uma solução possível”, indicando que debates dispersivos deveriam ser evitados, sempre com o objetivo de “alcançar uma fórmula consensual”.

 Finalizou sua fala, insistindo na importância da agilidade na elaboração do projeto de reforma política para “desmentir o pessimismo que não vê nossos esforços”.

Reforma política já começa com incerteza

O Senado deu um passo em falso ao criar a Comissão da Reforma Política. A tendência da Câmara é ignorar o que os senadores aprovarem. As principais mudanças dizem respeito à eleição para a Câmara e, por isso, os deputados sustentam que cabe a eles a última palavra.

Os deputados alegam que 81 senadores não podem decidir o futuro de 513 deputados. Para eles, a proposta deve iniciar na Câmara, ir ao Senado e voltar para a votação final na Casa.

A enésima tentativa de fazer a sonhada reforma política já começa a fazer água…

Perfil

Blog informativo de Direito Eleitoral, com análise das inovações legislativas e da evolução jurisprudencial.

Flávio Braga é Pós-Graduado em Direito Eleitoral, Professor da Escola Judiciária Eleitoral e Analista Judiciário do TRE/MA.

“O seu voto não tem preço, tem consequências”

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