Mais vale um adversário leal que um correligionário traidor *.

* Adaptação literária do discurso proferido terça-feira, 13 de outubro de 2010 na Assembléia Legislativa do Maranhão.



Faleceu no último dia 6 de outubro, em São Paulo o deputado Pedro Veloso.

Pedro era, assim como eu, um dos representantes de Pio XII, lugar que tenho certeza meus mais assíduos e atentos leitores assim como os frequentadores das galerias da Assembléia Legislativa do Maranhão, já me ouviram falar sobre ele, pois sempre foi o município pelo qual muito me empenhei.

Eu e Pedro éramos aquilo que se podia chamar de leais adversários. Pessoas que mesmo em lados opostos, cultivam um bom convívio baseado na boa educação, no bom costume de tratarem-se cordialmente, até mesmo com certa reverência. Fazíamos isso, principalmente pelo fato de sabermos exatamente os riscos que se corria em levar para o lado pessoal algo que era eminentemente político e eleitoral, algo localizado e restrito a um único município.

Às vezes ficava muito difícil portar-se como um cavalheiro. Isso acontecia quando os embates locais em Pio XII eram impossíveis de evitar, mesmo porque em se tratando de política municipal, com todos os seus contornos de intriga e inimizade pessoal, por parte dos chefes políticos municipais, os ânimos se exaltavam e o clima ficava realmente quente.

Como são engraçadas essas coisas da política! Na última vez em que falei com Pedro, uns três meses atrás, ele estava aparentemente melhor, e me disse que não via a hora de começar a campanha pois isso iria dar-lhe mais forças, mais vontade de superar esses tempos difíceis.

Naquela ocasião ele me disse que o prefeito de Pio XII, a quem eu sempre apoiei, o mesmo que várias vezes fui à tribuna defender das acusações levantadas por Pedro, o mesmo que ajudei duas vezes a se eleger, estava me traindo. Pedro me disse que soube que o prefeito estava inventando uma desculpa para não mais votar em mim, dizendo que a governadora Roseana havia sugerido que ele votasse em um certo Secretário de Estado, mas que ele iria votar também em um outro deputado, a quem ele, o prefeito, devia um bom dinheiro e não tinha como pagar, a não ser com votos.

Nós rimos muito disso tudo. Nos lembramos das pelejas que travamos por causa do tal prefeito, comentamos sobre a fraqueza dos homens, e lamentamos que o caráter de alguns fosse tão frágil quanto um castelo de areia construído na arrebentação das ondas do mar.

Pedro, em tom grave, me disse que a campanha de 2010, em Pio XII, poderia ficar sem nenhuma graça, pois tanto eu quanto ele poderíamos não estar presentes, eu vitimado por uma absurda traição e ele atingido pela grave doença contra a qual lutava com todas as suas forças.

Respondendo-lhe a isso eu disse para ele que caso a traição se consumasse, que ele reservasse um lugarzinho em seu palanque para que eu pudesse subir e pedir voto para ele pois tinha fé em Deus que na campanha de 2010, eu poderia até sucumbir à traição, mas torcia e acreditava que ele venceria mais a batalha contra a doença e que logo estaria firme, em campanha, rumo a mais um mandato de deputado. Até brinquei, dizendo que, para tudo ficar mais correto, só faltava agora ele e o pai dele irem comigo falar com Zé Sarney e voltarem a fazer política no grupo a que sempre pertenceram. Ele sorriu e disse que tanto uma coisa quanto a outra eram muito difíceis de acontecer, que o mais fácil seria ele simplesmente votar em mim, caso ele não tivesse condições físicas de enfrentar uma campanha, pois o prazer maior dele, seria ver a cara de seu adversário, o prefeito, quando o deputado que sempre o defendeu, fosse apoiado por seu adversário, isso porque ele, o tal prefeito, havia me trocado “por 30 moedas de prata e alguns caderninhos”.
Mesmo doente Pedro fazia planos para o futuro. Sabedor da gravidade de seu caso, não esmoreceu, jamais deixou de lutar e muito menos de pensar em sua terra e em sua gente.

No final, Pedro acertou e eu errei. Não estaremos, nem eu nem ele em Pio XII, na campanha de 2010.
Perdi um adversário e fiquei triste por isso. Gostaria que todos os adversários fossem como Pedro Veloso. Leal e correto.

Perdi um correligionário e se fiquei triste por um lado, mas por outro fiquei aliviado, porque certas “amizades”, é melhor não tê-las…  

Como disse certa vez o senador Cafeteira e costuma repetir o ex-deputado Aderson Lago: “É preferível nos juntarmos a um leal adversário do que aceitarmos a ajuda de um traidor”.

Perfil

“Poeta, contista e cronista, que, quando sobra tempo, também é deputado”. Era essa a maneira como Joaquim Elias Nagib Pinto Haickel aparecia no expediente da revista cultural Guarnicê, da qual foi o principal artífice. Mais de três décadas depois disso, o não mais, porem eterno parlamentar, ainda sem as sobras do tempo, permanece cronista, contista e poeta, além de cineasta.

Advogado, Joaquim Haickel foi eleito para o parlamento estadual pela primeira vez de 1982, quando foi o mais jovem parlamentar do Brasil. Em seguida, foi eleito deputado federal constituinte e depois voltou a ser deputado estadual até 2011. Entre 2011 e 2014 exerceu o cargo de secretario de esportes do Estado do Maranhão.

Cinema, esportes, culinária, literatura e artes de um modo geral estão entre as predileções de Joaquim Haickel, quando não está na arena política, de onde não se afasta, mesmo que tenha optado por não mais disputar mandato eletivo.

Cinéfilo inveterado, é autor do filme “Pelo Ouvido”, grande sucesso de 2008. Sua paixão pelo cinema fez com desenvolvesse juntamente com um grupo de colaboradores um projeto que visa resgatar e preservar a memória maranhense através do audiovisual.

Enquanto produz e dirigi filmes, Joaquim continua a escrever um livro sobre cinema e psicanálise, que, segundo ele, “se conseguir concluí-lo”, será sua obra definitiva.

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