O monopólio ideológico da razão

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Tenho dedicado algum tempo de meus dias, em meio a essa pandemia, para analisar, estudar e tentar entender qual o verdadeiro sentido dessa onda avassaladora de intolerância, advinda exatamente daqueles que se dizem antagonistas a ela.

Dizem que a obra de Monteiro Lobato tem cunho preconceituoso e racista, e que as crianças não devem ter acesso a ela. É como se Dona Benta e todos no sítio tratassem tia Anastácia como escrava ou mesmo como uma mera serviçal e não como companheira de toda uma vida, e uma pessoa amada.

Voltei a ler a obra de Lobato e confesso que não consegui encontrar nela nada que pudesse sugerir preconceito ou racismo, mas pensei que poderia estar impregnado pelo racismo estrutural ao qual estamos submetidos culturalmente, então resolvi continuar pesquisando.

Comentei esse fato com um amigo que mandou que eu lesse um trecho de “Caçadas de Pedrinho” onde haveria uma alusão à predileção que as onças devem ter pelas carnes de tia Anastácia, como se a onça, tendo Dona Benta à sua frente, fosse deixá-la de lado, por preferir as carnes da quituteira do sítio!

No meio dessa polêmica, soube que alguns canais de filmes tiraram do ar “E o vento levou…”, por este fazer proselitismo de atos racistas e mostrar uma realidade que induz as pessoas a banalizarem o preconceito e a discriminação racial.

Absurdos como esses dois, em minha opinião, bem representam os acontecimentos generalizados de incompreensão que estão ocorrendo, fazendo com que aqueles que se dizem defensores dos bons sentimentos e adversários das más índoles, cometam os mesmos erros que atribuem aos seus oponentes.

Devo deixar bem claro que racismo é algo repugnante e deve ser totalmente repudiado.

Porém é incompreensível que muitas das pessoas que abominam “O Sítio do Pica-Pau Amarelo e “E o vento levou…”, sejam fiéis seguidores das ideias de Friedrich Nietzsche, cujo pensamento, elaborado nas décadas finais do século XIX, inspirou os movimentos direitistas e elitistas do começo do século XX e influenciou os ideólogos do nazismo e do autoritarismo militar europeu.

Uma das teorias desse formidável filósofo alemão, um dos mais estudados e apreciados, diz que “a escravidão é necessária à cultura”, e mesmo assim, ele é mais aceito que Monteiro Lobato, que em sua obra mais importante, que começou a ser escrita há exatos 100 anos, atém-se a transpor para o ambiente rural brasileiro, as aventuras e os mitos da cultura universal.

Isso se deve ao fato das teses de Nietzsche serem de complexo entendimento para alguns que veem mais o existencialismo e os dramas de consciência que há nas palavras do alemão e menos o caráter violento delas.

Um filósofo, assim como um escritor ou um diretor de cinema, juntamente com suas obras, não são capazes de sozinhos moldarem uma sociedade, se ela não tiver a propensão natural para isso.

É a educação, familiar, social e formal, aquela que se adquire no convívio da família, da sociedade e do aprendizado na escola, que forja o caráter das pessoas, fazendo com que floresça ou murche as boas ou as más índoles inerentes a cada indivíduo.

O mais estranho nisso tudo é o fato de que aqueles que pretendem eximir as crianças do racismo que identificam na obra de Lobato, são os mesmos que desejam expô-las às diversas possibilidades de opções sexuais…

Pode parecer que ao usar o argumento acima, eu tenha jogado baixo, mas às vezes é preciso! Eu tento ser coerente, e não aceito esse absurdo monopólio ideológico da razão.

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Um triste balanço geral

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Tentei me imaginar como um auditor externo, descompromissado com qualquer dos lados em questão, que não sofresse nenhuma influência das consequentes circunstâncias dos fatos, atos e acontecimentos, para ver onde chegava na análise de tudo isso que estamos vivendo.

Nosso país passou por um período conturbado, onde diversos escândalos de corrupção eclodiram e foram expostos esquemas bilionários de roubo. Processos foram instaurados, julgamentos foram feitos, sentenças foram prolatadas e penas foram cumpridas.

A população revoltada, elegeu alguém de tendência política oposta a quem já estava no poder há muito, e foi responsável pelos tais casos de corrupção. A escolha, como ocorre em qualquer eleição, foi mais emocional que racional, o que sempre acarreta diversos problemas.

O eleito não é alguém com características de estadista. Seu estilo populista e atabalhoado, resvala constantemente no desrespeito às normas do bom e sadio convívio social, o que desagrada a alguns, mas não desagrada boa parte do povo, que se identifica com o jeito rude de ser e de agir do presidente.

Essa falta de aptidão do chefe do executivo no trato cordial para com as pessoas, a sua incapacidade de se comunicar de forma satisfatória e aceitável, complicam ainda mais sua situação, fato que é facilmente entendido como estilo intolerante e autoritário, o que é verdade, e que revela, segundo alguns, sua vontade latente de estabelecer uma ditadura, o que não há comprovação, a não ser nas narrativas de seus opositores, por motivos óbvios.

O presidente tem um estilo irresponsável, pois não mede as consequências das coisas que diz e faz, muitas vezes tendo que retroceder ao ser confrontado com a inexequibilidade de suas ações impensadas e não planejadas minuciosa e detalhadamente como deveria fazer.

Motivados e respaldados pelos flagrantes erros cometidos pelo presidente, quanto ao conteúdo, porém muito mais pela forma deles, os poderes legislativo e judiciário, ambos em defesa da ordem constitucional, mas embalados por motivações políticas, tomam atitudes contra as ações do presidente da república.

As atitudes do legislativo e do judiciário, mesmo não estando em desacordo com o regramento jurídico, possuem um ingrediente político grande e grave, o que transforma o caso em disputa meramente ideológica e partidária, coisa inadmissível entre os poderes da república.

A constituição brasileira estabelece que os poderes da república devem agir com independência, cada um cumprindo suas funções, mas em harmonia, para que não se estabeleça o caos, como este pelo qual estamos passando.

Junte a isso a inescrupulosa e insidiosa ação de parte da imprensa, que há muito tempo esqueceu a sua missão e resolveu se tornar um quarto poder, paralelo e às vezes sobreposto aos constitucionais, e criar heróis como fez com Collor e Lula, ou destruí-los como fez com os mesmos.

Para agravar ainda mais essa situação, a modernidade e o avanço tecnológico permitem que qualquer pessoa, mesmo sem ter a qualificação necessária para fazê-lo com responsabilidade, possa participar do debate diário, através das redes sociais e da internet, o que só complica ainda mais o panorama.

Chego a triste conclusão que a única vítima em toda essa tragédia é o povo brasileiro.

O que temos é o caos e há três maneiras possíveis de se sair dele: Voltamos no tempo e não cometemos os erros que o originou, o que é impossível; Explodimos tudo, o que é inadmissível; ou, paramos, desarmamos nossos espíritos e começamos novamente, de um ponto aceitável por todos, o que é muito difícil, mas a única coisa razoável que nos resta a fazer.

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Precisamos falar sobre racismo

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Racismo é o assunto do momento e espero que ele seja tema recorrente na pauta de todos, até que fique tão banal que o seu objeto deixe de existir… Mas mais realisticamente, o racismo infelizmente não vai desaparecer completamente, no entanto sua incidência precisa diminuir drasticamente.

O brutal assassinato de George Floyd, por um policial branco, na cidade americana de Mineapolis, gerou uma onda de protestos por todo o mundo, chamando mais uma vez a atenção para esse grave problema de nossa sociedade.

Existem outros grupos raciais que também são vítimas do racismo como curdos, armênios, sérvios, croatas, hutus, tutsis, ciganos, judeus e palestinos, mas as perseguições a eles são mais localizadas, quase sempre em conflitos civis internos.

O racismo mais comum é o sofrido pelos negros nos países ocidentais, devido aos séculos de escravidão que os povos africanos foram submetidos, principalmente nos 500 anos, entre 1400 e 1900. Depois desse período escravocrata formal, o racismo estrutural tomou conta do dia a dia das pessoas negras.

Racismo estrutural é a forma pela qual ele foi estabelecido, de modo a fazer com que os descendentes dos antigos escravos permaneçam nas camadas mais baixas do espectro social. É muito difícil escapar ou suplantar isso, uma vez que ele está arraigado nos componentes básicos desse organismo vivo que é a sociedade.

Nossos pais sempre deixaram bem claro que as pessoas não deveriam e não podiam ser classificadas ou valorizadas pela cor de sua pele.

Meu pai teve um irmão de criação negro que ficou conhecido como Raimundo Nagib, já minha mãe trouxe para morar conosco uma amiga de infância, que se transformou em nossa mãe de criação, Mãe Teté. Meus pais criaram como nosso irmão o filho de Anita, lavadeira da casa de minha avó, que morrera de parto, Celso Henrique.

Eles incentivavam a nossa convivência com a rapaziada do bairro onde morávamos, quase todos negros, com quem jogávamos futebol: Calhambão, Mário, Xilado… Depois foram os amigos do basquete: Espirro, Carlos Henrique, Paulo Zona…

Sempre respeitamos as pessoas independentemente da cor de sua pele, sempre tivemos amigos negros e jamais fizemos distinção deles por motivos raciais. As distinções que sempre estabelecemos entre as pessoas foram as que dizem respeito às suas índoles.

Quando minha filha estava ficando mocinha, imaginei que ela aparecesse um dia lá em casa com um namorado. Fiquei idealizando o cara perfeito pra ela. Imaginei um rapaz da minha cor, um branco-bege, de cabelos castanhos, olhos negros, um cara parecido comigo!… Aí ela me apareceu com um asiático! Foi um baita susto! Ao me assustar, imaginei se ela tivesse arrumado um namorado negro! O que honestamente eu acharia!? O susto seria certamente maior que o que eu tive com o japa. Mas eu sabia que a coisa mais importante seria o modo como qualquer um deles trataria minha filha, como seriam os seus princípios como pessoas.

No fundo somos todos racistas, pois a nossa estrutura social é racista, e é contra isto que devemos lutar. É muito importante que todos nos posicionemos contra isso.

PS: Pensando bem, vejo que ainda sou bastante preconceituoso. Abomino pessoas hipócritas, pérfidas, arrogantes, prepotentes, insensíveis, incapazes de reconhecer um erro… E de agora em diante passarei a ser preconceituoso também com os racistas! Acho que desses preconceitos eu não vou conseguir me livrar!…

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Apenas uma reflexão

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Acredito que raramente os fatos acontecem exatamente como suas narrativas são propagadas. Já uma ideia tem um potencial maior de similitude quando relatada.

Os acontecimentos, por suas características fundamentais, como seu ponto de observação ou visualização, sua iluminação física e ideológica, ou a intenção de seu uso, trazem em si imensas distorções, que precisam sempre ser levadas em conta por quem desejar se aproximar o mais possível da verdade.

Dito isso, eu chego perto de estabelecer um postulado filosófico que já deve ter sido objeto de estudo de alguém, muito mais capacitado que eu: Não existe verdade em seu estado puro. Ela é um produto manufaturado pelas circunstâncias que a envolvem e agem sobre ela.

A busca da verdade é uma aventura titânica, e só gigantes realmente indomáveis podem embarcar nesta viagem.

Estamos vivendo num tempo onde as narrativas se impõem de maneira cruel, impedindo que se vislumbre um mínimo traço de verdade que nelas possam existir. É que essas narrativas estão impregnadas de intolerância, desrespeito, mágoa, medo, rancor, desesperança, venalidade, e mais que isso, de ideologias, filosofias e psicologias usadas no sentido de transformar essas narrativas em verdades inquestionáveis e inabaláveis, para com elas destruir quem não as professem, e controlar os demais.

É muito difícil desempenhar o meu papel em toda essa tragicomédia! É muito difícil manter a lucidez, a correção, a coerência e o bom senso, quando de alguma forma você também faz parte desse angu de caroço.

Não digo que eu consigo ser sempre lúcido, correto, coerente e ter bom senso. Algumas vezes eu falho, mas estou sempre tentando acertar.

Gostaria de estar sempre na posição que o mestre Aristóteles sacramentou como sendo a mais correta para que o homem alcance a virtude, palavra que pode ser interpretada como verdade, sucesso ou prazer, sem que haja discordância ou conflito entre elas. O centro, o caminho do equilíbrio. A ponderação.

Busco muito essa posição para mim e para minha vida, mesmo sabendo que tenho uma leve tendência para me posicionar um pouco a direita do centro, ser um pouco “conservador,” nas palavras de alguns.

A palavra conservador, da mesma forma que a palavra revolucionário, bem como qualquer outra palavra, umas mais outras menos, está impregnada por conceitos e preconceitos valorativos e adjetivos atribuídos a ela no decorrer dos anos, que acabam por descaracterizá-la.

A palavra demagogo, por exemplo, era usada na Grécia antiga para designar cada um dos líderes do partido democrático, que dominavam a arte de conduzir o povo. Com o passar dos séculos, demagogo passou a ser simplesmente aquele que manipula a massa popular, fazendo promessas que muito provavelmente não serão cumpridas, visando apenas a conquista do poder político ou outras vantagens. O que não deixa de ser verdade.

Entende-se por conservador, aquele que não deseja a evolução, o progresso, a liberdade, as coisas boas. Quando se fala em conservador, se imagina um velho rabugento, vivendo no passado, sem deixar os ventos da modernidade avançarem. Esse entendimento está completamente equivocado. Conservador é quem é contido, paciente, precavido, cauteloso. Alguém que não é dado a aventuras vãs.

Já revolucionário é hoje o que sempre foi. Alguém destemido, pronto para enfrentar as dificuldades, um aventureiro sonhador que deseja mudar o mundo e não mede as consequências.

O problema não é ser uma coisa ou outra, pois existem bons e maus conservadores e bons e maus revolucionários. A Igreja Católica, conservadora, estabeleceu a Inquisição que matou milhares de pessoas, mas em compensação, Churchill, conservador, livrou o mundo do nazismo! Stalin e Mao Tse Tung foram revolucionários que mataram milhões de pessoas, já os revolucionários Fleming e Sabin, salvaram milhões de vidas!

Bem, foi esta a minha reflexão desta madrugada sem sono.

Reconheço-me um conservador moderado, que busca incansavelmente a lucidez, a correção, a coerência e o bom senso, que está disposto a lutar contra a intolerância, o desrespeito, a mágoa, o medo, o rancor, a desesperança, a venalidade, e outras coisas que complicam a vida.

Desejo ser alguém que busca, não uma verdade, mas informações fidedignas e confiáveis que me permitam tirar uma conclusão que se aproxime bastante dela.

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