Pedras e Vidraças

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Recebi na semana que passou uma mensagem por correio eletrônico onde um indivíduo que se identificou por José Maria de Jesus Silva, comentava sobre uma matéria que ele lera num blog sobre a minha pessoa.

Segundo ele, a referida matéria discorria sobre o fato de eu ser melhor como pedra do que como vidraça. Não me lembro de ter lido a tal matéria, mas isso não é nenhuma novidade, pois minha memória está cada dia pior, mas o fato relevante neste caso é exatamente o que eu acredito que deve ocorrer com todo mundo. Todos nós devemos nos sair melhor como pedra do que como vidraça e para provar minha teoria dou dois exemplos definitivos, com os quais não precisarei me estender em detalhadas explicações: Ricardo Murad e Flávio Dino.

Mas voltemos ao José Maria de Jesus Silva! Em primeiro lugar quase tive uma síncope quando recebi sua mensagem, pois esse nome é o mesmo do ex subchefe da Casa Civil do Estado, na gestão do governador João Castelo, tempo em que trabalhei como oficial de gabinete do Palácio. O professor Zé Maria era uma espécie de “come livros”, um rato de biblioteca que conhecia todas as formas de agir quanto a algumas situações legais. Mais tarde ele veio a ser conselheiro de contas dos municípios.

Assustei-me por um bom motivo! É que o professor Zé Maria, já faz algum tempo, deve estar comendo livros na biblioteca celestial! Como é que um homônimo de um de meus primeiros chefes hierárquicos vem me chamar à razão. Fiquei intrigado!

No texto, o tal Zé Maria diz que eu deveria aproveitar o preparo que eu adquiri em mais de três décadas de prática na política legislativa para arremessar alguns seixos nas reluzentes vidraças do poder da ocasião.

O caso é que o ZM esquece ou talvez nem saiba que eu não aprendi a jogar pedra. Isso é coisa que se aprende quando jovem ou então jamais se aprenderá. Desde cedo fiz política do lado de dentro das janelas. Somente por 4 anos, dois na administração de Zé Reinaldo e dois na de Jackson Lago, fiz parte da oposição e mesmo nesse tempo não estilhacei muitas vidraças, não mais do que o faria se estivesse do lado de dentro dos muros do Palácio, como fiz durante muito tempo em relação às vidraças de meu próprio grupo político.

Em meus anos como deputado, desenvolvi uma forma muito particular de agir em relação às coisas com as quais eu concordava e com as quais eu discordava. Quando concordava com algo eu citava, elogiava e cumprimentava o autor. Quando discordava, procurava o responsável, dizia o meu ponto de vista, argumentava sobre o possível equívoco e tentava demovê-lo de sua posição ou ser convencido de que o errado era eu. Quando não era meu o equívoco e o agente persistia no erro eu o criticava publicamente, mantendo minha coerência, buscando fazer com que as coisas mudassem.

Ocorre meu bom amigo ZM, que naquela época eu tinha embaixo de mim a tribuna da Assembleia Legislativa, na minha retaguarda as prerrogativas comuns a um deputado, sobre mim a mão pesada daqueles que me nomearam seu procurador e à minha frente a ideia que eu defendia. Hoje, nobre amigo, sou um cidadão comum, igual a você e ao caro leitor que me prestigia nesta leitura. Posso ter sob mim esta prestigiosa tribuna jornalística e literária, em minha retaguarda tenho somente as prerrogativas de cidadão, sobre mim a mão pesada de minha consciência e à minha frente, as mesmas ideias que defendia antes, defendo hoje e pretendo continuar defendendo enquanto vida tiver. Mas os efeitos de minhas palavras e de minhas ações, meu nobre amigo, não são os mesmos, não têm a mesma força nem causam as mesmas consequências, talvez até não causem efeito algum.

Outro dia minha mãe me ligou para dizer que havia passado a manhã inteira assistindo a TV Assembleia e que havia ficado entristecida por ver que os deputados estavam preocupados unicamente em atacar ou defender o governo, não dando a devida importância para outros assuntos que segundo ela, devem ser colocados acima de qualquer posicionamento politico, partidário ou ideológico.

Ora, se minha mãe, uma senhorinha de 85 anos de idade sabe que existem coisas que não podem estar impregnadas pelo vírus da politica, do partidarismo e da ideologia, e algumas pessoas que tem obrigação de saber isso, não dão a devida importância para o assunto, não serei eu, meu amigo Zé Maria, que vou sair jogando pedras nas vidraças alheias. O máximo que farei será defender as ideias que reputo como indispensáveis para que se tenha um clima republicano e democrático de debate, onde todos possam dizer o que pensam, com responsabilidade e correção.

Aprendi desde cedo que em matéria de política, a maioria das coisas referentes a ela, é definida por uma mera questão de opinião, e quem detém o poder tem claramente uma opinião mais forte… Isso quando quem detém o poder tem sabedoria suficiente para transforma-lo em capacidade de realização e de transformação da quase sempre difícil realidade.

Eu comecei a pensar, a filosofar e a escrever, bem antes que comecei a fazer politica, mas nem por isso posso dizer que penso, filosofo e escrevo melhor que exerço o ofício que Aristóteles dizia ser comum à humanidade, e é exatamente por isso que eu lhe digo amigo ZM, é melhor eu tratar de melhorar meus pensamentos, minha filosofia e minha literatura que ir jogar pedra em vidraças de quem quer que seja, pois como já disse anteriormente, não aprendi a jogar pedras. O máximo que consegui aprender foi o método socrático de me posicionar num debate.

 

PS: O método socrático consiste em uma técnica de diálogo onde se faz uso de perguntas simples, quase ingênuas, com o objetivo, em primeiro lugar, de revelar as contradições presentes na forma de pensar do oponente, normalmente baseadas em valores e preconceitos comuns nas pessoas e na sociedade, e assim fazer com que ele possa redefinir seus valores e quem sabe até, aprender a pensar da mesma forma.

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Nasceu pra ser feliz!

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Existem alguns fatos bastante curiosos em nossas vidas. Do momento em que nascemos até o momento em que constituímos família e geramos nossos filhos, tempo que varia de vinte e cinco a trinta anos, somos unicamente filhos de nossos pais. Dai pra frente, durante outros 25, 30 anos somos preferencialmente pais de nossos filhos. Ocorre que no período em que contamos com uma idade que vai de 50 a 55 anos, passamos a ser preferencialmente pais de nossos pais para em seguida, quando estivermos na faixa de 75 a 80 anos, se tivermos sorte, sermos filhos de nossos filhos.

Esse é o ciclo natural da vida. Mas há um motivo para eu estar aqui, hoje, comentando esse assunto com você, caro amigo(a). É que de um tempo para cá, desde que minha mãe completou 85 anos, me preocupo cada dia mais com ela, com sua saúde, com sua qualidade de vida e com o destino inexorável que espera por todos nós no final de nossas histórias, como protagonistas presentes e atuantes em nossos enredos.

Minha mãe já sobreviveu à ausência de meu pai por 22 anos e nesse tempo aprendemos mais com ela do que nos 33 anos antes desse fato.

Ela é uma mulher incrível, e não digo isso por ela ser minha mãe, digo isso pelo fato dela acabar sendo mãe postiça de uma infinidade de pessoas das mais diversas origens e procedências, pessoas que se afeiçoam a ela pelo seu jeito de ser e de agir, pelo seu coração de ouro e sua alma de cristal.

Outro dia recebi um telefonema de Teresa Nascimento, uma amiga minha de longas datas, pedindo para eu dizer à minha mãe que ela estava tentando falar com ela e não conseguia, seu celular chamava e ela não atendia. Teresa conhece minha mãe há muitos anos, mas as duas se tornaram muito ligadas graças às atividades da igreja.

O famoso padre Claudio, do Cantinho do Céu, trata minha mãe com deferência semelhante a que trata sua própria genitora, o mesmo ocorre com todas as pessoas de seu convívio naquela maravilhosa comunidade cristã, a qual, em que pese eu não ser frequentador, eu muito admiro. Em minha defesa poderia citar Margareth e Zé Reinaldo, este meu contemporâneo do Colégio Batista, hoje companheiro de minha velha nas obras da igreja.

Madrugada dessas acordei sobressaltado, com um peso no peito e um nó na garganta. Por um instante fiquei imaginando o que poderia eu estar sentindo, já que sempre me vi como um sensitivo bastante perspicaz. Poderia ter imaginado que algo teria acontecido com alguma de minhas filhas, principalmente com a mais nova que é roqueira… Nem cogitei! Poderia ter imaginado que fosse algo com meu irmão que toma umas cervejinhas nos fins de semana… Nada! Minha preocupação foi direto para minha mãe, que naquela hora estava dormindo tranquilamente em sua caminha.

Fiquei imaginando o que aconteceria comigo, com meu irmão, com todos que a amam se algo de ruim acontecesse com ela. Fiquei apavorado! Não consegui mais pregar o olho.

Dias se passaram e voltei a imaginar esse cenário catastrófico, mas dessa vez resolvi pensar com a cabeça de minha mãe, analisar isso tudo como se fosse ela e foi como se a ouvisse dizer: “Meu filho, eu nasci pra ser feliz e o serei enquanto Deus quiser”.

A única coisa que eu peço a esse Deus ao qual minha mãe dedica tanto trabalho e amor é que ele não permita jamais que ela sofra, pelo menos não mais do que ela possa dignamente suportar.

Gostaria que você soubesse, caro leitor(a), que quando comento isso com você não é na tentativa de me vangloriar pela mãe adorável que eu tenho. Cada um de nós tem a sua. Falo para que você saiba que as preocupações que você sente em relação aos seus entes queridos são comuns a outras pessoas e possa saber que o que você sente também é sentido por muita gente. Então, seja bem vindo ao seleto grupo dos que se preocupam com o bem estar de seus maravilhosos velhinhos.

 

PS: No que diz respeito ao quesito mãe eu e meu irmão somos felizardos. Tivemos três. Além de Clarice, que sentiu as dores dos partos, nós também tivemos duas mães de criação, que se dedicaram a nós com amor e devoção: Yolanda, que era uma espécie de enfermeira, e já se foi… E Estelita uma espécie de “disciplinadora”, que nos acompanha até hoje, com a qual temos as mesmas preocupações.

 

 

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A contabilidade da Vida

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Já falei desse assunto aqui, mas acredito que nunca seja demais comentar, principalmente usando uma abordagem nova, tendo como base uma matéria que realmente não controlo e que me deixa um tanto inseguro. Trata-se de contabilidade, mas não aplicada aos negócios ou às empresas. Falo da contabilidade necessária para aferirmos se somos felizes ou não, ou melhor dizendo, se somos mais ou menos felizes, nesse ou naquele tópico da vida.

Vou fazer a minha contabilidade para que você use-a como base para fazer a sua e possa ter uma noção do que se passa com sua vida.

Comecemos pela contabilidade da saúde: eu tenho um pouco mais de crédito do que débito nesse setor. Imagino que por enquanto o balanço aqui seja de 55 x 45. Fico pouco enfermo, uma ou outra dorzinha de cabeça, raramente fico resfriado, mas tenho um relevante sobrepeso, minha taxa de tolerância a insulina começa a se elevar, aos 55 anos fiquei hipertenso e preciso repor minha B12… O quadro parece difícil, mas tudo isso é controlável, desde que eu obedeça aos médicos, tome os remédios, faça dieta e exercícios físicos… O que me leva diretamente a uma segunda análise. Sou mais desobediente que obediente.

Outro quesito a ser analisado é o da família. A minha é uma família equilibrada, bem estruturada, nela as pessoas se amam e os problemas que enfrentamos são apenas os problemas inerentes ao dia a dia. Nesse campo poderia dizer que o jogo contábil seria de 85 x 15.

Amigos: nesse âmbito posso dizer que sou um artilheiro. Tenho infinitamente mais pessoas que posso chamar de amigos que aquelas que seriam o oposto disso, coisa que imagino não ter nenhum. Ter um Inimigo é como ter um câncer. Quem tivesse vários inimigos teria vários cânceres. Eu gosto de imaginar que tenha adversários em algumas questões. Gosto até de cultivá-los para que na lida com eles possa aparecer o melhor de mim. Preocupo-me muito em não permitir que nenhum adversário se torne um inimigo. Se aparecer algum terá sido por escolha dele, jamais minha.

É bem verdade que existem algumas pessoas que não gostam de gente. Alguns têm até certa razão para isso. Não os culpo, mas o problema é muito mais deles do que meu. Alguém magoado ou inconformado com algo que eu tenha feito, com uma posição minha… O certo é que nesse balanço contábil da amizade tenho um superávit de 90% contra apenas 10% de déficit, além do que, eu costumo dizer que pra gostar de mim só precisa esquecer os preconceitos e me conhecer melhor!

Nos negócios, o balanço, apesar de ser também superavitário, é mais complexo. Existem fatores extremamente delicados e voláteis a serem analisados. Nossos negócios nunca dependem só de nós. Uma série de fatores influenciam a análise desse tópico, mas vamos tentar.

Mesmo sofrendo as influências do mercado, das regulamentações do poder público que a maioria das vezes é caolho e tacanha, mesmo sendo atingidos por concorrentes nem sempre bem intencionados, temos sobrevivido satisfatoriamente. Não somos tão poderosos quanto algumas pessoas imaginam, mas também não somos tão fracos quanto outros supõem. Imagino que esse balanço esteja na casa do 60 para 40.

Exerci cargos públicos entre 1979 e 2014 e durante todo esse tempo, por onde passei, de oficial de gabinete do governador, a deputado estadual, sendo deputado federal constituinte e secretário de estado, acredito que realizei mais coisas boas que coisas não tão boas. Sempre busquei o acerto, sempre lutei pelo equilíbrio, sempre persegui a coerência, todas essas coisas muito difíceis de serem alcançadas no mundo da política.

Nesses 36 anos, posso não ter conseguido só vitórias, mas jamais perdi uma eleição e sempre mantive a postura inerente aos bons políticos.

O contabilista que há em mim diz que meu superávit nesse quesito é de 75 contra 25 de déficit natural da função. Caso alguém conteste esses números posso facilmente provar que eles estão corretos, para isso basta que chamemos para depor correligionários e adversários meus do município de São Domingos do Maranhão, por exemplo, e quem não acreditar em minha contabilidade descobrirá que sou amado por uns e respeitado pelos outros. Se isso não for suficiente apresentarei as leis de incentivo à cultura e ao esporte, de minha autoria, motores desses setores em nosso Estado. Se isso não bastar, que levante minha ficha na justiça veja quantos processos existem contra mim!

O balanço agora é o cultural. Neste eu começo em débito. Nasci em uma família de classe média, meus pais não tinham largos horizontes culturais e mesmo assim eu abri o meu caminho com uma incrível dificuldade de leitura e uma desenfreada inquietação. Hoje, essas duas coisas são tidas como doenças: Dislexia e Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade.

Começando daí tinha tudo para não ir a lugar algum. Minha mãe e minha professora Terezinha, intuitivamente, inventaram um método de me fazer aprender com mais clareza e agilidade: pelo ouvido e pelos olhos. O audiovisual salvou minha vida intelectual.

Depois disso subi degrau por degrau até chegar aqui onde estou, na base da pirâmide cultural de minha terra, e de onde acredito não vou sair. O topo não é para mim. Sempre preferi os coadjuvantes. Como digo em um poema, “Não se esqueça dos coadjuvantes eles são mais importantes e necessários que você imagina”.

Com um placar 65 x 35, penso ainda em melhorá-lo, mas tenho consciência de que se o fizer vai ser mais pelo trabalho que eu e meus formidáveis parceiros temos realizado no resgate e na preservação da memória audiovisual do Maranhão que em meu mérito pessoal.

Já contabilizei minha saúde, minha família, meus amigos, meus negócios, a política e a cultura, resta apenas dizer que no que diz respeito ao amor eu sou um felizardo. A maioria das vezes que amei, meus amores foram correspondidos em quantidade, qualidade e intensidade, quando não o foram eu os usei como combustível para meus poemas, contos e crônicas. Nesse ponto penso que o balanço é de 95 x 5, e o superávit aumenta a cada dia em que vivo com Jacira.

Somei todos os balanços, os prós e os contras, e cheguei ao resultado médio de 75 x 25. Com um placar assim meu amigo, você acha que alguém pode reclamar da vida.

Faça a sua contabilidade, os seus balanços. Espero que os resultados sejam positivos e que você os possa melhorar a cada dia.

 

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No Escurinho do Cinema

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Já faz algum tempo que eu tenho vontade de fazer uma pergunta pra você que me prestigia com sua leitura, aqui nesse privilegiado espaço. Será que você poderia me dizer o que é mesmo que as pessoas vão fazer nas salas de projeção de cinema?

Pergunto isso porque acredito que assistir a filmes é uma das coisas que algumas pessoas não vão fazer nesses lugares.

Eu vou, pelo menos uma vez por semana ao cinema, sendo que às vezes vou a este lugar de entretenimento duas vezes na mesma semana e chego a ir até três vezes, quando a oferta de filmes é generosa. Com essa frequência acabo sendo testemunha da existência de grande quantidade de uma espécie de hominídeos, similar ao grupo de criaturas bípedes do qual eu e você fazemos parte, que infelizmente, assim como nós, também frequentam esses lugares.

Vou tentar ajudar você nessa investigação sobre o que alguns dos descendentes de Caim, de um ramo diferente do nosso, vão fazer nas salas de projeção de cinema.

Em primeiro lugar, vamos estabelecer os tipos desses seres quase alienígenas que convivem conosco nas escuras salas onde a sétima e mais polivalente das artes humanas se consuma:

Existem os que vão para o cinema se alimentar. É como se aquele local e aquela atividade, lhes propiciasse um apetite desenfreado. Eu até entendo que o hábito de comer uma pipoquinha e tomar um refrigerante no cinema é uma coisa saudável e ajuda a entrarmos no clima, a ficarmos à vontade, como se em nossa própria casa estivéssemos. Ocorre que uma coisa é uma pipoca e outra coisa é um excessivamente aromático Mac Fish, capaz de infestar com o cheiro de peixe e de cebola toda a sala, fazendo com que até pessoas que não suportem sanduiches de peixe queiram dar uma mordida no maldito, fazendo com que o desconcentrado vizinho divida sua atenção entre a guloseima e a talentosa Juliane Moore que na tela interpreta a esquecida “Alice”.

Outra coisa importante. Anteriormente disse que a pipoca e o refri podem nos fazer sentir estar em casa, mas em que pese este sentimento ser importante, não devemos jamais esquecer que não estamos. Estamos no cinema, logo não devemos nem podemos colocar os pés na poltrona da frente, como se estivéssemos na sala de estar de nossa residência.

Voltando a falar de comida. Um dos pecados capitais nos cinemas de todo mundo são os pequenos ruídos causados pelos saquinhos de guloseimas que levamos para dentro das salas. Deste pecado nem eu, nem o papa Francisco estamos absolvido. Saquinhos de pipoca, embalagens de balas e bombons bem como qualquer ruído pode distrair o vizinho de uma cena imperdível de “O Enigma”. Pecado capital!

Ainda na categoria das comidas existem os porcalhões, que se não atrapalham o filme, acabam com a higiene e a civilidade do ambiente.

Outra categoria de atrapalhadores dos cinemas são os namorados, que hoje estão democraticamente divididos em três categorias distintas e em duas classificações de comportamento. Comecemos pelos comportamentos. Existem os discretos e os indiscretos, aqueles que parecem que vão ao cinema porque não encontraram outro lugar mais aconchegante para se pegarem. Estes fazem tantos e tão variados barulhos, que nem a mais discreta das criaturas, e eu não me incluo entre essas, deixaria de notar e observar.

Vejamos agora as categorias, e é bom que se diga que a existência delas está assegurada no artigo quinto da Constituição Federal. A categoria 1 é composta por uma pessoa do sexo masculino e outra do sexo feminino. Estes, com raras exceções, são os menos mal comportados. Depois, vem a categoria 2, composta por duas pessoas do sexo feminino, que se pode dizer que tem um comportamento aceitável na maioria das vezes, mas cometem um outro grave crime que será mais adiante abordado. Incontinência digital. Por fim, na categoria 3, formada por duas pessoas do sexo masculino, os campeões de pegação no cinema. Ou é isso ou é azar meu. Talvez o problema seja o lugar que eu sento no cinema. Escolho sempre a última fileira, na direção do corredor e alguns rapazes escolhem exatamente a última fileira, nas duas cadeiras, as mais próximas à parede. Um dia, ou melhor, uma noite, quase eu interrompo os amassos de um casal de rapazes, pois estava com medo que um deles matasse seu companheiro de tanto espremê-lo contra a parede, ou mesmo de asfixia. Isso sem falar nos frenéticos ruídos dos beijos.

Quero deixar claro que aqui não há nenhum ingrediente de preconceito quanto à opção sexual de cada um, o que há é a indignação de quem adora filmes e que vai ao cinema para assisti-los. Quando quero pegar minha mulher de jeito, o faço em casa ou em algum outro local reservado, onde só eu e ela contracenemos.

Existem ainda aquelas pessoas que vão para o cinema bater papo. São amigos falantes, casais que discutem as relações, pais que tentam explicar para os filhos o que está acontecendo no filme, ou traduzir para eles o que disse um ou outro personagem.

Falar baixo e discretamente dentro da sala de cinema não chega a ser uma violação gravíssima. Eu também falo no cinema, faço um ou outro comentário, mas fazer como o casal que certa vez sentou-se ao meu lado e passou o filme inteiro comentando os problemas da família de um parente… Eu estava a ponto de dar um grito, e olha que eu sou bem paciente!

Esse é o segundo pior tipo de vizinho de poltrona de cinema. Ele só é superado pelos mais imbecis de toda a galáxia: Os usuários compulsivos de telefones celulares e de todos os aplicativos de comunicação à disposição deles.

Outro dia quase avanço sobre um rapaz que tinha na mão um objeto luminoso que me fazia lembrar o vulcano “Spock”. Ele tilintava o instrumento e as luzinhas piscavam como em “Contatos Imediatos de Terceiro Grau”. Passou muito tempo até que minha mulher perdesse a paciência e pedisse para que ele desligasse o aparelho.

Desse tipo não existem poucos espécimes. Eles são muitos e acreditam que o que fazem é a coisa mais normal e correta que existe.

Por isso meu caro amigo leitor, é que te pergunto o que é mesmo que essas pessoas vão fazer no cinema? Assistir a filmes é que não é!

PS: Em que pese hoje ser Dia das Mães, eu não consegui preparar um texto sobre essas maravilhosas rainhas dos lares. Por mais que tentasse, a única coisa em que eu conseguia pensar era na minha sorte e na minha felicidade por ser filho da melhor mãe do mundo, e dizer isso em todo um texto soaria cabotino! Por isso deixei para fazê-lo só aqui, neste PS.

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Na Asa do Vento 

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Em todos esses anos, o fracasso, graças ao bom Deus, não têm sido meu companheiro de jornada. Recentemente, no entanto, depois de semanas de muito trabalho, experimentei a presença incômoda dele. Talvez nem se possa dizer que o que aconteceu tenha sido totalmente um fracasso. Relatarei o acontecido e gostaria que você julgasse.

Eu e um grupo seleto de profissionais do cinema, composto por roteiristas, produtores e diretores, nos juntamos para construir e apresentar projetos ao Fundo Setorial do Audiovisual, que estava recebendo propostas para séries destinadas às TVs públicas.

Resolvemos apresentar dois projetos. Um sobre os fluxos migratórios brasileiros e outro sobre crianças confrontadas com temas da atualidade. Ambos com 13 episódios, sendo que no primeiro, eles teriam duração de 52 minutos e no segundo, apenas de 7.

O projeto sobre as crianças, que chamamos de “Vozes do Futuro”, foi construído sem maiores problemas, pois concebi uma mecânica simples para executá-lo, sendo que o roteirista Mauro D’Addio me ajudou a contextualizar as ideias de forma rápida e eficaz, com isso o projeto ficou rapidamente pronto.

A partir daí caímos de cabeça no outro projeto, muito mais denso, cheio de camadas e um prato cheio para gente apaixonada por documentação audiovisual.

A abordagem estava construída em minha cabeça desde o momento em que resolvi entrar no projeto.

Em cada episódio da série sobre correntes migratórias acontecidas no Brasil entre as décadas de 50 e 80, batizadas de “Migrantes – Na Asa do Vento”, apresentaríamos um radialista, o Zé Demétrio, que do estúdio de sua pequena, mas poderosa rádio em ondas médias e tropicais no remoto sertão do Nordeste brasileiro serviria de link com seus vizinhos que resolveram levantar voo e se aventurar por outras paragens. Esse personagem foi criado por Messina Neto, escritor que sistematizou nosso roteiro.

Zé Demétrio seria muitas vezes a voz dessas pessoas, seu correio, seu padre, seu psicólogo ou conselheiro e refletiria nas histórias que contasse e nas músicas que tocassem a realidade, as circunstâncias e as consequências dessa “arribação”.

Em todos os episódios teríamos pelo menos três depoimentos de antropólogos, sociólogos, psicólogos, historiadores, geógrafos ou outro profissional que pudesse esclarecer melhor as circunstâncias e as consequências desses fluxos migratórios e das pessoas por trás deles.

Além disso, em cada episódio apresentaríamos pelo menos três depoimentos de testemunhas oculares da história, melhor dizendo, agentes/pacientes desses momentos, atores que contracenariam nos cenários e nos tempos que são objetos de nossa série.

Usaríamos uma grande quantidade de imagens fotográficas e cinematográficas concernentes aos assuntos que estivéssemos especificamente abordando. Usaríamos também imagens de jornais e revistas que trataram desses assuntos no decorrer dos anos. Nesse contexto, seriam usados recursos gráficos e animações computadorizadas para aclarar os fluxos migratórios.

Apresentaríamos referências históricas e culturais dos tempos e dos espaços por onde os personagens de nossas histórias passaram. Com isso construindo teríamos um cenário rico, amplo e tridimensional, fixando assim na cabeça do expectador as fortes ligações dos migrantes com suas realidades.

Lançaríamos mão de encenações dramáticas para construir reflexões sobre os sentimentos dos personagens dessas histórias. Exemplo disso seria a Jandira, moça que migrou para o Rio de Janeiro com sua família, sublime paixão de Zé Demétrio.

Em todos os episódios nosso radialista chamaria uma audição “ao vivo”, diretamente do estúdio da Rádio Cordel, onde um grupo musical apresentaria uma canção que contextualizaria o assunto abordado naquele capítulo, enriquecido pelas imagens de arquivo.

Lembro ao nobre leitor, que aqui também é o juiz que me julga agora, que o tempo total destes filmes seria de 676 minutos, ou seja, quase 12 horas, tempo que teríamos para contar a história dessas pessoas maravilhosas, que, se não são todas importantes, são todas indispensáveis para que se desenhe o mural de um país permanentemente em movimento.

No final, fizemos tudo isso e quando fomos subir os formulários para o site do FSA deu erro. O site estava congestionado. Não conseguimos apresentar nossos projetos em tempo hábil.

Tentamos de todo jeito, ligamos para lá, falamos com algumas pessoas que, simpáticas, tentaram ajudar, mas não resolveu.

Moral da história: Nadamos, nadamos, nadamos e morremos na praia.

Moral da história 2 – A volta dos que não foram: Vamos descobrir um jeito de produzir estas séries que foram muito bem concebidas e roteirizadas e que merecem ser bem produzidas, para que o público conheça algumas histórias fantásticas sobre si mesmo.

The End.

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