A Nobre Arte

Em meu último artigo disse que a partir de ter assumido o cargo de secretário de estado de esporte e lazer do Estado do Maranhão, minhas metáforas iriam mudar um pouco. Pois bem, aqui vai a primeira de uma série, esperando que em cada uma que vier daqui por diante, eu possa lançar  e converter três preciosos pontos, assim como no basquete, esporte que dentre todos eu mais amo. Justifico: O basquete assim como os outros esportes, se praticado entre semelhantes, pessoas da mesma faixa etária, com as mesmas compleições físicas, com desenvolvimentos técnicos semelhantes, de forma democrática e republicana, é o mais filosófico e ao mesmo tempo o mais científico de todos os esportes. Nele o atleta, instintivamente, executa uma infinidade de contas intuitivas enquanto pratica passes, interceptações, defesas, ataques e contra-ataques, rebotes e arremessos de uma bola em um aro que tem como anteparo uma tabela. São cinco competidores de cada lado da quadra, cada um exercendo uma função específica, desempenhando o papel para o qual foi designado e treinado para desenvolvê-lo. O basquete acalentou durante anos meu ideal de competitividade e busca do sucesso. 

Mas devo confessar que se amava incondicionalmente o basquete, se admirava o futebol, esporte no qual jamais me destaquei, se gostava do vôlei, do handebol, do futsal, sempre tive extrema dificuldade de encarar as lutas, as artes marciais de um modo geral, como esporte.

Acredito que isso se devesse ao fato dessas modalidades, aparentemente, irem frontalmente de encontro àquilo que eu ainda criança e fascinado pela leitura, pelo cinema e pelo aprendizado, imaginasse ser o maior dos ideais olímpicos, a principal mensagem que o esporte trazia em sua gênese: A suspensão das guerras, a celebração da paz, o congraçamento dos povos, das cidades, substituindo a fúria das sangrentas batalhas e das mortes que elas trazem em si, pela competição sadia, pela disputa igualitária, pela alegria e pelo companheirismo.

Ao mesmo tempo, sempre admirei a incrível capacidade de absorção dos poderosos golpes a que os boxeadores são submetidos. De meu pai, que era grande fã de Joe Louis, Rock Marciano, Cassius Clay e Eder Jofre, ouvi pela primeira vez que o boxe era conhecido como “a nobre arte”, e terminantemente não conseguia entender por que. Qual arte poderia existir no fato de dois homens passarem um tempão se esmurrando em um palco cercado por três fileiras de cordas?

O fato do boxe ser uma modalidade de confronto corporal mais direto, onde os contendores só podem usar os punhos para atingir o adversário e consequentemente derrubá-lo e vencer a disputa, sempre me fez repudiá-lo muito mais que as outras lutas.

A luta greco-romana (assim como o judô, o karatê, o taekwondo, entre outros) que existe há milênios, é um esporte muito pouco conhecido e por isso mesmo pouco admirado e consequentemente não atrativo financeiramente como é o boxe. Essa luta antes mesmo de ser assim batizada, em clara homenagem aos seus primeiros praticantes mediterrâneos, era tida como uma das práticas esportivas mais nobres.

Uma de suas regras principais proíbe  o uso das pernas, o que limita o lutador a usar somente a parte superior do corpo para derrubar, erguer e descolar o adversário. A luta se dá em dois rounds, com 3 minutos cada e é declarado vencedor o atleta que conseguir fixar os ombros do oponente no chão, caracterizando assim uma queda. Outra forma de vencer o combate é na contagem de pontos que cada atleta consegue durante os rounds, com golpes bem sucedidos e bem aplicados. A pontuação dos golpes varia de um a cinco pontos, dependendo do grau de dificuldade. Também é automaticamente considerado vencedor o lutador que abrir dez pontos de vantagem sobre o seu oponente. Se houver empate ao final dos dois rounds iniciais ou nenhum dos atletas conseguir fazer mais de três pontos, a luta é prorrogada por mais um round de três minutos. Se o empate persistir, os juízes decidem o vencedor.

As regras são indispensáveis em todo esporte e devem ser obedecidas rigorosamente. Mas além das regras específicas de cada modalidade, há outras que devem ser observadas quando se pratica qualquer atividade, seja ela física, mental, social, antropológica ou qualquer outra na esfera da relação humana. Devemos respeitar as regras da lógica, da física, da natureza, os postulados filosóficos, éticos e morais que envolvem os aspectos da atividade desenvolvida. Normalmente é fazendo de forma natural e simples que se consegue o sucesso. Se assim o competidor não fizer, não obterá vitória, será desde logo um derrotado, não conseguindo jamais subir ao verdadeiro pódio.

Mas voltando ao boxe. Sabe o que, depois de muitos anos com má vontade para com esse esporte, me fez concordar com o meu pai e aceitá-lo como a nobre arte? Foi depois que vi num desses canais especializados, um documentário sobre a vida de boxeadores famosos. A certa altura há uma sequência de lutas memoráveis entre grandes pugilistas que se olham de cara feia antes da luta, que se soqueiam, se agridem, se esmurram, às vezes por quarenta e cinco minutos, um querendo superar e derrubar o outro, mas que ao final, quando o juiz anuncia o vencedor, eles se cumprimentam, alguns até se abraçam. Foi nesse momento que vim a concordar com meu pai, o boxe é realmente a nobre arte, uma arte onde mesmo se esmurrando, respeita-se a regra do jogo e o resultado, e confraterniza-se respeitosamente depois da luta.

 

Perfil

“Poeta, contista e cronista, que, quando sobra tempo, também é deputado”. Era essa a maneira como Joaquim Elias Nagib Pinto Haickel aparecia no expediente da revista cultural Guarnicê, da qual foi o principal artífice. Mais de três décadas depois disso, o não mais, porem eterno parlamentar, ainda sem as sobras do tempo, permanece cronista, contista e poeta, além de cineasta.

Advogado, Joaquim Haickel foi eleito para o parlamento estadual pela primeira vez de 1982, quando foi o mais jovem parlamentar do Brasil. Em seguida, foi eleito deputado federal constituinte e depois voltou a ser deputado estadual até 2011. Entre 2011 e 2014 exerceu o cargo de secretario de esportes do Estado do Maranhão.

Cinema, esportes, culinária, literatura e artes de um modo geral estão entre as predileções de Joaquim Haickel, quando não está na arena política, de onde não se afasta, mesmo que tenha optado por não mais disputar mandato eletivo.

Cinéfilo inveterado, é autor do filme “Pelo Ouvido”, grande sucesso de 2008. Sua paixão pelo cinema fez com desenvolvesse juntamente com um grupo de colaboradores um projeto que visa resgatar e preservar a memória maranhense através do audiovisual.

Enquanto produz e dirigi filmes, Joaquim continua a escrever um livro sobre cinema e psicanálise, que, segundo ele, “se conseguir concluí-lo”, será sua obra definitiva.

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