Mataram Chico Galalau.

Outro dia um amigo meu me ligou para me contar que mataram o Chico Galalau.

Galalau era fazendeiro na região de Bacabal. Um homenzarrão imenso, mais alto que eu. Devia ter mais de um metro e noventa. Não chegava a ser gordo, mas era parrudo proporcionalmente a sua altura o suficiente para respaldar sua fama de brabo. O homem tinha uma mão cujo palmo se aproximava dos trinta e cinco centímetros.

Como já disse Chico tinha fama de brabo, de violento. Não sei dizer ao certo se essa fama era fruto de sua rudeza ou era proveniente de sua atividade de fazendeiro, pecuarista e dono de terras. Diziam que muito tempo atrás, ele apropriou-se de umas terras na região, mas ele me contou certa vez que “pelejava” contra um grupo de invasores de suas propriedades, que tudo indica, não eram poucas.

Conheci Chico na década de 80. Meu pai me apresentou a ele. Vinte e cinco anos atrás, ainda no auge dos problemas fundiários naquela região, a fama dos fazendeiros era a pior possível. Fama que nem sempre fazia jus à realidade. Uns eram bem melhores que lhes pintavam, outros bem piores. Acredito que Chico não era dos piores. Não sei ao certo se ele era realmente violento, mas que ele era bem brabo, isto ele era.

Em 1998 Chico me procurou dizendo não ter candidato a deputado estadual e que gostaria de votar em mim em Lago Verde, por saber que eu era “um cabra serio e cumpridor de compromisso”. Achei ótimo, estava precisando de apoio eleitoral e ainda mais assim, de forma espontânea.

Ele só me exigia uma coisa, queria que eu, depois de eleito, o apoiasse pra prefeito, coisa que fiz em 2000, mas ele não se elegeu. Chico não se elegeria. Era uma pessoa muito admirada, amada mesmo, por alguns, mas que causava medo em um outro tanto e era rejeitado, chegava a ser odiado por outros.

Numa das vezes que fui a sua casa, em Lago Verde, pude ver uma multidão de pessoas, principalmente mulheres para quem ele era uma espécie de pai, um benfeitor. Uma delas, me abraçando disse que se eu era o candidato de Chico Galalau era porque eu era uma pessoa “direita e de confiança, porque cumpade Chico não anda com gente safada”.

E foram grandes as demonstrações de carinho e respeito que vi e comprovei, daquela boa gente para com Chico Galalau. Mas ele não conseguiria jamais ser prefeito, nem mesmo ser político ele poderia ser. Era um grande benfeitor e padrinho para alguns, mas era só o que ele conseguiria ser.

Para ser político, um bom político, a criatura tem que ser de uma variedade diferente de ser humano. Tem que ter o estomago fortíssimo ou não tê-lo; Tem que ter sangue frio ou quentíssimo, mas quando assim o for tem que trazer de fabrica um opcional raríssimo em seres humanos. Uma espécie radiador para refrigerar as tensões. Alguns conseguem desenvolver um tipo hibrido de radiador, mas isso demanda tempo; Tem que ter inteligência, e isso não é difícil de ter. Todos tem, uns mais outros menos, mas de um jeito ou de outro todos tem; Seria muito bom que se tivesse cultura, conhecimento, historicidade. Aqui a coisa pega. Itenzinho difícil de adquirir é esse. Há grande escassez no mercado; Têm que ser sábio como os mais velhos, impetuoso como os adolescentes e inocentes como os recém nascidos; Tem que de um lado equilibrar sensibilidade e humildade e de outro aspereza e destemor sem que seja ou pareça fraco ou arrogante; Tem que ser consciente de seu lugar e de seu papel; Tem que ter bom senso, agir com coerência e saber as conseqüências de suas ações ou omissões… Ta vendo, ser político não é assim facinho como muita gente imagina que seja. Pode até ser que alguém se eleja e até se reeleja deputado, por exemplo, daí a ele vir realmente a ser um bom político, isto já é uma outra historia.

Mas eu estava falando de Chico Galalau. Chico foi assassinado a bala. Roubaram duas vacas dele e ao dar parte na delegacia indicou um suspeito e disse ao tal que ele teria dois dias para devolver-lhe o gado, “porque senão…”. Tempos atrás, haviam roubado vinte cabeças de seu gado e Chico pouco se importou. Foi atrás, mas deu as reses por perdido e pronto. Dessa vez ele resolveu encrencar por causa de duas.

Essa é outra qualidade que deve ter, não só o bom político, mas todos as pessoas. Chico padeceu por não ter essa habilidade. Engolia um elefante, mas engasgava-se com um mosquito.

Quem for incapaz que degluta essa metáfora. Os capazes, a degustarão.

Perfil

“Poeta, contista e cronista, que, quando sobra tempo, também é deputado”. Era essa a maneira como Joaquim Elias Nagib Pinto Haickel aparecia no expediente da revista cultural Guarnicê, da qual foi o principal artífice. Mais de três décadas depois disso, o não mais, porem eterno parlamentar, ainda sem as sobras do tempo, permanece cronista, contista e poeta, além de cineasta.

Advogado, Joaquim Haickel foi eleito para o parlamento estadual pela primeira vez de 1982, quando foi o mais jovem parlamentar do Brasil. Em seguida, foi eleito deputado federal constituinte e depois voltou a ser deputado estadual até 2011. Entre 2011 e 2014 exerceu o cargo de secretario de esportes do Estado do Maranhão.

Cinema, esportes, culinária, literatura e artes de um modo geral estão entre as predileções de Joaquim Haickel, quando não está na arena política, de onde não se afasta, mesmo que tenha optado por não mais disputar mandato eletivo.

Cinéfilo inveterado, é autor do filme “Pelo Ouvido”, grande sucesso de 2008. Sua paixão pelo cinema fez com desenvolvesse juntamente com um grupo de colaboradores um projeto que visa resgatar e preservar a memória maranhense através do audiovisual.

Enquanto produz e dirigi filmes, Joaquim continua a escrever um livro sobre cinema e psicanálise, que, segundo ele, “se conseguir concluí-lo”, será sua obra definitiva.

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