O gado ou o carrapato!

Passeando, como sempre faço pelo menos uma vez por dia, pelos blogs que mais me interessam, li um texto que me chamou bastante à atenção. Décio Sá escreveu sobre uma conversa que ele teve com o meu dileto amigo José Cláudio Pavão Santana, falava sobre a polêmica em torno do voto secreto, assunto sobre o qual eu já vinha querendo escrever faz um bom tempo. Então resolvi me antecipar, antes do professor Zé Cláudio esgotar o assunto em um artigo que como ele disse, deverá publicar em breve, e eu fiquei sem ter nada a dizer ou nem sequer o que acrescentar em relação a esse assunto.

Não será apenas a voz de Zé Cláudio que se levantará para defender o voto secreto, disso eu tenho certeza. Eu também defendo e defenderei a idéia de que o voto secreto deva ser usado para algumas votações. Tenho certeza também que não serão apenas a minha voz e a de Zé Cláudio que se levantará em defesa desse dispositivo constitucional que o oportunismo de uns e a fraqueza de outros pretende abolir.

A Constituição Federal prevê que o voto dos deputados e senadores será secreto para aprovar a escolha de magistrados e de titulares de alguns cargos públicos; para aprovar a indicação de chefes de missão diplomática em caráter permanente; para aprovar a exoneração “de ofício”, do procurador geral da República; para resolver sobre a prisão em flagrante e a formação da culpa no caso de crime inafiançável praticado por membro do Congresso Nacional; para decidir pela perda do mandado do deputado ou senador; e decidir sobre a derrubada de veto do presidente da República a projeto de lei aprovado pelo Congresso Nacional. Com essa redação eu não só concordo plenamente, como a defendo com unhas e dentes.

Sou a favor do voto secreto nestes casos específicos. Não sou a favor do acobertamento do voto ou da fuga do debate. Entendo que nos casos citados anteriormente, deputados e senadores, e analogicamente onde couber, os membros dos legislativos estaduais e municipais, precisam da devida salvaguarda contra as pressões que poderiam lhes retirar a liberdade de votar segundo sua consciência e preferência.

O instituto do voto secreto é a materialização do anseio mais democrático, do ponto de vista do votante, seja ele quem for. Anseio de tomar uma decisão sem ser pressionado, sem ser admoestado. O voto aberto no Legislativo, para os que não conhecem o funcionamento dos meandros do sistema, é sem dúvida, aparentemente, mais democrático. Mas só aparentemente. Ele que em tese permite o controle do eleitor sobre seu representante, deixa o parlamentar exposto a um controle e às vezes até mesmo à manipulação por parte do Poder Executivo, que geralmente é mais interessado nas decisões do Legislativo, frequentemente por motivos alheios aos interesses do povo. Controle que é muito mais efetivo por parte do Executivo do que por parte do povo.

Vou tentar explicar e defender meu ponto de vista através de uma parábola. Imaginem só uma região onde a pecuária seja a principal atividade econômica e que esta região foi atingida por uma epidemia de carrapato. Um proprietário de uma das fazendas, a menor e menos produtiva, a mais fraca e menos competitiva, resolve então que só há uma saída para tamanha crise e diz a célebre frase: “Temos que sacrificar todo o rebanho para acabar com esta peste de carrapatos”.

Ora meus amigos, abolir o voto secreto é querer matar o gado, aqui representando o estado de direito, a democracia, e não combater a peste de carrapato, que nesse caso representa a corrupção e o desvio de função e conduta. Com uma coisa dessa eu não devo e nem posso concordar de modo algum.

Quanto ao fato de existir a possibilidade de haver uma sessão deliberativa secreta, isso sim é um absurdo. As sessões têm que ser públicas. O Legislativo tem que proceder abertamente. Quem tem que resguardar suas posições é o parlamentar e para isso basta garantir-se o voto secreto, livre de pressão indevida, mas a sessão em que ele exerce seu voto deve ser aberta. Não há nenhum motivo válido, lógica ou mesmo processualmente falando, de realizar-se uma votação que já é secreta em uma sessão de portas fechadas. Neste ponto o regimento do Senado Federal excede-se, e nisso deve ser corrigido.

10 comentários em “O gado ou o carrapato!”

  1. José Carlos Soares

    Você é um perigo! Eu que sou totalmente favorável ao voto aberto para toda e qualquer votação, em todas as três esferas do poder legislativo, confesso que depois dessa sua explicação tão objetiva e lúcida, fiquei completamente em duvida! Esse é realmente um assunto que deve ser muito bem estudado e discutido, e você é um bom interlocutor.

  2. As vaquinhas e os boizinhos agradeçem…hehe, afinal, carrapato se mata com veneno e jamais deixarão de existir, já os bichinhos…até que são bonzinhos, quando querem, é claro!! kkk…
    Vc como sempre é surpreendente! É a única pessoa capaz de levantar uma bandeira dessas sem ser “avacalhado” pelas pessoas, sabe pq? Pq vc é sinônimo de respeito e confiabilidade, todos conhecem seu caráter transparente, as pessoas aprenderam a te admirar pela sua coragem de fazer política de forma simples, verdadeira, com objetivos concretos e de suma importância. Já li varias vezes, comentários dizendo “vc é demais”, “vc é o máximo”, “vc é polêmico”, e por aí vai….mas sabe, vc não é nada disso, vc é J.H., único capaz de mudar pensamentos, transformar estórias em histórias, criar anseios,simplificar teorias e desvendar os mistérios que a vida nos reserva….
    “Seu MONTEIRO” que me perdoe, mas é impossível ser diferente!!!
    Bjossssss

    Resposta: Poxa, não sei nem o que dizer, mas muito obrigado!

  3. Saiu pesquisa. Precisamos de sua análise. Ah…Edilvaldo H. Jr e Cleber Verde nçao foram colocados na pesquisa.
    Abração

    Resposta: Acredito que o Edivaldo Holanda Junior não seja candidato a prefeito. Quanto ao Cleber Verde, mesmo não aparecendo, ele tem mais votos que alguns que aparecem nessa pesquisa.

  4. Explica mas não justifica. O voto secreto entre pares, na maioria das vezes, serve ao conchavo e a proteção de apaniguados nos subterrâneos do poder. É só olhar o recente caso de Renan, o Brasil, a opinião pública, outras instituições sérias queriam a cassação, mas ele foi protegido pelo véu obscuro das negociatas e do voto secreto. Se fôssemos representados por pessoas cem por cento honestas vá lá, mas não é o que acontece na maioria das vêzes…

    Resposta: Não é porque as vezes isso não aconteça que vamos mudar uma lei boa. Que os eleitores aprendam a votar e elejam mais parlamentares de boa qualidade. Lembre-se do carrapato. Elimine o causador do problema, não o seu meio-ambiente.

  5. Concordo e descordo com vc. Quando caiu o Muro de Berlim, os sábios disseram que com ele ruíam as ideologias, como se o espaço das idéias estivesse extinto. De uns anos para cá, investem contra a política como se fosse o pior dos males do planeta. Mas a política é inerente à atividade humana, da mesma forma que o poder se impõem em todos os quadrantes, instâncias e situações, graúdas e miúdas.Uma coisa é a política, outra a politicagem. Você tem plena ciência que os politiqueiros são infinitamente mais numerosos do que os políticos. Sou absolutamente contra o voto secreto, pq justamente protege os politiqueiros de plantão. No caso específico do Renan,falou mais alto o corporativismo do Senado, uma casa de comadres e compadres, cheia de salamaleques, onde os ódios são depurados em trocas formais de gentileza. Voto secreto é brincar com a inteligencia e o verdadeiro dono do poder, legitimado constitucionalmente no art 1, paragrafo único da CF: O povo.

  6. Joaquim Nagib Haickel

    Resposta ao “seu” Monteiro: O voto aberto não vai expor os politiqueiros. Politiqueiro não tem medo de se expor. Mas o fim do voto secreto para alguns casos, vai fragilizar a democracia e desproteger os bons políticos, que ficaram a mercê do poder executivo.
    Não precisa acreditar em mim, pesquise, estude e informe-se sobre esse tema, você vai ver que eu tenho razão. Se não quiser acreditar em mim, tudo bem, pergunte, por exemplo, para o deputado Flavio Dino, um de nossos melhores parlamentares, o que ele acha dessa polemica sobre a forma de votação.

  7. Seria muito bom que outros políticos dissessem o que pensam de determinados assuntos da mesma forma como faz o deputado Joaquim Haickel. Pode quem quiser discordar dele, assim como eu faço, de vez em quando, mas não se pode dizer que ele não se posiciona e o que é melhor, trás sempre para o debate temas muito importantes.

  8. Não votei no senhor nem na sua candidata ao governo mas tenho que reconhecer que o senhor tem muita coragem em assumir as posições que assume, em defender as idéias que defende.

    Resposta: Não sou mais corajoso que ninguém. Como disse certa fez um amigo, sou coerente e coerência em determinados casos parece coragem. De qualquer modo, e principalmente por você não ter votado em mim, muito obrigado por suas palavras.

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Perfil

“Poeta, contista e cronista, que, quando sobra tempo, também é deputado”. Era essa a maneira como Joaquim Elias Nagib Pinto Haickel aparecia no expediente da revista cultural Guarnicê, da qual foi o principal artífice. Mais de três décadas depois disso, o não mais, porem eterno parlamentar, ainda sem as sobras do tempo, permanece cronista, contista e poeta, além de cineasta.

Advogado, Joaquim Haickel foi eleito para o parlamento estadual pela primeira vez de 1982, quando foi o mais jovem parlamentar do Brasil. Em seguida, foi eleito deputado federal constituinte e depois voltou a ser deputado estadual até 2011. Entre 2011 e 2014 exerceu o cargo de secretario de esportes do Estado do Maranhão.

Cinema, esportes, culinária, literatura e artes de um modo geral estão entre as predileções de Joaquim Haickel, quando não está na arena política, de onde não se afasta, mesmo que tenha optado por não mais disputar mandato eletivo.

Cinéfilo inveterado, é autor do filme “Pelo Ouvido”, grande sucesso de 2008. Sua paixão pelo cinema fez com desenvolvesse juntamente com um grupo de colaboradores um projeto que visa resgatar e preservar a memória maranhense através do audiovisual.

Enquanto produz e dirigi filmes, Joaquim continua a escrever um livro sobre cinema e psicanálise, que, segundo ele, “se conseguir concluí-lo”, será sua obra definitiva.

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