Sinal dos tempos
O sentimento que mais me emociona é a amizade. Não que o amor não seja sublime, ele o é, mas a amizade cristaliza em si outros sentimentos de maneira mais efetiva e contundente que o amor.
A amizade amplifica e consolida o respeito de maneira única, descomprometida e descompromissada, de tal forma que os laços existentes entre pessoas que são realmente amigas se fortalecem, mesmo que elas discordem em um ou em outro assunto.
Poderia falar do grande número de amigos flamenguistas e botafoguenses que tem esse vascaíno aqui. Ou dos corintianos e palmeirenses que discordam do sanpaulino que sou. Depois das partidas de futebol, quem tiver suas derrotas pra chorar que chore, e mesmo que se tenha que aturar alguns desaforos naturais dessas manifestações, quase sempre vindas urubus e porcos, quando se precisa realmente deles, eles estão conosco.
Poderia falar de amigos que professam fé religiosa diferente da minha. É difícil encontrar alguém que pense exatamente como eu no que diz respeito a esse assunto. Mas mesmo assim mantenho estreitos laços de amizade com pessoas das mais diversas denominações, de mulçumanos a judeus, passando por budistas, hinduístas e cristão de todos os matizes.
Em minha concepção de vida, as nossas diferenças servem para valorizar mais as nossas semelhanças, prática sedimentada sobre o fértil terreno da tolerância, sentimento que se prolifera em profusão e abundância no âmbito da amizade.
Poderia falar dos amigos que tenho em outras trincheiras político-partidário-ideológicas. Pessoas de quem discordo quanto ao que, ao como, ao quando e principalmente a quem.
No entanto, existem amigos vascaínos, agnósticos e peemedebistas de quem eu sou muito mais distante, menos identificado, que com alguns flamenguistas (arg!), mórmons (ui!) e comunistas (ai!). Brincadeirinha! Mas é verdade, existem pessoas distantes com quem concordo bem mais do que com gente bem mais próxima de mim.
Faço todo esse preâmbulo só para falar do falecimento de Rosalino Lima da Silva, “Seu” Rosa para os íntimos, ex-prefeito e o eterno grande líder de Altamira do Maranhão, cidade localizada na região do Médio Mearim, que conta com uma população de aproximadamente 7.500 habitantes e tem cerca de 220 quilômetros quadrados de área.
Rosalino, homem humilde e simples, mas muito rico, era um dos maiores criadores de gado do estado, liderava um grupo político que governou Altamira por 20 anos. Tinha e acredito que mesmo agora, continuará tendo uma legião de amigos que o seguia cegamente, pelo muito que fez por eles.
Faço política em Altamira desde 1982, quando me elegi pela primeira vez deputado estadual, sempre apoiado por Zeca Brás, adversário político de “Seu” Rosa, o que me fez também seu adversário durante todo esse tempo.
Acontece que uma coisa unia Zeca Brás e eu a Rosalino. O respeito que se deve ter pelas pessoas, independente de que sejam elas, amigos ou adversários. O respeito foi criando entre nós uma forte admiração e esta por sua vez foi arraigando uma amizade que se estendeu para sua esposa, suas filhas e seu genro, tanto que nas próximas eleições ele estava decidido a votar em mim. Eu que fui seu adversário nos últimos 28 anos, iria dessa vez merecer seu apoio.
Recentemente estive na casa de Rosalino, juntamente com sua família e pude sentir o carinho deles para comigo. Era algo desinteressado, gratuito, espontâneo. Foi uma das melhores sensações que eu experimentei nessa minha longa vida política, tão movimentada.
Eu seria apoiado por um adversário que reconhecia em mim o melhor candidato para defender os interesses de seus amigos e correligionários.
No entanto duas fatalidades se impuseram. A primeira foi o fato de eu ter resolvido não me candidatar nas próximas eleições e a segunda a morte de Rosalino no dia 1° de maio último, em Recife.
Quando soube da morte de Rosalino senti como se tivesse perdido um amigo muito chegado, como se ele fosse alguém com quem eu convivesse diariamente, pois ele havia me dado um crédito imensamente grande, muito maior do que o crédito que me é dado por aqueles que, muito mais poderosos que Rosalino, convivem comigo há décadas.
À Dona Teresinha, Lidce, Ludmila, dr. Miranda, e aos demais familiares e amigos de “Seu” Rosa, todo o meu respeito. Saibam que ter sido adversário de Rosalino engrandeceu o meu currículo. Ser seu amigo fez com que esse mesmo currículo ficasse diferenciado, pois poucos são os políticos que podem dizer que tem o respeito e a amizade de quem em uma ou outra situação diverge dele.
PS: Apenas para registrar: em duas ocasiões tive grandes perdas que de certa forma serviram para galvanizar as decisões que tinha que tomar. Com o falecimento de meu pai, em setembro de 1993, resolvi que não seria candidato em 94, pois queria organizar a vida de nossa família. Nos últimos seis meses, em sequência, morreram meu fiel escudeiro Moraes Neto, minha querida amiga Cleonice Rodrigues, de Vitorino Freire, meu amigo Jair Andrade, de São Domingos, e mais recentemente Rosalino Lima. Triste sinal dos tempos mostrando que fiz a escolha correta.
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