A Direita e a Esquerda

Dia desses estava conversando com dois bons amigos meus, um que se diz de esquerda e outro que se assume de direita e pude constatar que eles têm sérios e fortes dilemas sobre essa dicotomia, pois não conseguem entender as nuances e diferenças que existem entre uns e outros posicionamentos circunstanciais da política, nem aceitar as idiossincrasias consequentes destas posições.

Os jovens sempre foram levados a pensar que bonito é ser de esquerda, que esta posição é mais nobre que a outra, que há mais verdade deste lado. Os mais velhos são guinados a se posicionar à direita do cenário, pois o tempo e a experiência os fazem mais ponderados.

Naquele dia a discussão ficou acalorada e os dois se exaltaram a ponto de se alfinetarem. Imagino que muita gente passe pela mesma dificuldade deles em entender claramente esse assunto.

Afinal, o que é ser de direita e de esquerda?

Para nos ajudar a entender se alguém é de esquerda ou de direita podemos usar uma questão simples do dia a dia, como a polêmica sobre o estabelecimento de cotas raciais em vagas nas universidades ou no serviço público, por exemplo. É claro que o resultado dessa análise não estabelece uma classificação rígida – você pode concordar com algumas propostas e posicionamentos de esquerda e também concordar com outras de direita e vice-versa, mas estas são pistas muito esclarecedoras sobre o projeto de sociedade defendido por alguém de um ou de outro lado.

Saber o que significa ser de esquerda ou de direita é importante para que façamos nossas escolhas políticas com consciência. Identificar o posicionamento político de alguém ou de nós mesmos é muito mais complexo do que a mera observação de sua condição social, como se aqueles que têm uma boa situação financeira fossem necessariamente de direita e aqueles que vivem menos confortavelmente fossem necessariamente de esquerda.

Vejamos algumas situações que segundo os teóricos definem os posicionamentos de cada um dos lados.

Você será qualificado como sendo de esquerda se for a favor da inclusão social; caso acredite que todos devem ter acesso às oportunidades, independentemente da classe social ou nível de riqueza; for a favor da distribuição de renda; se acreditar que deva se distribuir o dinheiro público entre todas as pessoas; for a favor de serviços públicos bons e acessíveis a todos, de forma gratuita ou subvencionada. Se for a favor de educação e de saúde gratuita pra todo mundo; for a favor de uma reforma agrária radical, inclusive em terras que estejam produzindo; for a favor da defesa intransigente do meio ambiente, de tal modo que se oponha a qualquer projeto de desenvolvimento que agrida o meio ambiente; for a favor da descriminalização do uso da maconha e do aborto…

Você será tido como de direita, se for a favor da livre empresa, do acúmulo de capital; se for a favor de que as pessoas possam ficar ricas conforme sua honesta capacidade para assim o ser; for a favor da meritocracia e do livre comércio; for a favor de que as pessoas tenham acesso a emprego e renda e ao sucesso financeiro, sem a intervenção direta do poder público; caso seja a favor da desestatização, de serviços oferecidos por empresas privadas, de que o estado não seja operador nem administrador dos serviços que devam estar à disposição dos cidadãos, apenas sendo o poder público seu fiscalizador; for a favor da reforma agrária, mas apenas em terras ainda não cultivadas ou destinadas especificamente para esse fim; for a favor de regulamentos que possibilitem haver desenvolvimento, mesmo tendo que agredir um pouco o meio ambiente, destinando compensações para que isso aconteça; for contra a liberação do uso da maconha e o aborto…

Não se assuste se você descobrir que é a favor de coisas que o tornam uma pessoa de esquerda, ao mesmo tempo em que o classificam como sendo de direita. É que os itens que estabelecem essas posições nada mais são do que formas e caminhos para que atinjamos a tão sonhada felicidade e tudo o que é necessário para realizar os ideais de paz e justiça social. Você e eu podemos trilhar esses caminhos livremente, usando os da esquerda e os da direita. Os políticos não…

Esquerda e direita, por si só, não são partidos políticos. São as ideias que determinam se eles são de esquerda ou de direita. A maioria de nós não sabe o que é isso e saber realmente acrescenta muito pouco no final das contas.

Nos Estados Unidos da América, uma das maiores e mais sólidas democracias do planeta, uma nação poderosa composta por uma sociedade bem alicerçada, o que as pessoas querem? Elas querem ser bem lideradas, querem suas disputas resolvidas, seus acordos respeitados, seus trabalhos garantidos, seus criminosos punidos. Querem suas vidas regulares e regularizadas. Quem as lidera no sentido de que consigam o que desejam e precisam, ganha o poder. Isso é a democracia, um pacto, tácito e elementar.

Lá existem muitos partidos, mas apenas dois são realmente importantes. Mesmo assim, eles têm uma das mais poderosas e estáveis democracias do mundo. De um lado, os Democratas, que pelas avaliações citadas anteriormente é um partido de esquerda, e do outro o Partido Republicano que por esses mesmos parâmetros é de direita.

Acontece que eles são tão parecidos que muito pouca coisa é visível para a grande maioria da população americana. Para nós, estrangeiros, são poucos os que conseguem entender como é possível haver tanta disputa com tanta semelhança entre suas ideologias e seus dois partidos.

Existem outras coisas que são muito mais importantes para a definição de nosso posicionamento, não só político no sentido estrito, partidário, mas em lato sensu, para que você possa saber como se relacionar com a sociedade e como ela interfere na sua vida, na de sua família e de todos nós. Entre estas coisas está o bom senso, o discernimento. Isso é mais importante que qualquer argumento político.

Não importa se você ou eu sejamos de direita ou de esquerda. O que realmente importa é que ficando de um lado ou de outro, busquemos os caminhos que nos levem verdadeiramente a dias melhores, não importando se eles estão nessa ou naquela latitude. O que importa é que eles sejam reais, verdadeiros, que não sejam meras plataformas de campanha eleitoral.

 

 

 

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Perfil

“Poeta, contista e cronista, que, quando sobra tempo, também é deputado”. Era essa a maneira como Joaquim Elias Nagib Pinto Haickel aparecia no expediente da revista cultural Guarnicê, da qual foi o principal artífice. Mais de três décadas depois disso, o não mais, porem eterno parlamentar, ainda sem as sobras do tempo, permanece cronista, contista e poeta, além de cineasta.

Advogado, Joaquim Haickel foi eleito para o parlamento estadual pela primeira vez de 1982, quando foi o mais jovem parlamentar do Brasil. Em seguida, foi eleito deputado federal constituinte e depois voltou a ser deputado estadual até 2011. Entre 2011 e 2014 exerceu o cargo de secretario de esportes do Estado do Maranhão.

Cinema, esportes, culinária, literatura e artes de um modo geral estão entre as predileções de Joaquim Haickel, quando não está na arena política, de onde não se afasta, mesmo que tenha optado por não mais disputar mandato eletivo.

Cinéfilo inveterado, é autor do filme “Pelo Ouvido”, grande sucesso de 2008. Sua paixão pelo cinema fez com desenvolvesse juntamente com um grupo de colaboradores um projeto que visa resgatar e preservar a memória maranhense através do audiovisual.

Enquanto produz e dirigi filmes, Joaquim continua a escrever um livro sobre cinema e psicanálise, que, segundo ele, “se conseguir concluí-lo”, será sua obra definitiva.

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