Sensação de dever cumprido

Mais abaixo vou reproduzir para você, que me lê agora, uma mensagem que recebi recentemente, via WhatsApp, de um grande e querido amigo meu, Vadequinho.

Para quem não sabe, nós a chamamos de Vadequinho por ele ser filho de “seu” Vadeco, que foi diretor do Grêmio Lítero Recreativo Português e do Maranhão Atlético Clube e que fez história em nossa cidade, no tempo em que ela ainda tinha menos de meio milhão de habitantes.

Conheci Vadequinho quando, oriundo da secretaria de Assuntos Políticos no governo Lobão, fui nomeado para secretaria de Educação, no governo Fiquene, em 1994. Vadequinho era chefe da assessoria jurídica da SEDUC, e logo ficamos amigos, principalmente por ter reconhecido nele uma pessoa séria, um funcionário público correto, um amigo leal e um grande conhecedor do caráter e da alma humana. É verdade que ele é um pouco zangado, mas apenas com quem merece, coisa que para mim era primordial, devido a meu temperamento parcimonioso e contemporizador. Minha parceria com ele se tornou perfeita, pois fazíamos bem os papeis daqueles estereotípicos policiais americanos, o bonzinho e o malvadão. Eu era o bonzinho, até porque era eu quem tinha ambições políticas e eleitorais.

Waldimir Costa de Jesus Filho é o nome de batismo de Vadequinho, que durante vinte anos, entre 1994 e 2014, ficou conhecido também como “Senhor Vadeco, o cão de guarda do deputado Joaquim Haickel”.

Todo político, todo agente público deveria ter um Vadequinho, tanto como colaborador quanto como amigo.

Como colaborador Vadequinho era ao mesmo tempo a segunda e a última linha de operação de meu gabinete. A pessoa era recebida na recepção e encaminhada a ele, que filtrava os assuntos e os trazia para mim, qualquer que fosse a natureza dele e eu decidia o que fazer. Caso fossem necessárias mais ações em referência ao assunto, eu pedia que Vadequinho acompanhasse o desenrolar e me mantivesse informado.

Eu e Vadequinho desenvolvemos um sistema que depois de algum tempo passou a funcionar como uma orquestra sinfônica, cujo maestro era eu e ele era o pianista ou o primeiro violino, ou o solista, qualquer que fosse o instrumento. Ele só não poderia ser designado para alguma tarefa política propriamente dita, pois ele não suportava as tolices e asneiras das pessoas nesse setor.

O certo é que Vadequinho muitas vezes era tido como “Deputado”. Tudo bem que ele não pudesse entrar no plenário, fazer discursos, propor leis ou votá-las, mas quase todo o resto ele fazia.

Depois que deixei de ser deputado, fui praticamente obrigado a aceitar o cargo de Secretário de Esportes e Lazer, e na SEDEL meu adjunto era Alim Neto, responsável por toda parte esportiva da secretaria, Monica Gobel era responsável por toda a parte administrativa e financeira e Vadequinho era responsável pelo funcionamento do gabinete do secretário, trazendo tudo para mim só no ponto de eu finalmente decidir e assinar ou não (Durante os 20 anos que trabalhamos juntos, eu só assinei um papel, qualquer que fosse ele, depois de passar pelo crivo de Vadequinho). Essa equipe funcionou durante quatro anos, com quase nenhum recurso financeiro e sem nenhuma força política, mas funcionou muito bem.

Quando em 2020, Eduardo Braide me convidou para ser Secretário de Comunicação da Prefeitura de São Luís, os primeiros dois nomes que pensei para me ajudar nessa tarefa foram os de Vadequinho e Mônica. Ambos recusaram.

Mas voltemos a mensagem que Vadequinho me enviou:

“Depois de um longo e tenebroso inverno, eu e Rosa fomos a um arraial de São João, e o escolhido foi o do Ipem. Achei tudo lindo. Ficamos maravilhados. Tudo perfeito e uma multidão radiante com o evento. Mas uma coisa me chamou atenção logo na entrada. Vi que mais uma vez, e isso já acontece desde 2012, portanto há 10 anos, o São João, assim como o Carnaval e todos os eventos culturais e esportivos, como construção de campos de futebol e quadras polivalentes, festivais de música e shows por todo o Maranhão, só acontecem por causa das leis que você idealizou, construiu, propôs e aprovou na Assembleia legislativa: As Leis de Incentivo à Cultura e ao Esporte, que por minhas contas, juntas já injetaram nestes setores, aproximadamente 1 bilhão de reais em 10 anos. Você deveria se sentir orgulhoso, pois eu me sinto por ter participado dos trabalhos que desenvolveram e criaram tais leis, que em minha opinião são os sustentáculos da cultura e do esporte do Maranhão. Sem elas não teríamos atividades nestes setores. A cultura e o esporte de nosso estado devem muito a você e não vejo ninguém reconhecer isso. Mas a vida é assim mesmo. Te conheço, sei que sentes orgulho do trabalho que realizamos e sei que só isso já te satisfaz. Grande abraço, do teu amigo e irmão, Vadeco”.

Enquanto lia a mensagem de Vadequinho, fui me emocionando, minha garganta travou, comecei a chorar miudinho e depois tive um acesso de riso, que voltou a se misturar a um choro emocionado, até que fui me acalmando.

Dias depois eu fui ao Arraial do Ipem, pois minha esposa Jacira queria ver o Boi Pirilampo e tomar mingau de milho. Logo na entrada vi as logomarcas da Equatorial, do Mateus e da Cola Jesus, junto da marca do Governo do Estado e imediatamente me lembrei de Vadequinho, e do orgulho dele e do meu, por aquilo tudo estar acontecendo, pelo menos em parte, por um trabalho que realizamos, já faz 10 anos.

A sensação do dever cumprido, é uma das melhores sensações que uma pessoa pode sentir.

1 comentário em “Sensação de dever cumprido”

  1. Francisco Barbosa

    Boa noite, Joackim.

    Como de costume, de forma até religiosa, li mais um de seus ricos e doces textos, digo isso, não por afago, mas como reconhecimento da realidade.

    É pena que nem todo homem possui um “Vadequinho” como fiel escudeiro durante a vida pessoal e profissional. Tive uma reminiscência fortíssima na parte que citastes o Grêmio Lítero Português, lugar que visitei algumas vezes durante a minha infância. Lugar tão relevante que o Josué Montello, como grande patriota que fora, o citou no romance o Largo do Desterro, quando já nas últimas páginas, a Tininha sugere ao Major Taborda que vá ao Lítero Português em detrimento de não querer a sua companhia quando pretendia ir às compras na rua grande.

    Grande abraço!

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Perfil

“Poeta, contista e cronista, que, quando sobra tempo, também é deputado”. Era essa a maneira como Joaquim Elias Nagib Pinto Haickel aparecia no expediente da revista cultural Guarnicê, da qual foi o principal artífice. Mais de três décadas depois disso, o não mais, porem eterno parlamentar, ainda sem as sobras do tempo, permanece cronista, contista e poeta, além de cineasta.

Advogado, Joaquim Haickel foi eleito para o parlamento estadual pela primeira vez de 1982, quando foi o mais jovem parlamentar do Brasil. Em seguida, foi eleito deputado federal constituinte e depois voltou a ser deputado estadual até 2011. Entre 2011 e 2014 exerceu o cargo de secretario de esportes do Estado do Maranhão.

Cinema, esportes, culinária, literatura e artes de um modo geral estão entre as predileções de Joaquim Haickel, quando não está na arena política, de onde não se afasta, mesmo que tenha optado por não mais disputar mandato eletivo.

Cinéfilo inveterado, é autor do filme “Pelo Ouvido”, grande sucesso de 2008. Sua paixão pelo cinema fez com desenvolvesse juntamente com um grupo de colaboradores um projeto que visa resgatar e preservar a memória maranhense através do audiovisual.

Enquanto produz e dirigi filmes, Joaquim continua a escrever um livro sobre cinema e psicanálise, que, segundo ele, “se conseguir concluí-lo”, será sua obra definitiva.

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