O mundo dá voltas

Tenho a honra de ostentar em meu modesto currículo o fato de ter sido um dos deputados federais constituintes que ajudaram a elaborar a nossa Carta Magna, essa mesma que anda sendo tão vilipendiada hoje em dia.

Durante os trabalhos da ANC, entre 1987 e 1988, eu integrei na qualidade de membro titular, a Subcomissão dos Direitos e Garantias Individuais, vinculada à Comissão da Soberania e dos Direitos e Garantias do Homem e da Mulher.

Essa subcomissão foi responsável por discutir e elaborar propostas relacionadas aos direitos e garantias individuais que seriam incorporadas na nossa Constituição, e uma de minhas missões foi auxiliar o relator daquela subcomissão, o deputado Darcy Pozza, no tocante ao projeto que propunha a instauração da pena de morte em nosso país. Durante aquele trabalho acabei fazendo muitos amigos, entre eles, o deputado Fernando Gasparian do PMDB-de SP.

Cid Carvalho, deputado pelo Maranhão, assim como eu, havia comentado com Gasparian, de quem era amigo, que eu tivera uma revista, a “Guarnicê” e que tinha uma pequena e deficitária editora de livros, ramo de atividade da qual ele era oriundo, e por isso ficamos bem próximos.

Certa tarde o “Gaspa” me convidou para ir com ele até a Comissão de Ordem Social, mais especificamente na Subcomissão de Direitos e Garantias Individuais e Coletivos, para conhecer uma amiga sua, que estava prestando assessoria lá.

Antes de chegarmos, ele me disse de quem se tratava: “Joaquim, você vai conhecer a Eunice, uma mulher extraordinária que trabalha em defesa dos povos indígenas, mas além disso ela é viúva de Rubens Paiva e mãe de Marcelo Rubens Paiva.”

Eu sabia quem era Rubens Paiva e já havia lido o livro de Marcelo, agora iria conhecer a viúva de um e mãe do outro.

Conheci dona Eunice naquela tarde e pensei que nunca mais iria ouvir falar dela novamente, mas passados 36 anos de quando eu a conheci, voltei a encontrá-la como personagem central do filme “Ainda estou aqui”, do diretor Walter Sales.

Ocorre que eu fui indicado pela Academia Brasileira de Cinema como um de seus associados que teriam a missão de escolher o filme que iria representar o Brasil na disputa por uma indicação ao Oscar de melhor filme estrangeiro de 2025, e “Ainda estou aqui” era um dos concorrentes.

Na verdade, ressaltando todo o respeito que os outros onze filmes da lista de concorrentes merecem, preciso dizer que nenhum deles, nenhum dos filmes brasileiros que disputaram essa indicação, excetuando-se “Central do Brasil”, “Cidade de Deus” e “Tropa de Elite, estão no mesmo nível de ‘Ainda estou aqui”.

O trabalho do elenco, em especial o de Fernanda Torres, é extraordinário. A direção de arte, a direção de fotografia, o figurino e o roteiro são magníficos. E para coroar tudo isso, a maestria de Walter Sales é impecável, principalmente no que diz respeito a sua capacidade de fazer com que uma história tão dura e triste não desaguasse em um melodrama pesado e se tornasse mais um filme de mero apelo político.

“Ainda estou aqui” não é meramente um filme que fala de um difícil momento político de nossa história, ele fala da vida de uma família, dilacerada por aqueles acontecimentos, e é assim que ele deve ser visto e entendido.

Trinta e seis anos depois de ter sido apresentado formalmente a dona Eunice Paiva, eu fui apresentado a sua história. Bem que o “Gaspa” me disse que eu iria conhecer uma mulher extraordinária.

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Perfil

“Poeta, contista e cronista, que, quando sobra tempo, também é deputado”. Era essa a maneira como Joaquim Elias Nagib Pinto Haickel aparecia no expediente da revista cultural Guarnicê, da qual foi o principal artífice. Mais de três décadas depois disso, o não mais, porem eterno parlamentar, ainda sem as sobras do tempo, permanece cronista, contista e poeta, além de cineasta.

Advogado, Joaquim Haickel foi eleito para o parlamento estadual pela primeira vez de 1982, quando foi o mais jovem parlamentar do Brasil. Em seguida, foi eleito deputado federal constituinte e depois voltou a ser deputado estadual até 2011. Entre 2011 e 2014 exerceu o cargo de secretario de esportes do Estado do Maranhão.

Cinema, esportes, culinária, literatura e artes de um modo geral estão entre as predileções de Joaquim Haickel, quando não está na arena política, de onde não se afasta, mesmo que tenha optado por não mais disputar mandato eletivo.

Cinéfilo inveterado, é autor do filme “Pelo Ouvido”, grande sucesso de 2008. Sua paixão pelo cinema fez com desenvolvesse juntamente com um grupo de colaboradores um projeto que visa resgatar e preservar a memória maranhense através do audiovisual.

Enquanto produz e dirigi filmes, Joaquim continua a escrever um livro sobre cinema e psicanálise, que, segundo ele, “se conseguir concluí-lo”, será sua obra definitiva.

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