As metáforas da Rosa

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Poetas como Goethe e compositores como Schubert sempre sentiram atração pelas rosas. Quando Goethe escreveu algumas estrofes contando a história de um rapaz romântico conversando com uma rosa cheia de espinhos, Schubert colocou música e o resultado é uma obra-prima reconhecida no mundo inteiro.

Quando o alaudista John Dowland leu os sonetos de seu amigo William Shakespeare, ele tratou de cantá-los ao som do alaúde e o resultado até hoje encanta os interessados no gênero. Música e poesia sempre caminharam lado a lado. Flores e poesia também. Rosas e espinhos idem.

Não faz muito tempo, a Editora Melhoramentos lançou em edição de luxo o livro A linguagem das rosas, originalmente publicado na Inglaterra com uma seleção de poemas feita por Sheila Pickles. Para o Brasil, foram incluídos exemplos de poetas brasileiros e portugueses. O livro, impresso em Hong-Kong, traz ilustrações magníficas e até perfume de rosas.

A propósito disso, chego a pensar que na poesia e na história, muitas vezes rosas viram espinhos e pode acontecer também o contrário. Um exemplo: Voltaire, que transformou espinhos em metáfora, inventando o otimismo. Em Candide, ou L´Optmisme, sátira às doutrinas filosóficas de Pope e de Leibnitz, ele criou a palavra otimismo, e a definiu pela boca do seu herói, a quem o criado mestiço Cacambo pergunta que é que isso significava: C´est la rage de soutenir qu´on est bien quand tout est mal (É a teima de sustentar que se está bem quando tudo vai mal). O que nos possibilita pensar que a dor que nos causa os espinhos que a rosa tem só serve de incentivo ao triunfo do nosso otimismo.

Assim como a música e a poesia, rosas e otimismo andam juntas. A sabedoria popular inventou a expressão “banhar-se em águas de rosas”, que significa o estado de espírito da pessoa que se sente feliz, que obtém êxito em seus empreendimentos ou amores, a pessoa que conquista aplausos ou louvores, frui gozos e prazeres, ou obtém plena satisfação de alguma vaidade.

Na literatura há outras expressões consagradas. Diz-se, por exemplo, que uma coisa teve a duração das rosas de Malherbe quando durou muito pouco. Esta expressão tem origem numa poesia de François Malherbe, intitulada Consolação ao Sr. Du Périer, Gentil-homem de Aix-en-Provence, Pela Morte de Sua Filha, na qual se lê esta estrofe: Mas era ela do mundo onde as mais belas coisas/ Têm o pior destino; / E rosa ela viveu o que vivem as rosas,/ Uma breve manhã. Aqui a rosa é eterna, passageira. Parece importante, mas não é.

Tempos atrás escrevi um artigo sobre música e poesia, chamando a atenção para os verdadeiros poetas que são mestres em dizer coisas usando as diferentes formas da canção. O que se vê hoje são poetas que vão sendo substituídos pelos gênios da música. Letras que tornam palpáveis, através da música, as imagens dos poetas dos nossos dias.

No livro A linguagem das rosas, os poemas são assinados por Shakespeare, Camões, Shelley, Keats, Wordsworth, Alphonsus de Guimaraens, Castro Alves, Garret, Omar Khayyam e muitos outros figurões. Machado de Assis está presente com uma brilhante parábola. Mas faltou à coletânea o belo pensamento de Cartola – um dos nossos maiores compositores – em As rosas não falam: “Queixo-me às rosas/mas que bobagem/as rosas não falam/simplesmente as rosas exalam/o perfume que roubam de ti”.

Infelizmente apesar de toda beleza e do maravilhoso perfume as rosas possuem os famigerados e doloridos espinhos, quanto a mim só resta o otimismo e a poesia.

6 comentários para "As metáforas da Rosa"


  1. Anônimo

    Você é surpreendente!

  2. Carla Giulliana

    Querido Joaquim, você me surpreendeu também, mais uma vez.
    Este artigo é muito rico, citações interessantíssimas, repleto de mensagens secretas – metáforas – reflexões singelas, no entanto subjetivas, profundas…
    Andava mesmo refletindo sobre tudo que expões intensamente no artigo… Quanta riqueza de sugestões literárias, de forma leve, suave…

    Um homem de otimismo… Mas também um homem pleno de entusiasmo no sentido etimológico: “ter Deus dentro de si”. Creio que é o teu entusiasmo mais do que teu otimismo que o torna tão especial.
    Adorei. Lindo artigo. Prendeu minha atenção, tocou o coração.
    Abraços

    Carla Giulliana

  3. Aninha

    Como sempre Joaquim você foi Maravilhoso, você consegue enxergar as entrelinhas e isso é o que significam os espinhos das rosas, as entrelinhas, estão lá para nos fazer apreciar a maciez e o esplendor das pétalas.Para nos mostrar o valor que todas elas possuem afinal que valor daríamos as rosas se não tivessemos que enfrentar alguns espinhos por elas?
    Provavelmente nem sequer notaríamos como elas podem ser supreendentes revelações da expressão dos sentimentos(humanos e Divinos).
    Bjo Bom dia e boa semana p/ vc.

  4. Luis Antonio Marques

    Já tinha lido crônicas suas muito boas, mas confesso que esta mais que as outras, demonstra seu conhecimento e sua cultura e deixa clara a sua grande sensibilidade.
    Parabéns.

  5. Gustavo

    Mais interessante foi a situação que inspirou Cartola a compor “As rosas não falam”.
    Chegando em casa, numa quarta-feira de cinzas, após mais um carnaval ausente, Cartola encontrou a porta trancada, pois D. Zica havia decidido não mais permitir sua entrada.
    Cartola, então, diante do humilde jardim que enfeitava sua também humilde residência, compôs o mais belo de todos os poemas dedicado àquelas que simbolizam o amor e, que por ironia e pecado não consta da lista de Sheila Pickles.
    PS: Certa feita, indagada sobre aquelas rosas, inspiradoras de tanta beleza, D. Zica respondeu: que nada minha filha, eram rosas murchas, que prestes a morrer, secavam naquela roseira.

  6. Anônimo

    O que Você escreve,quase sempre , é show!
    O XI nos faz viajar,imaginar como um amante pode se sentir preso às lembranças e sonhos…
    Mas alguns comentários são magníficos,a Aninha,por exemplo,tambem deu Show.
    Que bom para Você ter leitores tão sensíveis.
    BJ

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