Um Pedaço de Ponte – Parte V

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Dando continuidade ao texto “Um Pedaço de Ponte” leia a seguir: 

A última rolada de Rolando ou último vôo de Zé Curica 

      Rolando era o verdadeiro nome do homem que havia rolado a Ladeira do Comércio, em total estado de embriaguez, numa madrugada, outro dia, mas todos só o conheciam por Zé Curica. Saber seu apelido não ajudou muito a um jornalista recém-chegado a São Luis naquela ocasião, pelo contrário, fiquei mais confuso, não sabia se esse apelido era dado às pessoas que têm as pontas dos pés voltadas para dentro ou para fora.  No estado em que o encontrei não dava pra ter certeza.

Fui ao local e vi o corpo. Mesmo morto ele tinha uma cara muito simpática e parecia estar vindo de uma noitada de farra e divertimento ali pelas das redondezas, 28 e da Palma. Na verdade, soube depois que ele morava lá, na Rua da Palma. Ele, Maria Clara, Euzébla, Cândida, Das Dores, Carmita, Antônia, Zuleide e Karla, ou melhor, Raimundo Carlos Gonçalves da Silva, um veado do primeiro time da ZBM*.

Pelo que tudo indica, Zé Curica era mesmo filho de puta.

Fazia alguns meses e vinte e nove anos que Zé Curica vivia por aquelas velhas ruas de paralelepípedos, por aquelas ladeiras e por aqueles batentes de pedra de cantaria. Por lá todos o conheciam; o português do Lusitano, o “Carcamano” do Ferro de Engomar, uma ou outra mulher da vida, e até o dono do “Jornal Pequeno” dentre outros.

Quem sabe, ou ouviu falar, diz que a mãe dele era uma das meninas da Maroca, e seu pai, salvo engano, era um oficial do navio mercante espanhol “Colombo”, um tal de Gimenez.

Mas voltar 30 anos no tempo é demais. Não deve ter sido muito diferente pra ele sua adolescência, sua infância, sua meninice, da vida que levava até anteontem.

Zé Curica fazia de tudo um pouco, e é lógico que fazia muito melhor quando não estava com umas e outras pela cara.  Era sapateiro, pedreiro, carpina e tudo mais que dava pra ser. Soube que uma vez quase morre ao tentar consertar a instalação elétrica do velho sobrado onde morava, juntamente com aquela penca de mulheres e um veado.

Todo esse circo morava em um picadeiro, ou melhor, num poleiro, num prédio na Rua da Palma.  O aluguel era pago com o suor do rosto de Zé Curica, das pernas, coxas, barrigas, lombos e camas das mulheres.  Até Karla ajudava no que podia.

No mais, tudo era normal: um homem amargurado, meia dúzia de mulheres se vendendo; um veado regendo a sinfonia.

O cenário: as donas com as carnes à vista, o fedor, o lixo, a aparência da cidade para aquelas bandas.  Uma cidade que dormiu um sono sem fim.  Um sonho de passado com cores fostes de esquecimento.

Cada vez mais os dias se aproximam da madrugada de outro dia.

Disseram-me os vizinhos de Zé Curica que, sempre que ele podia, dormia com uma das mulheres que moravam com ele e Karla no prédio do velho Alves.  Vizinhos mais mexeriqueiros disseram que “de vez em quando ele errava de cama e dormia com Karla”.

Havia um caso entre Zuleide, Curica e Karla.  Confirmavam as discussões, taponas, pontapés de todos os lados, puxões de cabelos e arranhões.

Zuleide estava grávida de Zé Curica, e Karla, com ciúme, colocou Racumin no prato dela. Depois, com ajuda das cordas da rede de Zé Curica, a bicha louca se enforcara no mirante do sobrado.

Um assassinato calado com suicídio.

Naquela noite, Curica tinha mais motivo para beber e se divertir que nunca.

Rolando foi rolando. Arrasado, bêbado, começou a cambalear no abrigo da Praça João Lisboa e só parou de rolar na porta do prédio onde funciona a Secretaria de Planejamento, na Rua João Gualberto. Isso aconteceu na madrugada de outro dia.

Ainda há pouco descobri que Zé Curica é o apelido usado para quem tem as pontas dos pés voltados para dentro. E mais, que o apelido de Rolando era Zé Curica, não porque ele tivesse esse defeito físico, mas porque nunca pode comprar um “papagaio” de Zezé Caveira* e usava papel de jornal para preparar suas “curicas”. 

* ZBM – Zona do baixo meretrício

* Zezé Caveira – Maior confeccionador de pipas e papagaios de São Luis

4 comentários para "Um Pedaço de Ponte – Parte V"


  1. alexandre

    ESTOU NESSE MINUTO OUVINDO SUA PARTICIPAÇÃO NO PROGRAMA DO CARECONE SOBRE A MORTE DO RAPAZ.
    E ELE ESTA GAGUEJANDO TENTANDO DEFENDER A POLICIA QUE FAZ UM ESPETACULO, ARMA UM CIRCO PRA NAO DIZER NADA. E VC COMENTOU SOBRE A IMPRENSA. CONCORDO COM VC CARO DEPUTADO
    QUE TAL COMEÇARMOS A LIMPAR O LINGUAJAR DOS BLOGUEIROS DO IMIRANTE COMO O DÉCIO E O MARCO DEÇA. ISSO É UM ABSURDO A FORMA COMO ACHINCALHAM AS PESSOAS. ABRAÇOS

  2. Eduardo

    Nobre imortal, recorro à vossa excelência em busca de refer~encias sobre o movimento do cinema no maranhão, mais especificamente o movimento super-8. Ciente do seu vasto conhecimento sobre assunto, acredito que posso corroborar com minha humilde, mas elucidativa, pesquisa.

    Atencisoamente,

    Eduardo Martins

    Resposta: Caro Eduardo, muito melhor que eu para lhe falar sobre o cinema em super-8 em nosso Estado é Euclides Moreira ou Murilo Santos, dentre outros. Quanto a sua pesquisa, gostaria muito de conhecê-la. Passe uma manhã dessas lá na ALm pra conversarmos.

  3. CHACAL

    Só uma coisa a comentar sobre seu texto : kakakakakakakakakakakakakakakakk

    Pô! estou no trabalho!!!! até minha chefe veio olha o porquê de minhas gargalhadas (rsrsrsrsr)

  4. Eliane

    Bo Dia Joaquim !!!!

    Meu Deus quanta tragédia, um travesti que morre eletrocutado, as lésbicas que matam e se matam, o troca troca de cama e sexo na cas de Zé Curica, a bicha assassina e morta e por fim o triste fim de Ze Curica. Affff estou pasma com tanta imaginação.

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