Sobre a reforma política

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Passei boa parte do ano de 2010 dizendo que pelo meu conhecimento sobre José Sarney, podia prever que depois que ele se reelegesse presidente do senado federal e consequentemente do congresso nacional, seria ele quem iria patrocinar a tão necessária e urgente reforma política de que nosso país tanto precisa para consolidar a nossa jovem democracia, que, diga-se de passagem, foi conseguida graças à condução desse mesmo Sarney, quando como nosso presidente da república, nos guiou, no momento em que nosso país mais precisava de um estadista.

Esse mérito, que alguns já lhe dão hoje, lhe será tributado definitivamente nos próximos anos quando esses fatos forem analisados sobre a luz da ciência histórica e não pelas lentes nem sempre focadas de maneira correta pela prática política, partidária e eleitoral, que deformam a verdade em nome das disputas de poder.

Quando Sarney, daqui a algumas décadas já fizer parte tão somente da história e não mais for personagem atuante no teatro político de nosso país, tenho certeza de que se dará a ele todo o crédito que ele merece.

Mas sobre a reforma política, gostaria de dar a minha modesta contribuição para esse debate. Contribuição pautada na experiência que acumulei na prática política e eleitoral, desde a primeira eleição da qual participei como simples cabo eleitoral, nos idos de 1976, quando tinha apenas 16 anos de idade, passando pelos mandatos de deputado estadual, de deputado federal constituinte e pelos anos em que assessorei o governo do Maranhão tanto na secretaria de assuntos políticos quanto na de educação.

Aquela primeira eleição em que participei foi uma eleição de prefeitos e vereadores onde meu pai, Nagib Haickel, então deputado estadual, atuando de forma quase que distrital, detinha de certa forma hegemônica a região do Vale do Pindaré, composta basicamente pelos municípios de Pindaré-Mirim, Santa Inês, Monção, Santa Luzia e Bom Jardim. Para que se tenha uma pequena noção do que mudou nesses trinta e cinco anos desde que eu comecei na política, só desses cinco municípios, desmembraram-se seis novos. De Pindaré, Tufilândia; de Monção, Zé Doca; de Santa Luzia, Alto Alegre do Pindaré, Buriticupu e Bom Jesus da Selva; de Bom Jardim, São João do Carú. Apenas do município de Santa Inês não saiu nenhum outro, pois este já havia saído de Pindaré e não possui vasto território como os demais, que em alguns casos, ainda deverão ser desmembrados.

A contundente mudança demográfica e a reorganização geopolítica que experimentamos nos últimos anos, por si só já exigiriam uma reforma em nossa forma política e eleitoral, algo que pudesse nos dar mais segurança institucional, mais credibilidade.

Em nosso favor, recebemos da justiça eleitoral o maior e melhor instrumento para que se fizesse a reforma política e eleitoral em nosso país de forma segura e nós políticos não aproveitamos até agora esse advento. Hoje nós temos um sistema de coleta de sufrágio que acredito ser o mais eficiente e confiável de todo o planeta, o que nos propicia a certeza de que as reformas que se venha a fazer possam ser efetivadas com honestidade em seus resultados finais, nas escolhas dos cidadãos quanto aos seus representantes, certeza que antes não se tinha.

Pois bem, ao melhor estilo de Odorico Paraguaçu, deixemos de lado os “entretanto” e vamos direto aos “finalmente”: Acredito que antes de qualquer discussão devamos nos perguntar se a forma de elegermos os nossos representantes é satisfatória. Se o tipo do voto, o tempo dos mandatos, a possibilidade de reeleição para os diversos cargos, a forma dos financiamentos das campanhas, a função dos partidos, se tudo isso funciona de modo a possibilitar o sucesso de nosso sistema político e eleitoral. Em qualquer aspecto a resposta será sempre não.

Tenho uma proposta de reforma eleitoral. Ela é bem simples, consiste em eleições gerais com mandatos coincidentes de seis anos, sem reeleição para cargos executivos; congresso bicameral, onde seriam escolhidos senadores, os três congressistas mais votados de cada estado e seus suplentes seriam os mais votados subsequentemente; os vereadores, deputados estaduais, deputados federais e senadores passariam a ser escolhidos dentre os mais votados nas eleições para esses respectivos cargos; passaríamos a ter unicamente o financiamento público das campanhas políticas e os partidos seriam os responsáveis por todo o processo eleitoral.

Tomemos como exemplo o nosso Estado, o Maranhão: temos vinte e um congressistas, três senadores e dezoito deputados federais. Continuaríamos com o mesmo número de congressistas, sendo que os três mais votados ocupariam o cargo de senador e os demais serviriam de suplentes segundo a ordem decrescente de votação.

Vantagens práticas dessas medidas: As eleições para senador deixariam de ter custos exorbitantes; os senadores passariam a ter mais compromisso político e eleitoral com o sistema e com o eleitor e menos com a máquina estatal que elege ou apóia os governadores; eleger-se-ia um congresso nacional bicameral a cada seis anos com mandatos coincidentes com os de vereadores, prefeitos, deputados estaduais, governadores e presidente da república, acabando definitivamente com a reeleição para os cargos executivos, medida moralizadora e extremamente econômica ao sistema eleitoral; acabar-se-ia com a prática comum em que um cidadão se candidata a vereador, deputado ou a senador, para dois anos depois abandonar o cargo e se candidatar a prefeito ou a governador; estabelecer-se-ia um período de pelo menos seis anos entre uma campanha eleitoral e outra, onde os mandatários pudessem se dedicar melhor às suas funções administrativas, planejando e executando suas ações sem preocupações eleitorais; o fato de não haver reeleição para cargos executivos, faria com que houvesse o surgimento de novas lideranças que só se consolidarão caso realmente tenham respaldo popular e eleitoral; o cidadão deixaria de votar para o preenchimento de nove cargos e passaria a votar para apenas seis; acabar-se-ia com a indústria da eleição, através do aluguel de legendas partidárias que acontecem hoje de dois em dois anos, coisa que se perdurasse, se restringiria minoritariamente a eventos nacionais, pois com eleições gerais os partidos poderiam mais facilmente ter respeitado seu caráter nacional…

São tantas as melhorias que poderíamos experimentar com essa proposta!… Mas que ela sirva apenas como aperitivo para as muitas que irão aparecer. Que sirva pelo menos para que nós possamos, no âmbito do Maranhão, começar a discutir esse importantíssimo assunto.

6 comentários para "Sobre a reforma política"


  1. Rodrigo Lago

    Caríssimo deputado (título vitalício), imortal (título para a eternidade) e secretário (provisório),
    fico feliz ao ver importante formador de opinião fomentar este debate. Você tem autoridade para carregar esta bandeira, afinal, só não este sistema eleitoral corrompido é o responsável por não o termos mais no Parlamento. Quem sabe com a reforma política poderei assistir o seu retorno. Apesar de estarmos em lados políticos opostos, reconheço a grande contribuição do seu exercício parlamentar ao Estado.
    Quanto ao tema, peço venia para discordar em alguns pontos. Sou ABSOLUTAMENTE contra a adoção do sistema majoritário para as eleições de deputados e vereadores. Além de discordar da ideia, penso ser ela incompatível com a nossa Constituição, porque ofenderia o valor igual do voto para todos, petrificado no art. 14. Tem mais, a mudança traria o risco de transformar a nossa democracia em uma ditadura da maioria. O que é pior, ficaria reduzida a nada a já deficiente democracia intrapartidária, uma vez que somente os caciques dos partidos se lançariam candidatos. As minorias jamais seriam representadas no Congresso Nacional. Estes mesmos riscos se estenderiam ao voto distrital. Acho que o nosso sistema proporcional, com algumas correções, ainda é o “menos pior”, com o perdão da expressão.
    Também discordo da ideia de um único voto para a eleição de três senadores. Corre-se o risco de senadores eleitos com pouqúissima representatividade, e consequentemente, sem legitimidade. Devemos sempre lembrar que os senadores são osdefensores do sistema federativo, e em regra devem estar alinhados com o governo estadual eleito. Eles representam o estado, como ente federativo, no Congresso Nacional. O sistema eleitoral para Senador precisa mudar, mas ainda não cheguei à conclusão de qual seria o melhor. Talvez fosse o caso de criar chapa única para governador, vice, senador e suplentes.
    Concordo com o prazo de seis anos de mandato para o Executivo, mas é necessário criar um sistema de recall. De logo adianto, porém, que este sistema tem que ser bastante rígido, para evitar que os governos sejam populistas ao extremo, ainda que contrários ao interesse público. Do contrário, o recall pode representar uma antecipação das eleições ordinárias.
    Outro ponto que precisa mudar urgentemente é o regime de coligações, e pior ainda sem a verticalização. Por que não acabar com esta excrecência?
    Forte abraço
    Enfim, são algumas das minhas ideias, estando aberto ao bom debate.

    Resposta: Caro amigo Rodrigo,
    Como disse antes, essas são sugestões para início de conversa, mas acho que devo contra argumentar, pois ter você nesse debate o enriquece bastante:
    Primeiro: Em que o peso do voto majoritário para prefeito, governador e presidente da república se diferenciaria do dado para deputados e vereadores, no que diz respeito ao citado artigo catorze de nossa carta constitucional? E se assim o for, o que estamos propondo são reformas, então se reforma o 14 também, pelo menos assim não iremos mais eleger quatro estrupícios na esteira de um Tiririca.
    A democracia nunca será a ditadura da maioria, mas sim a república dela. De seis em seis anos poderemos mudar de idéia e de rumo, mas por seis anos os mais votados tomarão as decisões.
    Você diz que as minorias jamais seriam representadas no Congresso Nacional, no que você está equivocado. Se for ver o voto majoritário está inserido fortemente dentro do voto proporcional. Dos 42 deputados estaduais do Maranhão, talvez apenas 20% tenham sido incluídos dentre os menos votados, ou pela proporcionalidade, 80% já são os mais votados mesmo, majoritários. Se essa analise for ser feita qualitativamente você verá que o voto proporcional prejudica mais que ajuda.
    Quanto aos senadores, hoje ele são eleitos na esteira das eleições de governador. São cargos legislativos e suas eleições tem caráter executivo, pois dependem de acordos partidários e conchavos eleitorais majoritários, atrelados intimamente às campanhas de governador. Se todas as eleições passarem a ser majoritárias, isso acaba. Os senadores passam a ser os mais votados para o parlamento. A função do senador é representar os estados, mas isso não quer dizer que ele tenha que ser eleito na esteira do poder e da campanha do governador, fato que descaracteriza sua função fiscalizadora e legislativa, além do que desatrelar essa eleição fará com que o processo fique mais equilibrado e justo.
    Rodrigo, o nosso recall deve ser feito através da educação e da informação. Mudar de um ruim para um menos ruim não fará muita diferença! Sem recall intermediário, quem votar errado que passe seis anos pagando a conta e aprenda a votar.
    Se o voto for majoritário as coligações podem ser utilizadas com a simples recomendação de aplicação da teoria dos vasos comunicantes, caso contrário estaremos indo contra a livre associação.
    Sou contra a verticalização com o sistema político e eleitoral como é hoje, se mudarmos, sou favorável que os partidos tenham caráter eminentemente nacional, quem não concordar que mude de legenda.
    Grande abraço…

  2. Mondego, Marcos Baeta

    Parabéns pelas propostas, Joaquim. Bom para os políticos, melhor ainda para a população e eleitores. Abraços.

  3. Rodrigo Lago

    Amigo e deputado,
    bom debate. Mantenho-me firme nos meus argumentos. Continuo contrário ao voto majoritário para deputados e vereadores. A função de governar é dada à maioria, porque não se pode dividí-la para todos. A democracia direta é uma utopia. Mas a função legislativa, e especialmente a função fiscalizadora, pode contar com a participação das minorias. E isso será ceifado se mudarmos o sistema.
    Quanto a alteração do art. 14, penso ser vedado. Não obstante o art. 60 só tenha petrificado o voto secreto, universal e periódico, creio que o valor igual seja um direito fundamental, e a sua extinção seria inconstitucional.
    Não serve de parâmetro para prevermos um novo sistema (de proporcional para majoritário) pegarmos o resultado das eleições feitas nos sistema anterior. No sistema proporcional os partidos buscam inúmeros candidatos para registrarem, e assim conseguirem legenda. Se o sistema for majoritário, os partidos (leia-se, os caciques) impedirão as candidaturas de novas promessas, que poderão tirar as vagas das velhas raposas. Os partidos selecionariam apenas os candidatos que sozinhos poderiam carregar votos, posto que os votos aos piores classificados não ajudariam a formar legenda. É inimaginável pensar que, alterado o sistema, haveria todos esses candidatos.
    Outros argumentos se somam, mas teremos a oportunidade em debate que pretendemos fazer em breve na OAB/MA. Como bacharel, advogado, político e constituinte, será bom tê-lo como conferencista. Quando conseguir organizar o evento te aviso.
    Abraços

  4. Francisco Carlos da Silveira

    meus parabens deputado, o seu artigo e sua resposta ao comentario do rodrigo sao perfeitos
    o senhor faz muita falta em nossa assembleia, ela nao e mais a mesma sem a sua presenca

  5. limaneto

    Caro Joaquim quero parabeniza-lo pela abordagem que faz sobre o tema.Aproveito para saber se com a queda do ficha limpa para as eleições 2010 pode alterar a composição da atual assembleia legislativa e camara federal do maranhão.quem poderia cair e quem pode assumir?Ou não alteraria mais nada.Aguardo sua resposta.
    um abraço. Lima Neto

    Resposta: Não fiz esse levantamento, mas pelo que me lembro, não muda em nada a composição da nossa representação legislativa.

  6. joão marques

    joaquim, no maranhão vai ter mudanças na atual assembleia legislativae na reperesentação na camara , por conta da queda da lei ficha limpa?Em caso afirmativo, quem pode sair e quem pode entrar?

    Resposta: Não fiz esse levantamento, mas pelo que me lembro, não muda em nada a composição da nossa representação legislativa.

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