Decepcionante

Me pediram para usar uma única palavra para definir “Napoleão”, o novo filme do genial diretor Ridley Scott e eu escolhi uma palavra que para mim é muito cara, quando se trata de cinema e de um cineasta que eu admiro: “decepcionante”.

Em primeiro lugar, a história do corso, não cabe em um filme, já que comercialmente eles não devem ultrapassar, a casa dos 150 minutos, e olhe lá. O filme tem quase isso, mas deixa de fora fatos indispensáveis para se apreciar o contexto não só da história em si, mas principalmente de tudo que envolve os acontecimentos de um tempo que foi marcante para a evolução e o crescimento da humanidade, naquele espaço que era então o centro do mundo.

Em segundo lugar, um filme que retrata figuras históricas de extrema relevância, como desse general baixinho que submeteu e conquistou durante algum tempo, alguns dos países e algumas culturas mais importantes da terra, não podem se descolar dos relatos fidedignos dos acontecimentos, sob pena de apresentar contextos através de pontos de vista míopes e coxos.

Em terceiro lugar, a liberdade criativa e autoral não pode, de forma avassaladora, ser exercida neste tipo de história, sob pena de desagradar quem minimamente conhece os fatos e contribuir para construir na cabeça de quem não os conhece, ideias equivocadas sobre eles.

Se eu não conhecesse a história, se este fosse o meu primeiro contato com Bonaparte, o acharia um idiota como homem, mesmo que o aplaudisse pelo que fez em Austerlitz, para depois tê-lo como um completo temerário pelo que fez em Waterloo.

Dizem que este filme terá uma outra montagem para exibição exclusiva na Apple TV, com mais de 4 horas de duração. Estou ansioso para assisti-la, para poder ver onde foram parar pedaços importantes da história que foram arrancadas dessa montagem que vi, por exigência prática da exibição em salas de cinema.

Pra falar a verdade, eu nunca vi um filme cuja montagem deixasse o espectador como eu, mais aflito e incomodado, pois conhecedor da história, vi, ou melhor, não vi retratado na tela, pedaços importantes e capazes de dar conectividade com o desenrolar dos acontecimentos.

Ridley Scott é certamente um dos melhores cineastas de todos os tempos. Ele tem filmes extraordinários, e quase não possui em seu portifólio nenhum fracasso. Nem se pode dizer que seu “Napoleão” é um fracasso, primeiro porque a sala estava lotada e segundo pela maravilhosa performance que ele apresenta do ponto de vista técnico do filme, pois a cenografia, o figurino, a fotografia, as cenas de batalhas, são realmente extraordinárias, mas um filme desta grandeza não pode ser insuficiente nem quanto ao roteiro, nem no tocante a montagem!

Quem já fez filmes como “Os Duelistas”, “Alien – O Oitavo Passageiro”, “Blade Runner – O Caçador de Andróides”, “Thelma e Louise”, “1492: A Conquista do Paraíso”, “Gladiador”, “Falcão Negro em Perigo”, “Cruzada” e “Casa Gucci”, pode se dar ao luxo de fazer um filme controverso, como este “Napoleão”.

Decepcionante não quer dizer que “Napoleão”, de Ridley Scott é um filme ruim. Isso não. Ele é simplesmente decepcionante para pessoas que como eu esperava outra coisa.

A sensação que eu tive ao assistir esse filme, é mais ou menos a mesma sensação que teve um dos mais icônicos personagens de Jorge Amado, o meu xará, Quincas, que acostumado a tomar uma dose deliciosa de pinga, num de seus bares favoritos da cidade de Salvador da Bahia, deram-lhe, no copinho de cachaça, uma talagada de água. Resultado: Quincas veio a óbito, mas passou toda história passeando com seus amigos pela cidade, como sempre faziam os farristas.

Fui ao cinema tomar uma dose de um Napoleão e degustei outro.

1 comentário em “Decepcionante”

  1. Outro ponto de vista:
    …. “Se você espera ver ação o tempo todo infelizmente ficará frustrado boa parte do tempo, até porque mesmo tendo suas cenas de ação, elas não são maioria, o filme foca muito mais na parte psicológica e emocional de quem realmente foi Napoleão, no seu jeito de agir e pensar.

    Se você gosta de um bom drama com pitadas de ação nos momentos certos, este filme com certeza é para você, e caso não tenha conhecimento algum de quem foi a lenda Napoleão, poderá ter um ótima introdução.

    Se quiser assistir ao filme te darei uma dica, vá de cabeça aberta e ouvidos atentos, todos os detalhes apresentados são importantes, e cada fato apresentado faz diferença para a continuação da trama!”

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *

Perfil

“Poeta, contista e cronista, que, quando sobra tempo, também é deputado”. Era essa a maneira como Joaquim Elias Nagib Pinto Haickel aparecia no expediente da revista cultural Guarnicê, da qual foi o principal artífice. Mais de três décadas depois disso, o não mais, porem eterno parlamentar, ainda sem as sobras do tempo, permanece cronista, contista e poeta, além de cineasta.

Advogado, Joaquim Haickel foi eleito para o parlamento estadual pela primeira vez de 1982, quando foi o mais jovem parlamentar do Brasil. Em seguida, foi eleito deputado federal constituinte e depois voltou a ser deputado estadual até 2011. Entre 2011 e 2014 exerceu o cargo de secretario de esportes do Estado do Maranhão.

Cinema, esportes, culinária, literatura e artes de um modo geral estão entre as predileções de Joaquim Haickel, quando não está na arena política, de onde não se afasta, mesmo que tenha optado por não mais disputar mandato eletivo.

Cinéfilo inveterado, é autor do filme “Pelo Ouvido”, grande sucesso de 2008. Sua paixão pelo cinema fez com desenvolvesse juntamente com um grupo de colaboradores um projeto que visa resgatar e preservar a memória maranhense através do audiovisual.

Enquanto produz e dirigi filmes, Joaquim continua a escrever um livro sobre cinema e psicanálise, que, segundo ele, “se conseguir concluí-lo”, será sua obra definitiva.

Busca

E-mail

No Twitter

Posts recentes

Comentários

Arquivos

Arquivos

Categorias

Mais Blogs

Rolar para cima