A morte é simplesmente uma longa viagem!

O que realmente é a morte? Como é que ela deve ser encarada? A quem ela atinge mais contundentemente, a quem vai ou a quem fica? São apenas algumas perguntas que eu tenho me feito recorrentemente sobre esse assunto, que sempre me causou bastante perplexidade.

Da morte sei, com absoluta certeza, sobre sua inexorabilidade. Ela é a única coisa certa que há na vida de uma pessoa. A vida pode ser boa, longa, produtiva ou absolutamente o oposto disso, mas ela, em algum momento, se extinguirá. O quando, o como e o porquê é que ficam por conta exclusiva das leis próprias da imponderabilidade.

Sobre essa imponderabilidade, meu pai me disse certa vez, após acabarmos de ver o filme “Lawrence da Arabia”, que apesar daquela história incrível, uma coisa lhe chamara bastante atenção, o fato de Lawrence não ter morrido na feroz Primeira Guerra Mundial, mas ter perecido depois das batalhas, em um simples e absurdo acidente de motocicleta. Desde então, passei a encarar tanto a vida como a morte de maneira bastante peculiar e pragmática.

A vida é tudo, substantivo, adjetivo, sujeito e predicado enquanto a morte é simplesmente a ausência, uma longa viagem.

Digo isso para falar da longa viagem que um querido amigo meu iniciou na ultima sexta-feira, dia 9.

Se eu disser pra vocês o nome verdadeiro dele, pouca gente vai saber de quem realmente se trata: Paulo Alberto Monteiro de Barros. Se eu disser o nome pelo qual ele ficou conhecido, muita gente vai se perguntar como é que eu pude ter ficado seu amigo e alguns até duvidaram de que realmente fui amigo de figura tão conhecida e importante: Artur da Távola.

Digo sempre que além de minha formação acadêmica de advogado, tive uma ótima formação de base, estudei em ótimos colégios e tive uma família que me proporcionou o aprendizado do que é a vida. No entanto, eu fiz também mestrado e doutorado em ciências políticas.

De 1983 a 1987 tive como mestres-orientadores Gervasio Santos, José Bento Neves e Raimundo Leal, dentre outros. No doutorado, de 1987 a 1991 tive o privilégio de ter como professores Florestan Fernandes, Afonso Arinos e Artur da Távola, para citar apenas três.

É sobre este último que eu desejo falar a vocês muito rapidamente, pois tenho que sair correndo pra ver se ainda o alcanço pelo menos na estação do trem que vai levá-lo nessa viagem, para tentar pelo menos acenar pra ele, olhá-lo mais uma vez e dizer-lhe o quanto aprendi com ele. Como ele me serviu de inspiração, desde quando ainda menino, sem conhecê-lo pessoalmente, ele me influenciou e como seu exemplo de pessoa humana, de homem, de político, fez com que eu costurasse minhas próprias roupas tendo as suas como exemplo de corte e elegância. Certamente não consegui me igualar ao mestre, mas só o fato de ter tentado, já me consola e apraz.

Queria poder, antes dessa sua viagem, ter sentado com ele para novamente ouvirmos as músicas que ele tanto amava. Os clássicos como Rachmaninoff, Gershwin e Prokofiev, mas com toda certeza ele não esqueceria de fazer tocar também a Bossa de seus ídolos e amigos, Tom e Vinicius.

Eu e Artur fomos colegas durante a Assembléia Nacional Constituinte, digo colegas porque ambos éramos deputados, mas ele, com idade pra ser meu pai – só era três anos mais novo que o meu pai – e capacidade de mestre, me propiciou alguns momentos antológicos, me apresentou pessoas incríveis, me ensinou coisas que pude praticar na minha vida, como político, como homem e como pessoa.

Há coisas que não se diz pra ninguém, mas depois de algum tempo essas mesmas coisas perdem o sentido e podem ser ditas pra todos. Paulo Alberto foi a primeira pessoa a notar meu problema de dislexia, o que de certa forma me libertou do estigma de ser simplesmente irrequieto e desatento, um leitor inapto e um escritor medíocre.

Não nos víamos já fazia algum tempo. Na verdade ele não me via, mas eu o via e o ouvia sempre em seu maravilhoso programa ‘Quem tem medo de música clássica?’, na TV Senado. E quando em Brasília ou no Rio, sempre ouvia seus programas de rádio, onde a sua música servia de bálsamo e de desculpa para que ele desse uma verdadeira aula de sensibilidade, cultura e humanismo.

Artur escreveu em seu último artigo publicado um dia antes de sair em viagem, intitulado “Papo dispersivo sobre a paixão”, depois de um pouco antes ter citado ninguém menos que Goethe, uma frase que é bem a cara dele: “… Amor é coisa muito diversa… Amor não clama nem reclama: amor dá”.

PS: Certa vez, conversando com Artur sobre a morte, disse para ele que gostaria de morrer de forma parecida com a que meu tio João havia morrido: dormindo. Na última sexta-feira, dia 9, ele usou a minha idéia e se foi, dormindo.

Na mente dela, ninguém!

O ombro dele
era o meu
na boca dela
que é minha.

A boca dele – não a minha – na dela
não a beija como a minha
não a morde
não a lambe
como a minha.
Como.
Minha.

A boca dela
no ombro dele.

Com toda certeza
a cadela
lembrou de mim.

Correspondência quase suspeita.

São Luis, 3 de maio de 2008.

Joaquim,

Dê só uma olhadinha no que essa minha filha anda escrevendo!

A “pikena” ta demais… Só queria ver a cara do pessoal daquela escola, uma das melhores da nossa cidade, que não tiveram nem um pouquinho se quer, de paciência e compreensão para com ela…

Minha menina vai longe. Parabéns para mim!

ITAAF

São Luis, 4 de maio de 2008.

Ivana,

Tenho visto! E lido. E conversado com ela.

Meu coração tem estado mais tranqüilo.

Minha vontade agora é que ela possa estudar, se formar e fazer o que ela mais gosta… Literatura, fotografia… Cinema quem sabe!?

Mas pra 19 anos ela ta muito bem obrigado!

Parece que fizemos um bom trabalho, e não vamos brigar pra saber pra quem ela puxou, se foi pra mim ou pra você!

JENPH

Donnie & Giu

Por Laila Haickel

Donnie era um cara misterioso e fazia questão de ser assim. Ele pensava que o mistério dele era simplesmente não deixar as coisas claras, e mal sabia o que realmente atraía aquela garota que ele falou a primeira vez no final de fevereiro daquele ano que veio pra mudar tudo.

Giu era uma sonhadora, sempre foi e provavelmente sempre será, mesmo que possa acabar se escondendo através de palavras demais impossibilitando o mundo de compreendê-la. E mal ela sabia também o que viria a se tornar.

Donnie tinha uma propensão genuína que ele desconhecia pelos obstáculos que se impunha, todos os escudos contra as essencialidades da vida que ele via como perda de tempo e contextualizava como fraqueza. Mal ele sabia que seus escudos que eram estúpidos e se tornaria mais um desses que escrevem canções de amor e cartas enquanto tomam doses de uísque.

Giu sempre escreveu canções de amor, mas pra alguém invisível, com toda a imaturidade de uma criança e todas as indagações de um adulto. Ela nunca soube onde estaria se metendo e nem como sairia disso. Na verdade ela nunca pensou em saídas, ela sempre pensou nos começos e nos meios, fins eram ocasionalidades tristes que ela preferia não pensar a respeito. Mal ela sabia que fins realmente existem.

Donnie procurou estabelecer regras pra organizar esse sentimento estranho ao seu corpo dentro da sua vida que nunca realmente precisou de nada disso pra valer à pena. Todas as regras se quebraram, tudo se espatifou e ele se perdeu em uma imensidão de horizontes vazios. Mal ele sabia definir como isso veio a acontecer, e riu pra si mesmo o sorriso mais triste que alguém já deu.

Giu flutuava ou boiava. Não tinha o pé fincado em lugar algum, não via diferença entre céu e terra, ficava assim… rodopiando em uma atmosfera de dor e perguntas sem resposta. Mal ela sabia que o que a envenenava seria aquilo que a faria crescer.

Donnie não conseguia controlar suas palavras agressivas, era o mínimo que ele podia fazer depois de ter se decepcionado tanto. E ele sentia raiva de si mesmo por apesar de tudo sentir saudades do cheiro da pele dela, mesmo que ele não admita sentir raiva por coisas assim. Mal ele sabia que ela conhecia todos os seus defeitos e os aceitava não porque pensava que merecia como penitência, mas porque amava suas qualidades muito mais.

Giu chorava todos os dias e por tudo, talvez ela seja assim até hoje, eu não sei ao certo. Ela sabia que merecia ser feliz mas não conseguia levá-lo pro mesmo abismo que ela se encaminhava, não era justo, porque ele não merecia aquilo, ele merecia ser feliz. De impulsiva se fez inconseqüente e cada segundo da sua vida em contagem regressiva vem uma sensação de claustrofobia que ela adquiriu com o passar do tempo. Mal ela sabia que a vida seria tão dura.

Donnie de vez em quando lembra da sua gargalhada enquanto fuma um cigarro no terraço, e ela ecoa até ficar tão distante que some, assim, inexistente como a presença dela. Ele percebeu que continuava com seus métodos frios mas também não queria mudar, ele pensava que assim que tinha que ser e guardava dentro de si um fiapo de esperança de felicidade tão frágil de se olhar… mas inquebrantável. Mal ele sabia que a vida não precisava ser tão dolorosa.

Giu não sabia mais no que pensar, no que acreditar, mas seguia em frente, sabe-se lá pra qual destino. Quem a olhava nos olhos podia perceber que ela tava lá no fundo, se arrastando, procurando uma brecha de luz. Ela se tornou uma pessoa ansiosa e sentia o coração pulsando cada vez mais acelerado. A agonia de não saber o que se espera a fazia esperar por coisas sem valor, como a hora que ela tivesse que sair de casa obrigada a enfrentar o mundo lá fora, simples coisas cotidianas. Mal ela sabia como era se sentir assim e que ele já havia passado por isso.

Donnie e Giu mal sabem de nada, mal sabem de tudo. Mal sabem como é sentar um de frente pro outro e jogar barriga inchada em um dia tedioso, mal sabem o que é nadar no mar juntos, mal sabem o que é pegar uma estrada só os dois, mal sabem o que é pegar um livro de receitas e tentar uma coisa nova, mal sabem quantas canções tristes de amor poderiam compor e mal sabem ainda mais que nem toda canção de amor tem que ter uma ponta de tristeza.

Mas Donnie sabe o que é rir da risada dela, o que é ir pro aeroporto e esperar que ela chegue e ainda vestindo uma roupa imprópria, sabe o que é ter que agüentar toda aquela teimosia que ela insiste em não largar, sabe que ela segura o garfo de maneira engraçada, sabe que ela não cala a boca um segundo e quando se cala alguma coisa ta errada, sabe por que ela gostou ou gostaria daquele filme, sabe que ela perde a vaidade de tempos em tempos, sabe que ela finge não estar com dor de cabeça pra poder fumar em paz, sabe como é dançar sem música com ela, sabe como ela é medrosa, sabe como ela pega no cabelo, sabe como fazer cócegas nela, sabe que ela é capaz de bater nele se estiver com raiva e falar mais palavrões do que ele já escutou na vida, sabe que ela fala alto demais e deixa-o com vergonha, sabe como é acordar e vê-la dormindo ao seu lado, sabe como é se entreolharem e não precisar de uma palavra pra compreender, sabe que ela bate o pé no chão quando quer alguma coisa e como ela fica um saco quando ta manhosa. Donnie sabe muito, sabe mais do que ela própria sobre si mesma.

E Giu sabe exatamente como a sobrancelha dele vai se mover, sabe que ele não ri pra fora quando tem uma crise de riso e pega tão forte no braço dela que fica a marca, sabe que a risada dele também muda de tempos em tempos e que ele já teve uma que mais parecia um porco, sabe que quando ele diz que tem uma surpresa pra ela é um porco rosa aliás, sabe como é sentir admiração só de ficar observando-o, sabe o que é ficar irritada com o silêncio dele, preso nos próprios pensamentos, sabe que ele fica com as costas encurvadas e ainda assim fica a mandando ajeitar a postura, sabe o que é ter que ficar ouvindo mil reclamações e querer mandar ele pra algum lugar não muito prazeroso, sabe como é quando ele se empolga com algo e só consegue falar disso, sabe como ele se vicia em uma música e a faz escutar a mesma toda hora, sabe que ele não consegue largar o violão e sabendo que ela não agüenta mais ter que ser platéia, ele toca uma música da banda preferida dela, sabe qual é a sensação do melhor abraço do mundo, sabe que ele faz carinho como se tivesse acariciando um cachorro. Giu sabe muito também, e dá valor pra coisas que ele talvez nem imagine que ela lembra. Ela costuma pensar que o dia em que eles saíram só os dois pela primeira vez é feriado por causa deles, porque definitivamente é motivo de feriado, e fica imaginando se ele continua ruim de datas ou se lembrou que é hoje.

Dor no ouvido

A dor maior
não é outra
senão
esse maldito
telefone que não toca.

Uma breve visão sobre JS.

Outro dia eu estava assistindo na TV Senado a um discurso que Sarney fez pela passagem dos 400 anos do nascimento do Padre Vieira, quando minha mãe entrou, sentou-se e ficou me fazendo companhia. Ao final, ela disse: “Podem dizer o que quiser dele, mas para mim ele é o maior político desse país”.

Fiquei imaginando em que o Sarney de minha mãe diferenciava-se do Sarney de Neiva Moreira ou do de Amanda Dutra ou do de Vadequinho.

Fiquei me perguntando quem na verdade é esse homem que desperta tantas paixões, positivas e negativas.

Seus adversários tentam estigmatizá-lo chamando-o de “Cacique”, “Coronel” e “Chefe de uma das últimas grandes oligarquias brasileiras”. Seus amigos citam o Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap) que afirma que ele é a figura mais influente de todo legislativo brasileiro.

Imagino que se perguntado fosse sobre quem é José Sarney, ele mesmo diria vaidoso, que é apenas três coisas: 1) O realizador da infra-estrutura que possibilitou as grandes transformações em nosso Estado, tais como a criação da Universidade Federal do Maranhão, e a instalação das faculdades estaduais que viriam depois a ser a UEMA. Foi Sarney quem criou o CEMA, centro pioneiro no Brasil de ensino através da televisão. O Projeto João-de-Barro, escolas para comunidade rural. Criou na TELMA o primeiro plano diretor estadual de telecomunicações do País; Com a CAEMA, construiu o sistema de abastecimento de água de São Luís, a Barragem do Batatã, a estação de tratamento do Sacavém, e interiorizou o abastecimento d’água em mais da metade dos municípios do Estado. Criou a COHAB e construiu os primeiros conjuntos habitacionais em São Luís e no interior. Com a CEMAR cobriu mais de 50% do Estado com energia de baixo custo. No setor de transportes, em seu governo que foram abertos os traçados viários que desbravaram o Maranhão, entre elas a construção da rodovia Santa Luzia-Açailândia e do Porto do Itaqui, antevendo as suas imprescindíveis necessidades para o nosso desenvolvimento.

2) O responsável pela condução de nosso país durante a transição para a democracia.

Alguns analistas reconhecem o trabalho do então presidente Sarney como fator primordial a redemocratização do nosso país. Dizem que se não fosse a fatalidade esse mérito seria de Tancredo. È verdade, mas pela fatalidade, a tarefa coube a ele e ele fez tudo que Tancredo faria, tudo que precisava ser feito. Foi com extrema perícia e habilidade que Sarney sepultou a ditadura militar e teve paciência e cautela para consolidar o regime democrático. Desmentiu oráculos que previam a década de 80 seriam anos perdidos. Perdidos talvez para especuladores, mas para a democracia e o estado de direito, foi crucial.

Mas quem é realmente esse Sarney!? Todos sabem que ele é obstinado, dedicado e competente. Não há nenhuma dúvida que ele seja um homem de grande sorte. Ninguém desconhece sua capacidade de errar muito menos que os seus adversários. Em minha opinião são essas três coisas que fazem dele um vencedor, tanto que foi ele até agora, o único brasileiro a ter chefiado o Poder Legislativo e o Poder Executivo em nosso país.

Consolidou sua imagem de intelectual e democrata ao conciliar-se com Fernando Collor de Mello, apesar dos insultos sofridos durante a campanha de 1989. Esteve com Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso. Por fim tornou-se o interlocutor mais próximo e aliado de primeira hora do presidente Lula.

Alguns de seus críticos mais cruéis dizem que Sarney poderia ter feito muito mais pelo Maranhão. Mas quando dizem isso não levam em conta o fato de toda a pressão que havia sobre seus ombros no período em que foi presidente da republica, e em que dividia, apenas os bônus do comando das decisões, com Ulisses Guimarães e o PMDB. Os ônus eram somente seus.

Dono de uma das mais longas e emocionantes carreiras políticas do país, Sarney protagonizou várias vezes a lenda da Fênix, pássaro que renasce das cinzas.

Tanto seus amigos quanto seus adversários sabem porem que de santo Sarney só tem a cara. Em compensação todos também sabem que está redondamente enganado quem o imagina um demônio, de chifres, rabo de seta e tridente.

Não há como negar que mais do que simplesmente uma figura política, Sarney é uma figura histórica para várias gerações. Sua trajetória recorta um importante período de vida brasileira, em que ele vem dominando a cena, desde quando ainda moço, elegeu-se governador do Maranhão, em 1965, para continuar a dominá-la ainda mais, quando chegou à Presidência da República, vinte anos depois, e continuar em evidencia como ator de destaque mais de quarenta anos depois.

Mesmo tendo sofrido graves revezes depois que foi traído pelo então governador Zé Reinaldo, o seu mais constante auxiliar e beneficiário desde 1966, Sarney ainda assim, mantêm-se como um dos mais importantes políticos da República.

3) Que para ele, José Sarney é na verdade um escritor que foi governador de seu estado, presidente de seu país e é senador da república. Que escreve poesias, contos, romances e ensaios, é membro da Academia Maranhense de Letras e foi eleito para a cadeira 38 da Academia Brasileira de Letras em 1980.

Que seus 50 livros foram já foram traduzidos em mais de 20 idiomas e publicados em mais de 50 países. Que no correr de sua atuação como homem de letras, publicou A Canção Inicial (poesia, 1952), Marimbondos de Fogo (poesias, 1979), O Dono do Mar (romance, 1995), Saraminda (romance, 2000) e livros de artigos políticos, entre outras obras.

Desencontro

Como te levar
para o futuro
se eu volto
todo dia
ao passado onde moro,
ansiando
por mais um
misero segundo
de presente
junto a ti.

Minha filhota Laila desde cedo demonstrou seus dotes artísticos voltados para a literatura e a fotografia e pelo que tudo indica, ela logo irá superar seu pai como escritor e sua mãe como artista plástica.

Hoje quem vai postar aqui é o pai coruja, que orgulhoso de sua cria foi lá em seu blog, copiou seu post quarta-feira, dia 16, e colou aqui embaixo.

Enjoy!

Saca só, você acorda às seis da manhã, que dia lindo, o sol brilha, os pássaros cantam, que sensação maravilhosa. Fast Backward 2x, erro de descrição. Play.

Saca só, você acorda às seis da manhã, puto, exatamente porque acordou às seis da manhã, os pássaros parecem estar todos mortos, o sol recém-nascido parece mais distante do que ele realmente está e uma chuva inesperada vem pra te fazer fumar de janela fechada. Que sensação maravilhosa. Fazer o quê? Assistir Harry Potter e a Ordem da Fênix! Tchurururulí! Fast Forward 8x: Assistindo o filme, às vezes rindo para a televisão, outras séria com cara de urubu. Não é necessária a descrição dos olhos cheios de lágrimas ou da careta vem-choro-aí. Fast Forward 20x. Play.

Marinete entra no meu quarto, ela tinha inventado de fazer meu prato e trazer pra mim. Pause. Zoom. Zoom. Zoom. Olhem esse prato. Olhem esse prato! Aquele morro bem ali é só arroz, a parte escurecida ali no meio foi uma idéia bem saudável de derramar toda aquela manteiga pós-passação-de-bife e lá estão os dois bifes bem passados, sendo que eu gosto de mal passado. Nem falei nada, ela fez com tanta boa vontade… Não acredita que não falei? Pois veja! Zoom. Zoom. Zoom. Zoom off. Play.

Ela me entrega o prato, finjo que é super normal comer um quilo de arroz e continuo assistindo Sonhos. É, comi pedreiramente, meus caros. Fast Forward 24 horas. Play.

Marinete decide me servir de novo. “Okay, ela tá gostando disso. Vamo lá, alter ego, aposta quanto como vai vir comida pra cinco?”. Fast Forward 4x. Play.

Marinete adentra meu quarto. Pause. Zoom. Zoom. Zoom. Vê aquela coisa empapada e amarelada tomando conta do prato inteiro em forma de prato fundo ao contrário? Arroz com creme de leite, uns pózinhos e cogumelo. Vê o outro componente? São quatro pedaços de carne, meus caros, sim senhores. Zoom. Zoom. Zoom. Zoom off. Play.

“Marinete! O que que é isso?!”. Dessa vez não deu. Ela começa a rir loucamente. Fast Forward 2x: Laila andando igual um cavalo pangaré até a cozinha, tira metade daquilo tudo. Play.

“Marinete, eu não posso comer isso tudo! Se eu deixasse no prato eu ainda era capaz de comer, mas não posso comer essa monstruosidade não, ia virar o próprio monstro!”, ela ri mais ainda como se Santa Claus was coming to town e comenta com Leude: “Ela ainda vai voltar aqui pra repetir!”. Fast Forward 4x: Laila volta ao seu quarto com a bandeijinha de doente e come seu prato agora decente, e não, não volta pra repetir. Play.

Fast Backward 23 horas. Play.

Assistindo Sonhos de Akira Kurosawa e pensando que se fosse eu ou um outro “qualquer um” que tivesse feito iam achar uma merda, empty, low quality, pointless etc, mas já que são os sonhos dele, tudo bem, belezura, amazing, terrific, breathtaking e todos os outros termos que esse povo coloca nos títulos das suas reviews pessoais. Fast Forward 20x. Play.

Tendo que criar em grupo um outdoor pra uma pizzaria que tem uma exclusividade empolgante! Queijo que não estica, queijo que faz crock. Errr. Não é empolgante, okay? Fast Forward 8x: Brainstorming, defendendo idéias, falando de pizza e de pizza e de pizza. Apresentando pra turma e falando de pizza, e porquê uma foto de uma pizza imensa no outdoor faria alguém passando de carro ficar com água na boca. Vontade de comer pizza. Muita vontade de comer pizza. Noção de que mamãe não ia querer me levar pra comer pizza. Indo pra locadora, escolhendo filmes, indo na conveniência ao lado atrás de pizza congelada. Não tendo. Play.

“Já que não tem pizza…”, viro pro refrigerador de cervejas. Fast Forward 2x: Pego um saco de ruffles cebola e salsa, peço um maço de hollywood vermelho e um tridente de melancia, me sentindo em um desses filmes de viagem de estrada. Pago. Volto pro carro. Play.

“Cerveja, é?”, mamãe pergunta em um tom irônico típico.
“Não tinha pizza, fazer o quê?”, respondo como se fosse a coisa mais óbvia do mundo substituir uma pizza por duas Brahmas. Fast Forward 9 horas. Play.

Saca só, acordo às sete, sem entender o que se passa, sol escaldante me queimando e os pássaros ressuscitaram com poderes mutantes no volume do seu chilrear. Que sensação maravilhosa. Fast Forward 5 horas. Play.

Assistindo Rain Main. Pauso. Dou Zoom três vezes. Analiso uma foto na mão da atriz. Dou zoom quatro vezes pra ficar off. Dou play. Fast Forward 4x. Play.

Dou uma risada que não vou descrever, muito bizarra. Fast Forward 8x. Play.

Assistindo Rain Main. Olhos cheios de lágrima? De novo?! Fast Forward 8x: Termino de assistir o filme. Vou para o computador. Vontade de escrever sobre o meu dia-a-dia. Começo a escrever, escrevo o começo, paro, releio, vou em outra página, continuo a escrever, escrevo e escrevo, paro, implemento os 2x, 4x, 8x e afins nos outros Fast Backward e Fast Forward, escrevo mais, releio. Chegando ao tempo real. Play.

Raios-X

O acumulo de dias fez-me velho.
Velho, fiz-me transparente.
De transparente fiquei invisível.

Razão

Encaro o teto
esperando que o silencio
decida se apresentar.

A boca parada,
dedicada inteiramente ao pensamento
e a dor.

Fico quieto
tempo suficiente
para descobrir
a cor do ar.

Levo suavemente um suspiro até a boca,
Fecho os olhos,
tento adivinhar o futuro
e reescrever o destino.

Olho
por um longo tempo para tuas calças
jogadas no sofá,
antes de mover apenas a mão esquerda
e com o dedo médio
seguir as dobras
imaginando as carnes que elas abrigavam.

Continuo parado,
imóvel,
na tentativa de me misturar com a mata.

Para que ela devore a minha duvida,
amarrada tão firmemente
com um fio de teu cabelo.

Roma

Você é a minha cidade.

Conheço tuas ruas,

passeio por elas.

Planto em teus becos a minha árvore

e ela floresce em você.

Tomo conta de teus jardins

e cuido de teus gramados com esmero.

Sou teu jardineiro.

Acendo todo o dia

os lampiões de tuas avenidas,

de teus olhos,

para que ilumines a minha vida

e espero que o fogo que uso para acender-te

a alma,

a mente,

o corpo

acabe por nos incendiar

Amor.

Perfil

“Poeta, contista e cronista, que, quando sobra tempo, também é deputado”. Era essa a maneira como Joaquim Elias Nagib Pinto Haickel aparecia no expediente da revista cultural Guarnicê, da qual foi o principal artífice. Mais de três décadas depois disso, o não mais, porem eterno parlamentar, ainda sem as sobras do tempo, permanece cronista, contista e poeta, além de cineasta.

Advogado, Joaquim Haickel foi eleito para o parlamento estadual pela primeira vez de 1982, quando foi o mais jovem parlamentar do Brasil. Em seguida, foi eleito deputado federal constituinte e depois voltou a ser deputado estadual até 2011. Entre 2011 e 2014 exerceu o cargo de secretario de esportes do Estado do Maranhão.

Cinema, esportes, culinária, literatura e artes de um modo geral estão entre as predileções de Joaquim Haickel, quando não está na arena política, de onde não se afasta, mesmo que tenha optado por não mais disputar mandato eletivo.

Cinéfilo inveterado, é autor do filme “Pelo Ouvido”, grande sucesso de 2008. Sua paixão pelo cinema fez com desenvolvesse juntamente com um grupo de colaboradores um projeto que visa resgatar e preservar a memória maranhense através do audiovisual.

Enquanto produz e dirigi filmes, Joaquim continua a escrever um livro sobre cinema e psicanálise, que, segundo ele, “se conseguir concluí-lo”, será sua obra definitiva.

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