Augusto Pellegrini: cantor de jazz e blues, escritor, articulista sobre futebol do jornal O Imparcial, radialista e economista. Autor de um dos mais importantes livros sobre jazz em língua portuguesa – Jazz: Das Raízes ao Pós-bop lançado pela editora Códex. Também é contista com quatro livros publicados, sendo o mais recente O Bruxo de Concepción, pela Clara Editora.
Pellegrini é apresentador há mais de 32 anos de programa de jazz no rádio do Maranhão. A história dele começou com o Mirante Jazz, em 1982, onde ficou no ar até 2004. Um mês depois de ter deixado a emissora, assumiu o Sexta Jazz, que vai ar pela FM Universidade até hoje.
Como cantor e divulgador do jazz, já atuou nas principais casas noturnas, bares e teatros na cidade de São Luís, além de ter sido o apresentador oficial do 1º Lençóis Jazz e Blues Festival, realizado na cidade de Barreirinhas. Recentemente, em outubro de 2013, apresentou o show Swingin’ Lovers – Bennett and Sinatra que foi muito bem recebido pelo público. Augusto Pellegrini, esse cara, realmente, nota jazz, conversou um pouco da história com a música e São Luís, além de falar do show de abertura da 6ª edição do Lençóis Jazz e Blues Festival, que ocorre nesta sexta-feira (8) e sábado (9), na Praça Maria Aragão, na avenida Beira-Mar, Centro Histórico de São Luís. A programação completa do Festival confira Aqui…
PEDRO SOBRINHO – Quantos anos no Mirante Jazz na Mirante FM ?
AUGUSTO PELLEGRINI – O Mirante Jazz começou na Radio Mirante FM em outubro de 1982 e foi levado ao ar ininterruptamente por 22 anos, até junho de 2004. Um mês depois de ter deixado a Radio Mirante FM eu comecei na mesma linha o programa Sexta Jazz na Radio Universidade FM, onde já estou há 10 anos, totalizando 32 anos de jazz no radio maranhense.
PEDRO SOBRINHO – Como nasceu o teu envolvimento com o jazz ?
AUGUSTO PELLEGRINI – O jazz fez parte da minha vida desde os tempos de criança, mas o meu envolvimento profissional nasceu quase que acidentalmente, pois com o início do Mirante Jazz, além de apreciar o jazz como ouvinte, eu tive que começar a estudar e me aprofundar na matéria. Como uma coisa puxa outra, logo me vi transformado de cantor de bossa-nova e samba-canção para cantor de jazz e de standards da música norte-americana.
Eu tenho, porém, a impressão definitiva de, quer seja como produtor e apresentador de programas de jazz, quer seja como escritor de livros e artigos sobre jazz, quer seja como cantor de jazz, quanto mais eu me aprofundo no assunto, mais me falta o conhecimento sobre jazz.
PEDRO SOBRINHO – Além de música, você respira literatura. És mais música ou literatura ?
AUGUSTO PELLEGRINI – A minha vida é composta de fases. Já tive a fase de compositor, quando a facilidade de produzir letra e música era muito farta. Hoje tenho dificuldade em compor. A minha fase de cantor é relativamente recente, pois comecei em 2000, mas de certa forma ela supre o meu lado músico, o que exige uma habilidade diferente, que foge da poesia e da musicalidade para cair no campo da alma interpretativa. Hoje eu curto mais a literatura, quer escrevendo artigos sobre esporte, música e literatura, quer continuando a produção de contos e livros sobre jazz, porque se trata de uma atividade que eu posso exercer 24 horas por dia, tendo como companhia apenas um computador e a cabeça cheia de idéias.
PEDRO SOBRINHO – O teu gosto por jazz influencia na literatura ?
AUGUSTO PELLEGRINI – Com toda a certeza. Minha literatura tem um pouco de jazz nas entrelinhas, no estilo, na sutileza, no approach. Eu considero o jazz algo que vai além da música. Além de ser uma filosofia, jazz é também um estado de espírito. E dentro deste prisma fica óbvio que a minha literatura sofre uma profunda influência não só do jazz como também da música lírica e erudita quando eu enveredo por textos mais dramáticos.
PEDRO SOBRINHO – Fale da tua relação com o esporte.
AUGUSTO PELLEGRINI – Eu me interesso profundamente pelo esporte, embora pessoalmente nunca tenha tido habilidade e talento para praticar nenhum deles. Tal interesse me levou muito cedo aos estádios para assistir às partidas e acompanhar a qualquer tipo de literatura de referência – jornais, revistas, livros, e agora, sites – culminando por em 1994 começar a escrever um artigo sobre a matéria (Bola Alta) no jornal O Estado do Maranhão, onde fiquei até 2013, quando ingressei no O Imparcial e assino o artigo Gol de Placa.
Minha relação com o esporte chegou até os clubes na década de 1980 quando assumi no Maranhão a presidência do Esporte Clube Tupan, trabalhando no desenvolvimento de diversas atividades além do futebol profissional, como o futebol de base, o handebol, o futsal e a ginástica. Infelizmente o Tupan foi descontinuado oito anos depois da minha gestão.
PEDRO SOBRINHO – Você já conhecia o Lençóis Jazz & Blues Festival na condição de mestre de cerimônia, em Barreirinhas. E, mais uma vez, foi convidado para apresentar o festival na versão 2014, em São Luís. Agora, como você recebeu o convite para cantar no festival ?
AUGUSTO PELLEGRINI – Tenho orgulho de fazer parte da primeira turma que desbravou o festival na sua primeira edição. Eu me lembro de detalhes da organização e da luta de todos – produtores, assessores de imprensa, auxiliares, técnicos – para que tudo funcionasse da melhor maneira possível. Acredito que todos aprendemos muito com o pioneirismo. Lá em Barreirinhas tive oportunidade de cantar uma música de improviso na última apresentação do último dia, com a banda de Edson Travassos. Fiquei muito satisfeito em ser chamado para apresentar o festival. novamente, agora em São Luís, e mais feliz ainda por fazer parte do grupo de cantores que abrilhantarão a festa. Tenho trabalhado bastante em shows de jazz e assemelhados em São Luís nos últimos quinze anos, e considero este convite para me apresentar ao lado de verdadeiros ícones da música como um prêmio à minha persistência.
PEDRO SOBRINHO – Você está acostumado a shows em formato pequeno, intimista. A responsabilidade aumenta ao cantar para uma platéia maior e diversa, tendo em vista um festival com acesso liberado que visa democratizar a música ?
AUGUSTO PELLEGRINI – Eu não tenho preocupação em cantar para muitas ou poucas pessoas. Dependendo do tamanho e do comportamento do público eu costumo imprimir uma dinâmica diferente que melhore a aceitação dos ouvintes e a minha concentração como cantor.Acho excelente poder apresentar meu trabalho para uma platéia que não está habituada com o jazz, e para tanto tomei algumas providências para manter o público empolgado, tais como apresentar um repertório versátil que varia entre o jazz puro, o swing, a soul-music, o jazz tradicional e alguns standards relativamente comerciais, e convidei dois cantores para participar (Camila Bueri e Fernando de Carvalho) cujos timbres e estilos ajudarão na diversificação do espetáculo.
PEDRO SOBRINHO – Você falou em Camila Bueri e Fernando de Carvalho, que serão os os seus convidados no palco. O que eles representam musicalmente para você ? Quem são os músicos que vão acompanhá-lo ?
AUGUSTO PELLEGRINI – Depois de imaginar diversos tipos de formação acabei optando pelo trio – piano, baixo e bateria – que representa a essência do jazz convencional, e para tanto convidei três músicos que tem a capacidade de transmitir esse espírito com muita qualidade: o tecladista será Marcelo Rebelo, que fará uso dos diferentes timbres dos seus teclados para diversificar a sonoridade dos arranjos; Sergio Mariano fará uso do contrabaixo acústico e do baixo elétrico dependendo da mensagem musical a ser enviada; e Fleming Bastos, talvez o nosso mais eclético baterista, transmitirá toda a sensibilidade do seu beat com a sua classe e categoria habituais. Quanto aos cantores convidados, busquei dois intérpretes que têm afinidade com a malícia interpretativa da língua inglesa, em termos de pronúncia e divisão. Trata-se do jovem veterano dos palcos Fernando de Carvalho, que apresentará duas versões como as mostradas no seu show “Cantando Hollywood e a Broadway” e da jovem debutante Camila Bueri que começa a mostrar um trabalho voltado ao pop e soul-music com bastante consistencia.
PEDRO SOBRINHO – O jazz está no teu DNA. E o show é significativo e marcante nesse seu envolvimento, especificamente com esse gênero musical. Tem como você adiantar o que está reservando para esta noite tão especial ?
AUGUSTO PELLEGRINI – Nós estamos projetando uma espécie de pocket-show com onze músicas em pouco menos de uma hora de duração, isto é, o show será muito dinâmico e composto por músicas de curta duração. Eu acho que se apresentar em um festival é diferente do que se apresentar em um show regular pelo tipo de público que estará presente. Então eu, meus músicos e meus convidados resolvemos colocar no mesmo pacote músicas com mais brilho, como ‘Lullaby of Broadway’, ‘I’ve Got You Under My Skin’ e ‘Hello Dolly’, coisas mais modernas como ‘What a Difference a Day Made’ e ‘For Once in My Life’, pegadas de blues e soul como ‘Miss Celie’s Blues’ e ‘Georgia on My Mind’, e músicas mais populares que vão de ‘Natural Woman’ e ‘New York New York’, buscando atingir as diferentes fatias de espectadores. Evitamos solos longos e demasiados eruditos que seriam apreciados apenas pelo verdadeiro jazzófilo, mas que
poderiam ficar monótonos para o público alternativo.
PEDRO SOBRINHO – Você sempre foi o divulgador do jazz e seus derivados no radio. Tudo começou no Mirante Jazz, na Mirante FM. E hoje apresenta Sexta Jazz, na radio Universidade FM. De lá pra cá você sente que contribuiu na formação de platéia para o consumo deste tipo de música, e para que produtores de eventos acreditassem que o jazz também é viável em São Luís ?
AUGUSTO PELLEGRINI – Historicamente, não há como evitar a evolução cultural de um povo. Alguma coisa teria acontecido mesmo sem a existência de programas específicos de jazz, mas com certeza a exposição que o ouvinte maranhense está tendo desde 30 anos atrás colaborou muito para a aceitação do jazz nas camadas mais jovens. Antes da minha chegada em São Luís o jazz era cultuado por uma minoria de pessoas de meia idade que ouvia seus discos no recesso das suas casas e não tinham oportunidade de ir a shows ou eventos onde pudesse ouvir jazz, mesmo se mais moderno e com uma sonoridade diferente daquela dos velhos discos LP. A partir do Mirante Jazz houve uma abertura gradual que deu origem não são a produtores de mente aberta como a diversos músicos que começaram a incorporar a linguagem jazzística nas suas interpretações e a formar grupos específicos de jazz e blues. Um exemplo da abrangência que o jazz está tendo é o próprio Lençóis Jazz & Blues Festival, que há seis anos vem apostando nessa fórmula mágica que tem o jazz e o blues como essência e como mote.
PEDRO SOBRINHO – Você nasceu em São Paulo, mas adotou São Luís para viver. Você criou raiz na cidade. Se estabeleceu com a família, profissionalmente e conquistou espaço para trabalhar com uma coisa que você gosta muito: a música, a literatura. Ainda está faltando alguma coisa para legitimar a sua afinidade com São Luís e a vida, numa espécie de missão cumprida ?
AUGUSTO PELLEGRINI – A gente nunca acaba de cumprir a nossa missão. Cada dia que passa me vejo mais motivado a cantar, a me apresentar e a escrever. Cada nova manhã significa a perspectiva de novos trabalhos e de novos desafios.
Hoje, a minha preocupação é fazer um papel bonito na minha apresentação no Lençóis Jazz 7 Blues Festival; daqui a alguns dias será um evento que tenho agendado com a marca de Sinatra & Bennett; a cada quinze dias uma apresentação no Manu Restaurante, casa onde estou cantando atualmente; todas as semanas pesquisas para criar polêmicas e discussões sobre esporte nas páginas de O Imparcial; diariamente a atualização do meu blog e o meu dia-a-dia dentro da área acadêmica; e até o final do ano a expectativa de ver meu novo livro sobre jazz – As Cores do Swing – ser lançado pala Editora Resistência Cultural.
Minha afinidade com São Luís vai além do clima, da praia, do mar e da arquitetura da cidade. É como se eu tivesse nascido aqui, terra de poetas.